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Anotações sobre a ascensão e queda do Antigo Regime

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22/03/2023 às 18:15
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A crise gerada pelo colapso do Antigo Regime, teoricamente inspirada nos ideais iluministas de liberdade e igualdade, desaguou na formação do Estado liberal democrático, ainda hoje considerado o melhor modelo.

Breve introito

O presente artigo tem por escopo traçar um panorama teórico, mediante revisão de literatura, sobre o fenômeno histórico do Antigo Regime, a fim de descrever criticamente o absolutismo monárquico característico desse período.

Nesse intento, após uma sucinta introdução para marcar a análise no tempo e no espaço, serão expostos os contornos da transição entre a Idade Média e a Idade Moderna, com o fim do feudalismo e o início do capitalismo comercial, que redundou na formação dos Estados nacionais, cujas funções se reuniam sob a autoridade de um monarca.

Evidentemente, tal autoridade tinha um lastro intelectual importante, que conferia ao soberano a legitimidade necessária para a prática de seus atos administrativos, legislativos e judiciários. Os fundamentos destas teorias, assim como seus autores, serão abordados como justificativas para a aceitação da tirania dos reis naquela quadra temporal.

Em seguida, depois de levada a efeito uma distinção categórica entre os regimes monárquicos instaurados na França e na Inglaterra, que percorreram caminhos distintos e tiveram desfechos diferentes, serão relacionados os diversos fatores que levaram à extinção do modelo absolutista de Estado, e desencadearam reformas ou revoluções em todo o mundo ocidental sob a sua influência.

O nascimento do Estado Moderno

L’État c’est moi1. A expressão, atribuída ao Rei Sol2, já consagrada e bastante difundida na literatura, retrata bem o período histórico caracterizado pela onipotência da coroa, como única fonte de direito institucionalizada. De fato, o melhor exemplo de Estado absolutista foi a França do século XVII, quando a supressão do regime feudal fez surgir o Estado moderno.

Para fins didáticos e historiográficos, seu marco inicial foi fixado em 1453, com a tomada de Constantinopla pelos turcos. A transição da Idade Média à Idade Moderna, porém, foi construída paulatinamente, sob sólidas bases políticas, econômicas e filosóficas.

Antes do absolutismo monárquico, a Europa vivia a Baixa Idade Média, período em que o feudalismo entrou em irremediável crise, em vista do renascimento do comércio, do desenvolvimento do monetarismo e do ressurgimento das cidades. Este processo histórico desaguou na centralização do poder em toda a Europa ocidental, dando origem às monarquias nacionais.

A sua dinâmica, no entanto, não se resumiu ao fortalecimento da coroa. O desenvolvimento da economia, dos exércitos nacionais e da estrutura administrativa do Estado também foram determinantes para a concentração absoluta do poder soberano em um só o homem: o monarca.

Efetivamente, no fim da Era Medieval, o desenvolvimento de novas ferramentas de trabalho e a renovação das práticas agrícolas – base da economia feudal – promoveram uma ascensão vertiginosa da produção e, proporcionalmente, uma queda inédita na taxa de mortalidade3, ocasionando uma explosão demográfica na Europa.

Em um movimento cíclico, esse crescimento populacional gerava os arroteamentos4, nos quais era absorvida a mão-de-obra ociosa e ampliada a produção de alimentos, fazendo aumentar novamente a taxa de natalidade. O excedente agrícola, por sua vez, desencadeado pelo aumento das áreas produtivas, estimulava, de um lado, o desenvolvimento do comércio – antes exercido, sobretudo, dentro dos feudos5 – e, de outro, o aperfeiçoamento do sistema monetário, como forma de facilitar a troca de mercadorias.

Com este desenvolvimento comercial, as feiras semanais tornaram-se permanentes; verdadeiros mercados, nos quais era oferecido trabalho assalariado, o que atraía inúmeros camponeses e artesãos em busca de ascensão econômica e social – algo inimaginável na sociedade feudal, dividida em estamentos. Assim foi que, em redor destas feiras, acumularam-se casas e oficinas que formavam os burgos6 (cidades).

Lado outro, a grande diversidade de moedas representava um obstáculo ao desenvolvimento mercantil7. Nesse cenário, a unificação das regras e a padronização monetária constituíram conditio sine qua non para a expansão e consolidação da economia de mercado. E, para tanto, era necessário fortalecer o poder centralizador do rei, cuja autoridade pudesse impor tais reformas.

Em outro vértice, vendo-se economicamente falida devido à escassez de recursos humanos para o trabalho pesado, já que os servos se dirigiam cada vez mais às cidades emergentes, e politicamente enfraquecida face à contínua e incessante centralização do poder, a nobreza prendeu-se aos antigos privilégios medievais, como isenção de impostos e foro privilegiado. Mas também a coroa, preocupada com o risco de perder o controle sobre a nobreza ou sucumbir à burguesia, tratou de preservar seus direitos medievais de berço, atraindo para a Corte um número cada vez maior de nobres, a quem eram conferidas funções políticas e diplomáticas. Por imperativo lógico, se o próprio rei tinha “sangue azul”, assim como os nobres, extinguir estas vantagens significaria sentenciar-se à morte, de modo que a coroa começou a administrar a disputa entre os dois grupos sociais, apoiando-se, convenientemente, ora na nobreza, ora na burguesia.

Todavia, como dito, os comerciantes burgueses sentiam-se prejudicados pelas inúmeras taxas e impostos pagos à coroa cada vez que ultrapassavam os limites territoriais de determinado feudo, a despeito da insegurança das estradas, onde eram constantemente saqueados, e da incontável diversidade de moedas, que dificultava a circulação das mercadorias.

Nesse toar, se o rei não podia impor isoladamente sua vontade sobre os nobres, e a burguesia tinha interesse no enfraquecimento da nobreza, outro não poderia ter sido o desfecho senão a união das suas forças em prol de um objetivo comum8, de tal sorte que a classe burguesa e a coroa passaram a se ajudar mutuamente, no intuito de centralizar o poder na pessoa do monarca.

Sucede que a formação e o controle de um Estado concentrado em um só soberano exigiam uma força de coerção – materializada em um exército próprio e permanente, muito diferente dos medievais –, uma justiça centralizada e uma burocracia racionalizada9. E eis aqui mais um motivo para a aliança firmada entre a realeza e a burguesia: em contrapartida ao auxílio da coroa na luta contra a nobreza feudal, esta realizava àquela vultosos empréstimos em dinheiro, utilizados na contratação de exércitos mercenários, os quais ocupavam o lugar dos vassalos militarmente despreparados e desorganizados10. Ademais, os próprios burgueses cuidaram de formar o corpo burocrático treinado e profissionalizado para servir à realeza, no que substituíram a ampla gama de aliados políticos e amigos pessoais do rei, que exerciam funções administrativas do Estado mesmo demonstrando a mais absoluta inépcia para tanto.

Desta maneira, a coroa e a burguesia reforçaram a monarquia, no intuito de instaurar um absolutismo patriarcal, e forçaram a antiga nobreza a retirar-se progressivamente às províncias, para ser sucedida pela classe urbana emergente11. “Os senhores começaram a enfraquecer por terem perdido grande parte dos seus bens em terras e servos. Sua força havia sido desafiada e parcialmente controlada pelas cidades”12.

Em decorrência desse processo histórico, depois de travada a batalha silenciosa entre a burguesia e a nobreza, com a mediação real, foi a própria monarquia quem se sagrou vitoriosa, tendo em vista que os reis centralizaram em si todo poder político, de modo a controlar totalmente a administração do Estado. Este período, a um só tempo marcado pela preponderância econômica do capitalismo comercial – o mercantilismo13 – e por uma organização ainda estamental14 da sociedade, passou à história com a denominação de Ancien Régime (ou Antigo Regime).

Acontece que, vencida a nobreza feudal, quebrada a resistência da burguesia, e subjugada ou cooptada a Igreja, a coroa continuou a acumular poderes cada vez mais amplos e de maior alcance, até certo ponto em que o rei passou a deter poderes absolutos: poderia, assim, administrar o reino – criando ou aumentando tributos –, julgar e condenar qualquer súdito, além de editar ou revogar as leis como melhor lhe aprouvesse, sem critérios outros senão a sua própria vontade15.

Assim, a formação e manutenção do Estado tornou-se um fim em si mesmo, podendo o soberano utilizar-se de todos os meios para conquistar o poder e garantir-se em seu exercício. Os atos despóticos do monarca não deviam observância a preceito moral algum, pois sua autoridade não encontrava limites fora da governança voltada à própria manutenção do poder político. As ideias do florentino Nicolau Maquiavel influenciaram sobremaneira os reis europeus, que as utilizaram para justificar o absolutismo. No clássico “O Príncipe”, ele expõe como o soberano poderia alcançar e manter-se no poder, mesmo que para tanto fosse necessário afastar-se dos princípios morais, já que os atos políticos deveriam guiar-se e serem avaliados por suas consequências, isto é, os fins justificariam os meios16.

Embora não tenha formulado uma teoria específica sobre o absolutismo em si, Maquiavel precedeu e influenciou todos aqueles que se debruçariam a posteriori sobre o estudo da política. Depois dele, esse processo de concentração do poder na pessoa do monarca constituiu objeto de reflexão de diversos filósofos, que buscavam justificar e conferir legitimidade ao absolutismo a partir de premissas distintas: na suposta divindade do rei (Bossuet), na necessidade de manutenção da soberania estatal (Bodin), ou na submissão das vontades dos súditos a uma só vontade, como forma de manter a paz social (Hobbes).

Bases teóricas do absolutismo monárquico

O jurista francês Jean Bodin (1530-1596) foi o primeiro a desenvolver uma teoria que defendia a concessão de um poder ilimitado ao monarca com base na doutrina da soberania do Estado. Segundo ele, a soberania consistia no poder absoluto (porque independente e autossuficiente), indivisível (porque essencialmente uno), e perpétuo (porque transcendente), de fazer ou revogar as leis17.

A doutrina de Bodin se impôs por uma característica singular, que fez dele – após Marsílio de Pádua, Dante e Maquiavel – um dos criadores da teoria moderna do Estado: a definição do poder político como forma necessária da existência social. O jurista considerava que a existência de um poder público unificado e unificante era um dado de fato de qualquer sociedade histórica, e interrogava-se sobre o que caracterizaria essencialmente esse poder. A resposta era clara e forte: a potência soberana18.

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Após larga análise dos três modelos de Estado concebidos pela teoria política de Aristóteles – quais sejam, democrático, aristocrático e monárquico –, Bodin destacou dois argumentos que o fizeram optar pelo último: o primeiro, mais metafísico, segundo o qual a monarquia seria a forma de governo mais próxima da ordem natural, tanto assim que era mais fácil encontrá-la no universo, entre os animais, na família e na própria natureza humana; e o segundo, este mais jurídico, de acordo com o qual a natureza da soberania demandaria uma unidade de comando, na medida em que uma só voz era melhor do que várias nos momentos de difícil deliberação, tanto assim que os Estados aristocráticos, quando em perigo, costumavam recorrer a um ditador19.

Assim, considerando que a monarquia seria a melhor forma de Estado dentre aquelas imaginadas pelo homem, que apenas Deus estaria acima do monarca, e que seu poder soberano seria reflexo direto do poder divino, o jurista francês concluiu que o rei era o único detentor da soberania estatal, cabendo somente a ele tomar todas as decisões governamentais. Isto porque, por imperativo lógico, se a soberania real simbolizava a própria soberania do Estado, não poderia o monarca sujeitar-se a lei alguma, senão à sua própria autoridade.

Para Bodin, aquele que exerce o poder absoluto e a soberania, conferindo-lhe existência atual e funcionamento prático, não poderia estar restrito, constrangido ou limitado. Se a representação do poder absoluto seria justamente a máxima liberdade de agir, isto se tornaria inviável se, por exemplo, as leis se antepusessem ao soberano20. Nesse sentido, o soberano poderia editar as leis, e anular ou revogar as que considerasse inúteis, o que nunca poderia ser feito por quem estivesse submetido ao comando de outrem21. Acrescia-se, além da edição das leis, ainda, outras atribuições exclusivas, relacionadas à administração pública e à chefia de governo, já que poderia declarar guerra ou optar pela paz, e à própria jurisdição, pois deveria também nomear os mais altos juízes, cabendo a ele próprio julgar em última instância, e acima de qualquer magistrado22.

A única obra literária do bispo Jacques Bossuet (1627-1704), intitulada “Política Extraída da Sagrada Escritura”, foi concebida no interesse de educar o famigerado Luís XIV, cujo governo marcou o apogeu do absolutismo monárquico francês. Seis dos dez volumes da publicação original – póstuma – foram dedicados ao então príncipe, e ela foi largamente utilizada como fundamento para as suas ações.

O religioso foi quem mais sistematicamente desenvolveu a teoria do direito divino dos reis, de acordo com a qual o monarca se postava acima das leis, porque sua autoridade emanava de Deus, e não de uma fonte humana, cabendo ao povo apenas obedecer, sem contestações, às decisões do rei23. Por este viés, sendo o poder político delegado por Deus diretamente ao monarca, conferindo-lhe autoridade ilimitada e incontestável, o súdito que ousasse questionar suas ordens estaria confrontando a própria ordem divina, conduta equivalente ao sacrilégio.

Digno de nota, também, que a Igreja Católica deslocou a materialização do poder divino da figura papal, para criar uma teorização do poder que outorgava plena legitimidade ao regime absolutista monárquico, conduta tal que refletia a crescente perda de poder do Papa e da própria instituição religiosa, ocorrida desde o fim do feudalismo. A criação de uma doutrina que legitimasse o despotismo monárquico representava, portanto, uma derradeira tentativa do clero de manter-se à beira do poder, ainda que sua força política ficasse extremamente reduzida.

Thomas Hobbes (1588-1679), por fim, contemporâneo inglês do Estado absolutista, e um dos mais respeitados teóricos do tema, apresentou uma filosofia já influenciada pelo racionalismo, com viés distinto de Bossuet e Bodin24. Enquanto estes recorriam a argumentos de ordem religiosa, aquele desenvolveu uma tese contratualista para a formação do Estado, pela qual teriam as pessoas renunciado à plena liberdade em nome de um homem (ou de uma assembleia de homens) – denominado “soberano” –, que passaria a exercer de forma absoluta todos os poderes. Assim, para Hobbes, apenas submetendo as vontades individuais à vontade do soberano, e seus julgamentos ao seu julgamento, poderiam os homens chegar à paz e à segurança, posto que “conferir toda a força e poder a um homem, ou a uma Assembléia de homens, que possa reduzir as diversas vontades [...] a uma só vontade, é o único caminho para instituir um Poder Comum capaz de defender a todos”25.

De acordo com o entendimento de Hobbes, antes da formação da sociedade e do Estado, os indivíduos estavam imersos em eterna e caótica desorganização, caracterizada por uma guerra permanente de todos contra todos. Vale dizer, não havendo leis ou regras preestabelecidas, o homem vivia em estado de natureza, oposto ao estado político26.

Trata-se da mais corajosa apologia do despotismo: o estado de natureza é um estado de guerra; porém, cansados de se destruírem e tendo na guerra o pior dos males, os homens se uniram e conciliaram para obter e gozar da paz. Esta absoluta abdicação de direitos, determinada por medo e interesse, é feita sob o punho de uma autoridade absoluta, cuja vontade e determinação se torna soberana, sendo bom, certo, justo e inapelável tudo o que decide ou decreta este “mestre de todas as consequências”27.

O fato de acreditar que o homem vivia cercado pela desordem anárquica, entretanto, não induz que Hobbes pensava inexistirem leis a governá-lo no estado natural. Mas, de acordo com a sua teoria, esta lei natural não poderia ser imposta por qualquer deles a outrem, que eventualmente a tivesse desrespeitado; ou seja, a lei, no estado natural, era desprovida de força cogente, e nenhuma sanção seria aplicada a quem a violasse. A partir da formação do Estado, contudo, somente a lei imposta pelo soberano passou a ser obedecida, não interessando mais a lei natural, carente de coercibilidade.

Como um bom jusnaturalista, como o eram todos os escritores políticos e jurídicos do século XVII, ele estuda a formação do Estado e das leis considerando a passagem do estado de natureza para o estado civil, e reconhece que existem leis naturais, mas indaga-se: seriam elas obrigatórias? E continua: nesse estado de natureza, no qual todos os homens são iguais, no qual cada qual tem o direito de usar a força necessária para defender seus próprios interesses, não existe jamais a certeza de que a lei será respeitada por todos, e assim a própria norma perde toda a eficácia. Para sair desta condição, conclui Hobbes, é preciso criar o Estado, atribuindo toda força a uma só instituição: o soberano. A partir do momento em que se constitui o Estado, deixa de ter valor o direito natural – que já não era respeitado antes, no estado de natureza –, e o único direito que vale é o civil28.

Embora aceitasse a celebração de um contrato social que houvesse outorgado poderes a uma coletividade, como exposto, Hobbes deixou clara a sua preferência pela monarquia, especificamente aquelas tirânicas, que concentram agudamente o poder nas mãos do rei, autorizando-o a tudo fazer em defesa da manutenção da ordem social: “o maior inconveniente que possa acontecer a um estado é ser susceptível de se desagregar e cair na guerra civil; as monarquias estão menos sujeitas a isso que todos os outros governos.”29

A leitura de uma passagem da sua mais famosa e controvertida obra – intitulada “Leviatã”, em referência ao opressor monstro marítimo bíblico –, na qual são definidos os “Direitos Institucionais do Soberano”, revela com uma clareza solar a sua opção política: primeiro, aqueles que convencionaram submeter-se ao julgamento de um só poder não poderiam firmar nova convenção, a fim de obedecer a outro poder; segundo, nenhum súdito poderia subtrair-se à sujeição do soberano; terceiro, o súdito dissidente teria de conformar-se com o poder instituído, aprovando todos os atos dele emanados, sob pena de eliminação sumária; quarto, sendo os súditos coautores dos atos de poder, nenhuma conduta estatal poderia prejudicá-los, e nem ser considerada injusta; quinto, não haveria possibilidade de condenação do soberano pelos seus súditos, pois assim procedendo estariam estes punindo outrem pelos próprios atos; sexto, pertenceria tão-somente ao poder instituído o direito de censurar livros, doutrinas e discursos dirigidos à multidão; sétimo, caberia unicamente ao representante supremo o poder de ditar as regras concernentes à propriedade; oitavo, só o poder soberano deveria exercer a função jurisdicional, sendo de sua competência exclusiva o julgamento das controvérsias acerca das leis naturais ou civis; nono, constituindo o poder instituído o símbolo da própria soberania estatal, somente este poderia declarar guerra ou paz, organizar as forças armadas, e tributar os súditos; décimo, seria atribuição privativa do soberano nomear conselheiros, ministros, magistrados e oficiais; e décimo primeiro, apenas o soberano teria o poder de recompensar ou castigar um súdito, conforme a legislação que ele mesmo formalmente elaborou30.

Como dito, Hobbes partira da convicção de que, entre o medo recíproco no qual os seres humanos estão obrigados a viver no estado de natureza e o medo do soberano, era preferível o segundo, de modo que, a rigor, para sair da anarquia, os homens obedecem com prazer ao soberano. Ele admitia que anarquia e Estado eram dois males, mas pensava ser este um mal menor. Sua teoria foi construída de maneira a associar a passagem do estado de natureza para o estado civil, como passagem de um estado de liberdade para um estado de servidão. Isto porque o estado de natureza – de guerra perpétua – contradiz os instintos primitivos do homem, que servem à conservação da vida. Para sair do estado natural, os homens precisavam suprimi-lo; e para tanto, renunciavam a todos os direitos naturais e os atribuíam, segundo um acordo recíproco, a uma pessoa ou um grupo de pessoas, a quem conferiam o poder supremo de comandar e comprometiam-se a obedecer em qualquer circunstância. A rigor, compravam a segurança ao preço da servidão31.

Ele afastou-se do jusnaturalismo teológico para aproximar-se do jusnaturalismo racionalista32, decerto pela inegável influência de Descartes, seu contemporâneo – e o maior expoente do racionalismo. Todavia, sua obra, mesmo refutando a teoria do direito divino dos reis, não apenas lastreou a manutenção do Estado absolutista monárquico, como atribuiu a este uma força inimaginável e uma legitimidade racional nunca antes vista.

Assim foi que, sob estas bases teóricas, ergueram-se em toda a Europa as mais tirânicas monarquias, que sujeitavam o povo ao poder absoluto dos reis. Entretanto, dois Estados monárquicos tiveram uma maior importância na história do mundo ocidental, seja pelo governo apoteótico do rei, seja pelo peculiar sistema de governo instituído.

A monarquia na França e na Inglaterra

No início do século XVII, o Sacro Império Romano-Germânico era composto por aproximadamente trezentos territórios autônomos, fracamente ligados sob a coroa imperial dos Hasburgo33. Após a reforma luterana, e no intuito de usar a religião como instrumento de unificação política para estabelecer sua hegemonia na Europa, a dinastia – apoiada na contrarreforma da Igreja Católica – iniciou um movimento de expansão do catolicismo, fazendo eclodir um confronto religioso generalizado, que logo ganhou contornos políticos.

Apesar de professar o catolicismo, na Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) a França aliou-se aos príncipes reformistas no enfrentamento dos Hasburgo, que foram derrotados. Com a assinatura do Tratado de Westfália, foi assegurada a liberdade religiosa nos Estados germânicos, conquistada anteriormente com a Paz de Augsburgo, que havia consolidado, em 1555, a separação entre católicos e protestantes.

Com a morte de Luís XIII, em meio à guerra (1643), subiu ao trono o seu sucessor natural, Luís XIV. A administração do reino, contudo, ficou a cargo do Cardeal Mazarino, nomeado pela rainha-mãe Ana d’Áustria, porque o filho era menor de idade. Entretanto, como esperado, após a morte de Mazarino, Luís XIV – aos vinte e três anos – assumiu plenos poderes, dissolvendo imediatamente o Conselho de Estado.

Esse período histórico, que coincide justamente com o seu reinado, foi o apogeu do modelo de Estado absolutista, quando o monarca exercia um domínio enérgico sobre todos os demais entes políticos, e concentrava em si as funções administrativas, legislativas e jurisdicionais, mesclando o poder político à sua vontade individual.

Cotidianamente, no âmbito da polícia e da justiça, o absolutismo do Rei Sol foi cristalino. Antes da Reforma da Justiça de Luís XIV, os privilégios neste órgão eram tantos que os tribunais estavam se sobrepondo, e as prerrogativas – principalmente do clero – impediam a centralização do poder de justiça. O Conselho de Reforma da Justiça, que nas reuniões contava muito com a presença do rei, terminou sua tarefa com a Ordenação Civil de 1667, que – somada à Ordenação Criminal de 1670 – formou o Código Luís. Todos os tribunais foram reunidos ao do rei e concomitantemente foi criado o cargo de tenente da Polícia, que acabou por reunir quase todas as polícias de Paris. As prisões também se davam por ordens emanadas apenas do rei – chamadas Ordens Régias –, e era necessária outra Ordem Régia para a soltura; como não havia prazo de detenção nestas Ordens, o prisioneiro podia ficar na masmorra por um longo período34. As Ordens Régias permitiam encarcerar, sem julgamento ou previsão temporal, muitos culpados ou presumivelmente culpados35. Assim, na França, a concentração de poder submetia tanto a nobreza quanto a burguesia à realeza, não havendo controle algum sobre os atos da coroa, ao contrário do que aconteceu na ilha britânica36, onde a luta contra o Antigo Regime oportunizou a criação de documentos históricos de controle do poder estatal.

Na Inglaterra, após a morte do rei Ricardo I Coração de Leão, em 1199, assumiu o trono o seu irmão, João Sem Terra, cujo governo foi marcado por conflitos internos e externos, que tumultuaram a sua gestão e o indispuseram contra a nobreza feudal e o clero, aos quais se aliou a burguesia emergente. Em 1215, aproveitando-se dos insucessos reais, os nobres e os clérigos reuniram-se em assembleia e obrigaram o rei a subscrever a Magna Carta (Magna Carta Libertatum)37, documento que – a despeito da sua natureza eminentemente feudal38 – consubstancia a gênese das liberdades fundamentais, por submeter os atos da coroa à aprovação de outro poder instituído.

De um lado, a Magna Carta confirmava os privilégios tradicionais da Igreja e a garantia dos costumes feudais, impondo certos limites ao poder real, e de outro lado, estabelecia dispositivos administrativos em relação à justiça, às finanças e à organização do governo. Em verdade, o documento não revelava uma novidade, nem mesmo uma instituição liberal, pois apenas mantinha os privilégios de determinadas classes, sem referir-se ao povo, exceto para manter as tradicionais liberdades de Londres e outras cidades39.

Por certo, a Magna Carta – que permanece até hoje como parte importante da Constituição inglesa – não era um documento liberal, mas estabelecia limites ao poder do rei, na medida em que o impedia de aumentar tributos sem prévia deliberação e aprovação do Grande Conselho, uma espécie de assembleia dos representantes da nobreza, considerada embrião do Parlamento inglês.

Todavia, mesmo limitados pela Magna Carta, tanto João Sem Terra quanto o seu filho e sucessor, Henrique III, aumentaram tributos arbitrariamente, provocando novos conflitos e rebeliões. Assim foi que, como espólio de guerra, os nobres impuseram a convocação de um verdadeiro Parlamento, composto por integrantes da nobreza (Câmara dos Lordes) e, mais tarde, da burguesia urbana (Câmara dos Comuns), que funcionaria como um órgão de controle do poder monárquico.

De fato, durante o século XVII, a ilha foi sacudida por intensos conflitos entre monarquia e Parlamento. Ao subir no trono, Carlos I – sucessor de Jaime I40 na dinastia Stuart – se revelou ainda mais déspota que o pai, de sorte que, em 1628, a Câmara dos Comuns o pressionou a assinar a Petição de Direitos (Petition of Rigths), comprometendo-se a submeter à aprovação parlamentar toda e qualquer alteração tributária:

Os Lordes Espirituais e Temporais, e os Comuns reunidos em Parlamento, expõem humildemente ao Rei, nosso soberano Senhor, que é declarado e promulgado [..] que nenhum homem livre pode ser apreendido, preso ou desempossado de seus bens ou privilégios [...] sem o julgamento legal de seus pares ou pela lei do reino. [...]

Em conseqüência, pedem humildemente a Sua Excelentíssima Majestade que, de ora em diante, ninguém seja obrigado de dar ou conceder nenhum presente, empréstimo, dom gratuito, taxa ou similar imposto sem o consentimento coletivo votado pelo Parlamento.41

Não durou mais de um ano, porém, o sistema de contenção da força real pelo Parlamento. Em 1629, o rei Carlos I ordenou o fechamento das casas parlamentares, readquirindo absoluto controle político-financeiro da Inglaterra e conduzindo a Grã-Bretanha a uma prejudicial guerra interna42. Em um momento de grande instabilidade, o Parlamento foi novamente convocado, tendo sido travados inúmeros embates entre este e a coroa. Finalmente, quando a Câmara dos Comuns se negou a investir nas forças armadas para conter uma revolta católica na Irlanda, caso não fosse dado o direito de escolher os conselheiros de guerra, Carlos I invadiu o órgão e tentou prender os seus principais líderes. Os parlamentares burgueses então reagiram e formaram o próprio exército, cujo comando ficou a cargo de Oliver Cromwell43. Sob as suas ordens, o exército parlamentar venceu o rei, que se refugiou na Escócia. Todavia, o Parlamento escocês o entregou ao Parlamento inglês em troca de uma soma em dinheiro, e ele terminou sendo decapitado em janeiro de 1649. No mesmo ano, a Câmara dos Comuns aboliu a Câmara dos Lordes e proclamou a República sob a liderança de Cromwell.

Quatro anos depois de ter concentrado em suas mãos o poder de fato, o líder puritano dissolveu mais uma vez o Parlamento, dando início a uma ditadura pessoal que durou até a sua morte, quando seu herdeiro – Richard Cromwell –, não suportando as pressões internas, renunciou ao cargo de Lorde Protetor em favor dos chefes militares. A disputa pelo poder que se seguiu entre eles, no entanto, possibilitou a reconvocação do Parlamento, que restaurou a monarquia em 1660, alçando ao trono o rei Carlos II.

Todavia, o sucessor dos Stuart havia sido educado na França de Luís XIV; então não surpreende que, seguindo o modelo absolutista, tenha buscado ajuda financeira do monarca francês e restabelecido a Câmara dos Lordes, para conquistar alguma autonomia em relação à Câmara dos Comuns. Também não surpreende que, diante desta política, o Parlamento o tenha deposto, oferecendo o trono ao chefe de governo da Holanda – Guilherme de Orange.

Sem qualquer derramamento de sangue, Carlos II fugiu para a França, razão pela qual esta última batalha entre realeza e Parlamento passou à história como Revolução Gloriosa. O príncipe holandês, no entanto, somente pôde assumir o trono após assinar a Declaração de Direitos (Bill of Rights), terceiro documento histórico da luta contra o absolutismo, pelo qual o rei ficava obrigado a submeter a tributação à deliberação e aprovação de ambas as casas parlamentares, a garantir as liberdades fundamentais, como a religiosa e a propriedade privada, e a assegurar uma alternância periódica entre nobres e burgueses nos ministérios, condições que colocavam o governo de fato nas mãos do Parlamento e limitavam o poder do monarca. Assim, na Inglaterra, a monarquia absolutista foi substituída pela monarquia constitucional.

A luta contra o absolutismo inglês também atravessou o Atlântico Norte e se desenvolveu, em parte, nas colônias da América, onde foi possível – e quiçá necessário – instituir um governo democrático. Além da posição antiabsolutista e da influência protestante, os norte-americanos estavam conquistando sua independência; então de nada adiantaria depor um governo absolutista inglês para, em seguida, submeter-se a outro igualmente absolutista, ainda que conterrâneo. Ademais, não existindo, naquele momento de fundação dos Estados Unidos, uma nobreza ou um Parlamento que fossem considerados opositores genuínos da realeza, como na metrópole, houve, naturalmente, uma afirmação mais vigorosa do governo pelo próprio povo44. Digno de nota, por ora, que nestas circunstâncias a ausência do Parlamento fez o Judiciário ganhar mais relevância na luta contra a arbitrariedade estatal, decerto por influência da doutrina dos “pais fundadores”45.

A crise do regime absolutista

Como não poderia deixar de ser, diante da insatisfação da rica burguesia urbana, cansada da elevadíssima tributação e da inexistência de liberdade de mercado, a arbitrariedade legitimada pela autoridade do rei tornou insustentável o modelo absolutista de Estado. Assim, tanto na Inglaterra – único Estado no qual a burguesia emergente tinha representação institucional, através do Parlamento – quanto nas outras monarquias absolutistas, houve resistência e retaliação ao poder central.

Como a Inglaterra foi a primeira nação a romper com a autoridade absoluta do monarca e implementar o constitucionalismo moderno, foi lá que a liberdade econômica despontou como consequência primeira do alcance da liberdade política. Ao extinguir os antigos monopólios e estimular a livre concorrência, a burguesia inglesa quebrou as amarras que impediam o crescimento da economia, em um processo lento que conduziu, em meados do século XVIII, à Revolução Industrial e, por conseguinte, à formação da sociedade industrial capitalista. Esta liberdade política e econômica conquistada pelos ingleses serviu de influência para os pensadores que viriam, mais tarde, compor o movimento Iluminista, móvel da Revolução Francesa.

Na França, àquela época, a monarquia se achava bastante fragilizada. Sem dispor de homens de fibra, combalida pela contestação dos parlamentos, e sem saber controlar as finanças, a coroa cambaleava, quase caindo de joelhos frente à burguesia. As diferenças regionais dificultavam a centralização do poder46, as crises econômicas e sociais – decorrentes do vertiginoso crescimento demográfico47 – assolavam o país, e a parcela mais esclarecida da população se irritava, debatendo ferrenhamente as possíveis soluções para esse caos.

Em quase toda a Europa continental, e sobretudo na França, a fadiga resultante do poder político excessivo da monarquia absolutista pesava sobre todas as camadas sociais interpostas entre o monarca e a massa de súditos. Arrolavam essas camadas em seus efetivos a burguesia comercial e industrial ascendente e a nobreza que, por seu turno, se repartia entre os nobres submissos ao trono e a escassa minoria dos fidalgos inconformados com a rigidez e os abusos do sistema político vigente, já inclinada ao exercício das práticas semidespóticas. Todos os pressupostos estavam formados, pois, na ordem social, política e econômica, para a mudança de eixo do Estado moderno, do entendimento de um monarca que se confundia com o Estado no exercício do poder absoluto, para a postulação de um ordenamento jurídico impessoal, fulcrado nas doutrinas liberais de limitação do poder através da contenção da autoridade e das garantias jurídicas da iniciativa econômica.48

Outro fator determinante para a queda do absolutismo francês soma-se a estes: o rei Luís XVI era menos obedecido que outros príncipes europeus – os quais, fundamentando os seus atos no despotismo esclarecido49, superavam os métodos de governo ensinados por Luís XIV –, e cedeu à pressão política para restabelecer o Parlamento, fervoroso opositor do seu governo.

Os parlamentares autonomeavam-se “guardiões da lei” e aproveitavam-se dos direitos de registro50 e advertência51 para tentar controlar a coroa. Certa feita, Luís XVI tentou impor o registro de seus éditos em lit de justice52, ao que alguns parlamentares – apoiados por seus duques e pares – declararam a ilegalidade dos decretos, pelo que foram exilados, insurgindo-se radicalmente contra a coroa. Esta, por sua vez, mostrando-se incapaz de dominar aquela força contestatória, não foi perdoada pela opinião pública, em sua infinita diversidade. E certamente, sem esse avançado grau de decomposição, nenhuma revolução teria sido possível, já que os poderes políticos com mais frequência caem do que são derrubados53. Na tentativa de manter o poder, o monarca anulou o direito de registro e advertência em proveito de uma Corte Plenