Capa da publicação Crimes militares de opinião: exigência do princípio democrático
Artigo Destaque dos editores

Crimes militares de opinião: exigência do princípio democrático

Exibindo página 1 de 3
04/09/2022 às 12:00
Leia nesta página:

O resguardo da hierarquia e da disciplina militar garante que os militares se mantenham subordinados ao poder civil, o que, em última instância, protege o próprio Estado Democrático de Direito.

Resumo: Os militares, federais e estaduais, não foram excluídos da cidadania, sendo titulares de direitos fundamentais tanto quanto qualquer outro cidadão, com exceção da vedação à sindicalização, à greve e à filiação a partido político. Não obstante, há casos de militares que foram indiciados, acusados e condenados criminalmente pela prática de delitos militares de opinião, levantando-se vozes afirmando que referidos delitos ofendem não apenas à livre expressão dos militares, como também ao princípio democrático, e que, por isso, não foram recepcionados pela Constituição Federal 1988. O presente artigo defende que há compatibilidade entre os delitos propriamente militares de opinião e o princípio democrático, que impera na atual conjuntura constitucional. Será demonstrado, em primeiro lugar, que a liberdade de expressão tem alcance mais restrito quando se trata de militares, por uma questão de necessidade militar. E, depois, que o regime jurídico dos militares se traduz em verdadeira relação de sujeição especial. Por fim, desde que os tipos penais sejam interpretados e aplicados de forma razoável - na busca do ponto virtuoso - mostram-se fundamentais para o resguardo imediato da hierarquia e da disciplina, e, de forma mediata, da própria democracia.

Palavras-chave: Direito Penal Militar. Delitos de opinião. Princípio democrático. Recepção constitucional. Hierarquia e disciplina. Sociedade militar. Necessidade militar.


1. INTRODUÇÃO

Ao analisar o texto constitucional, é possível se depreender que os militares não foram excluídos da cidadania, afinal, são obrigados ao alistamento eleitoral; são titulares do direito-dever ao voto como qualquer outro cidadão brasileiro; e, sendo alistáveis, são elegíveis2, com exceção daqueles em serviço militar obrigatório, que são inalistáveis enquanto conscritos3.

Ademais, com exceção dos direitos à sindicalização, à greve4 e à filiação a partidos políticos5, não há outra restrição aos direitos fundamentais, ao menos expressa no texto constitucional, que se possa aplicar aos militares, o que significa que essa classe de servidores da Pátria também é titular dos direitos previstos nos incisos IV6, VI7, IX8 e XVI9 do Art. 5º, e no Art. 22010, da Constituição da República, que dispõem sobre a liberdade de manifestação do pensamento; a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença; a liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; e a liberdade de reunião, respectivamente.

Os limites a essas liberdades constitucionais são encontrados na própria Constituição, quando esta, expressamente:

  • veda o anonimato;

  • dispõe sobre a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas11, assegurando reparação pelo dano material, moral ou à imagem, além do direito de resposta12; e

  • condiciona a liberdade de reunião, caso em local aberto ao público, ao preenchimento de alguns requisitos expressos ser o ato pacífico, sem armas, e que não frustre outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente, independentemente de autorização.

Isso significa, ao menos em tese, que os militares, enquanto cidadãos, e titulares dessas liberdades, são livres para expressarem suas opiniões políticas, artísticas, ideológicas, religiosas, ou de que natureza for, manifestando-as, inclusive, publicamente, dentro dos limites traçados pela própria Constituição, apenas.

Não obstante tudo isso, em janeiro de 2002, um Subtenente (EB), à época Presidente da Associação de Praças do Exército Brasileiro (APEB), subscreveu e publicou editorial em periódico da referida associação, cujo teor foi considerado criminoso pelo Ministério Público Militar, por entender que:

os termos utilizados pelo denunciado, bem como a conclusão das ideias, encartadas nas expressões utilizadas pelo mesmo, configuram, inequivocamente, incitamento à desobediência, à indisciplina e à prática de crime militar[13].

Em 04 de novembro de 2005, o referido militar foi condenado à pena de 02 anos de reclusão, como incurso no Art. 155, do CPM14, que prevê o crime militar de incitamento.

A Defensoria Pública da União alegou, dentre outros argumentos de defesa, que o acusado teria, apenas, exercido o direito fundamental à liberdade de expressão.

Outro caso interessante ocorreu em janeiro de 2008, quando um Tenente-Coronel da Polícia Militar de Maceió/AL foi denunciado pelos crimes de incitamento (Art. 155, CPM) e ofensa às Forças Armadas (Art. 219, CPM), devido ao teor de palestra por ele proferida - A constitucionalidade dos regulamentos disciplinares militares - que continha teses contrárias aos princípios da hierarquia e da disciplina militar, no I Congresso Norte-Nordeste de Direito Militar, realizado em Natal/RN, nos dias 28 e 29 de outubro de 2005, promovido pela Associação de Praças do Exército Brasileiro (APEB)15.

O advogado do militar alegou, dentre outros argumentos de defesa, que o acusado teria, apenas, exercido o direito fundamental à liberdade de expressão16.

Vale mencionar, ainda, o caso de março de 2007, em que graduados da Força Aérea Brasileira, especialistas em controle de tráfego aéreo, participaram de movimento reivindicatório de âmbito nacional constante de aquartelamento voluntário e greve de fome, visando, basicamente, a desmilitarização do controle de tráfego aéreo e pressionar o governo por melhores salários17.

Alguns daqueles militares foram à imprensa e, sem autorização, deixaram-se fotografar e deram entrevistas tecendo críticas às condições de trabalho do setor aéreo brasileiro18.

Criminalmente, apenas os cabeças19 da empreitada foram responsabilizados20, sendo condenados pelos crimes de incitamento (Art. 155, do CPM), desrespeito a superior (Art. 160, CPM) e publicação ou crítica indevida (Art. 166, do CPM), de forma individualizada.

A Defensoria Pública da União alegou, dentre outros argumentos de defesa, que os acusados teriam, apenas, exercido o direito fundamental à liberdade de expressão.

Outros casos poderiam ser citados, em que militares foram indiciados, acusados e condenados em processos criminais, perante a Justiça Militar da União ou Justiças Militares estaduais21, pelos delitos militares, direta ou indiretamente, conectados ao exercício da liberdade de expressão.

Isso porque o Código Penal Militar - Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969 (CPM), ainda em vigor, traz em seu bojo alguns crimes propriamente militares de opinião, tais como os crimes de incitamento (Art. 155), desrespeito a superior (Art. 160), reunião ilícita (Art. 165) e publicação ou crítica indevida (Art. 166), que são tipos penais que, direta ou indiretamente, podem colidir com os direitos fundamentais já referidos.

Fato é que militares, muitas vezes, são punidos disciplinarmente ou indiciados, acusados e condenados criminalmente pela prática de delitos propriamente militares de opinião, o que tem levantado vozes22 em afirmação de que os referidos delitos militares ofendem não apenas à livre expressão do pensamento, mas também o princípio democrático, e que, por isso, não teriam sido recepcionados pela Constituição Federal de 1988.

É o que pretende o Partido Social Liberal, por exemplo, que ajuizou Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 475)23 perante o Supremo Tribunal Federal, requerendo a declaração de não recepção do Art. 166, do CPM, que trata do crime de publicação ou crítica indevida, pela Constituição da República, por afronta a preceitos fundamentais, conforme trecho da Inicial a seguir:

o Estado ou as instituições não podem proibir os militares de exercerem a plena liberdade de expressão e pensamento, em nome da hierarquia e disciplina ou da segurança nacional, pois essa liberdade é preceito fundamental da Constituição Federal, bem como pilar do Estado Democrático de Direito.

Por outro lado, sabemos que a liberdade expressão não é um conceito absoluto24.

Em virtude disso, a hierarquia e a disciplina militar sempre são invocados como argumentos suficientes para justificar a constitucionalidade dos delitos militares de opinião e a restrição ao direito de livre expressão dos militares, sendo vistos, pela doutrina penalista, como bens jurídico-penais da mais alta relevância.

Mas, afinal, o que há por trás dos princípios da hierarquia e da disciplina militar a ponto de justificarem a limitação a direitos fundamentais, inclusive por meio de um código criminal especializado, o Código Penal Militar?

Para responder a essa pergunta, buscaremos entender por que a liberdade de expressão tem alcance mais restrito quando se trata de militares, tentando encontrar os fundamentos sociológicos, éticos, lógicos e jurídicos que justificam esse tratamento diferenciado, com o objetivo de demonstrar que delitos propriamente militares de opinião são, na verdade, exigências do próprio Estado Democrático de Direito.

Esperamos, assim, contribuir para a pesquisa e o fortalecimento da Ciência Criminal e do Direito Militar, que, em nosso país, é uma disciplina quase esquecida.


2. A DOUTRINA DA NECESSIDADE MILITAR [25]

Pergunto-me por que a roupa dos militares se chama divisa. Divisa vem, manifestamente, de dividir. O que teria a ver com a veste militar a ideia de divisão? A surpresa se esvanece rapidamente se o verbo dividir se substituísse por aquele afim, de discernir ou distinguir. É necessário separar os militares dos civis, não? A divisão é o símbolo da autoridade26.

Foi levando em conta a experiência história e tendo em vista considerações de índole sociológica e cultural, que a Suprema Corte dos Estados Unidos27 desenvolveu a doutrina da necessidade militar (doctrine of military necessity), para justificar a restrição de direitos fundamentais aos militares, no que tange, basicamente, à restrição ao free speech28.

Essa doutrina considera que os militares constituem uma comunidade separada da sociedade civil, com demandas e características únicas, governada por um regime jurídico diferenciado, caracterizado fortemente pela disciplina e uniformidade, cujo status único permitiria uma maior restrição à liberdade de expressão29.

Para essa doutrina, a disciplina e a eficiência inerentes à profissão militar superariam qualquer direito à livre expressão, devendo os direitos fundamentais receber um peso menor nesse contexto30.

Ou seja, a liberdade de expressão, que é tida pela Suprema Corte dos Estados Unidos como um direito fundamental preferencial, prima facie31, não alcançaria, em sua plenitude, os militares, mas apenas os civis.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

A restrição ao free speech, obviamente, não seria um fim em si mesmo - restringir por restringir - mas visaria atender às necessidades militares de disciplina e prontidão.

Isso porque um exército eficaz não pode ser dirigido democraticamente, e um exército sem atmosfera de disciplina acabaria se degenerando em uma mera multidão armada32.

Assim, defendem os adeptos dessa doutrina que não poderia haver fusão entre a tradição democrática-liberal e a tradição militar profissional, pois esta exalta as virtudes da obediência que, por sua vez, se opõe ao princípio democrático33.

Dessa forma, a sociedade militar se apresenta como o conjunto de homens e mulheres, que, sob juramento público e solene34, por ocasião de sua incorporação à organização militar, promete cumprir rigorosamente as ordens das autoridades a que estiverem subordinados e dedicar-se inteiramente ao serviço da Pátria, cuja honra, integridade e instituições prometem defender com o sacrifício da própria vida35.

Essa é a principal distinção entre os militares e os civis, e que os distinguem de todas as outras classes de agentes públicos, pois de nenhum outro agente público se faz a referida exigência.

As Forças Armadas Brasileiras - Marinha, Exército e Aeronáutica - são instituições militarizadas por natureza, visto que exercem a função militar, propriamente dita, compreendida como sendo a administração do emprego da força militar pelo Estado, em benefício da sociedade, ou, em outas palavras, a sua função estatal é o combate armado bem-sucedido.

Outras instituições, contudo, ainda que não destinadas constitucionalmente ao emprego da força militar, são militarizadas - é o caso das Forças Auxiliares: Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares.

Às Polícias Militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos Corpos de Bombeiros Militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.

Ora, as instituições militares e militarizadas são preparadas para situações, em sua maioria, de extrema exposição a risco de morte36 37, que exigem não apenas preparo físico e psicológico, mas, principalmente, disciplina militar.

Isso porque, paradoxalmente, essas situações extremas não são desejadas pelos profissionais militares.

Nenhum soldado deseja a guerra, nenhum policial deseja confrontar bandidos e nenhum bombeiro deseja ocorrências que o coloquem entre a vida e a morte.

Mesmo assim, precisam estar preparados para enfrentá-las com eficiência, coragem, cooperação, abnegação, espírito de sacrifício, ordem e disciplina. Em suma, com verdadeiro espírito militar.

Além disso, as Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares integram o sistema de defesa nacional, pois são forças de infantaria do Exército, e não apenas instituições de segurança pública e defesa civil38.

Ainda pode haver dúvida sobre o que hierarquia e disciplina militar tem a ver com tudo isso?

Só com disciplina militar se pode possibilitar a vitória sobre o medo e evitar que alguém armado não se transforme em uma besta-fera, ou, ainda pior, um covarde, em meio a gritos de desespero, ao ver companheiros caindo mortos no cumprimento do dever39.

Nos momentos de vida ou morte, os soldados poderiam fugir se não houvesse uma ordem hierárquica, imperativa e coercitiva, reconhecidas desde os tempos de treinamento e instrução.40

Como disse Samuel P. Huntington:

ninguém mais do que o soldado profissional tem consciência de que o homem normal não é nenhum herói. A profissão militar prepara homens de modo a dominar seus temores e defeitos naturais41

É claro que a coesão grupal também é fator que ajuda a gerir os medos e ansiedades diante do desconhecido e do perigo, além de sustentar a motivação durante o combate, elevando o moral e aumentando as chances de sobrevivência do grupo42.

Mas até mesmo a coesão grupal - a camaradagem - surge como produto da hierarquia e da disciplina militar.

Assim é que a formação militar exige pedagogia própria, com foco no culto das tradições, rigidez de fórmulas doutrinárias e normalização minuciosa das condutas a serem adotadas por seus membros nas mais diversas situações43, e é aí que entram em cena a ordem unida, o treinamento físico militar, o uso de uniformes e o absoluto respeito aos usos e costumes militares.

Esse é um lado da moeda, que diz respeito à eficiência no emprego da força.

O outro lado é que sem a obediência hierárquica nascida de uma superioridade jurídica imposta pela força do direito, as Instituições Militares não passariam, como já dito, de um bando armado, e a superioridade seria imposta pelo direito da força[44].

Uma organização militar na qual o subordinado pudesse livremente discutir a ordem do seu superior hierárquico, resultaria em um perigo para o próprio Estado Democrático de Direito, em vez de ser a garantia de sua existência45.

Seria extremamente desastroso para a liberdade de uma sociedade livre e democrática deixar pessoas treinadas para o combate, com acesso ao manuseio de informações sigilosas, armamentos e equipamentos de guerra, desprovidas de normas repressivas eficazes46.

Diante disso, as regras de hierarquia e disciplina militar impõem um caráter pedagógico e, ao mesmo tempo, repressivo, possibilitando a manutenção ou restauração do padrão desejado47.

Com isso, fica clara a diferença entre as sociedades civil e militar: enquanto a primeira está fundada sobre a liberdade democrática, a segunda está escudada na obediência antidemocrática48.

Esse também é o entendimento de Mário Pimentel Albuquerque, Subprocurador-Geral da República, para quem o princípio democrático não deve ter aplicação nas instituições militares, senão vejamos:

Princípios democráticos são muito bons onde há relações sociais de coordenação, mas não em situações específicas, onde a subordinação e a obediência são exigidas daqueles que, por imperativo moral, jurídico ou religioso, as devem aos seus superiores, sejam aqueles filhos, soldados ou monges. ()

Da mesma forma que a vocação religiosa implica o sacrifício pessoal e do amor próprio e poucos são os que a têm por temperamento a militar requer a obediência incontestada e a subordinação confiante às determinações superiores, sem o que vã será a hierarquia, e inócuo o espírito castrense.

Se um indivíduo não está vocacionado à carreira das armas, com o despojamento que ela exige, que procure seus objetivos no amplo domínio da vida civil, onde a liberdade e a livre-iniciativa constituem virtudes. Erra rotundamente quem pretende afirmar valores individuais onde, por necessidade indeclinável, só os coletivos têm a primazia. (...)[49] (negritei)

De fato, o receio de que um comandante militar possa se valer da força para abocanhar o poder político quebrando o equilíbrio e subjugando o governo civil vem de muito longe.

Na República de Platão, já encontramos essa preocupação, quando Sócrates explicou a Glauco que os guardiões - os militares - da cidade ideal precisariam distinguir muito bem os amigos dos inimigos, defendendo a cidade destes, zelando pela vida de todos os cidadãos, em vez de se aproveitarem da sua força para explorar e tiranizar a cidade, o que implicaria, além de uma pedagogia própria, limitações a direitos que seriam comuns aos demais cidadãos50.

Sugere Platão, então, que a cidade promulgue uma lei que regule todos os aspectos da vida dos guardiões e os sujeite aos magistrados (autoridades civis), sob pena daqueles se tornarem déspotas e inimigos dos cidadãos, em vez de serem seus protetores e aliados51.

Ainda que Platão estivesse se referindo a uma República utópica, o seu conselho parece ter sido ouvido por todos os defensores de uma sociedade livre e democrática.

Thomas Jeferson, 3º Presidente dos EUA e um dos Pais Fundadores daquela nação, entendia muito bem ser requisito básico da vida democrática a supremacia da autoridade civil sobre a militar (the supremacy of the civil over the military authhority), princípio esse que se tornou uma das pedras angulares da democracia americana52.

A Constituição brasileira de 1988, por sua vez, seguindo a tradição das constituições anteriores, também adotou o princípio da subordinação da autoridade militar ao poder civil, quando dispôs, no Art. 142, que as Forças Armadas estão sob o comando supremo do Presidente da República e, no Art. 144, §6º, que as Polícias Militares e os Corpos de Bombeiros Militares encontram-se subordinados aos Governadores dos Estados e do Distrito Federal53.

O mesmo fez a Lei Complementar nº 97/99, ao transformar os antigos Ministérios da Marinha, Exército e Aeronáutica em Comandos subordinados ao Ministério da Defesa (Art. 20) - cargo de natureza civil.

Sobre a relação direta entre os princípios da hierarquia e da disciplina e o princípio da subordinação ao poder civil, cumpre transcrever, abaixo, o ensinamento de Samuel P. Huntington:

Como a direção política só vem da cúpula, isso significa que a profissão militar tem que se estrutura numa hierarquia de obediência. E para que a profissão desempenhe sua função, cada escalão dela deve ser capaz de merecer a obediência leal e instantânea dos subordinados. Sem esse relacionamento, o profissionalismo militar é impossível. (...).

Quando o militar recebe uma ordem legal de um superior autorizado, ele não discute, não hesita nem altera sua própria opinião; obedece instantaneamente. Ele é julgado não pelas políticas que implementa, mas sim pela presteza e eficiência com que as executa[54]. (negritei)

Diante de tudo isso, pode-se concluir que o rigoroso regime de hierarquia e disciplinar militar destina-se não apenas a assegurar o desempenho eficiente das finalidades institucionais, mas também a proteger o regime democrático e o princípio da soberania popular55.

Por fim, essa ideia de condicionar direitos fundamentais, considerando as necessidades e peculiaridades da profissão, nos fez lembrar outra importante doutrina: a doutrina das relações de sujeição especial.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
David Fonseca de Sá

Capitão-Tenente do Quadro Técnico, especialidade Direito, do Corpo Auxiliar da Marinha. Especialista em Direito Marítimo (UERJ) e Direito Criminal (Estácio).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SÁ, David Fonseca. Crimes militares de opinião: exigência do princípio democrático. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7004, 4 set. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/99890. Acesso em: 27 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos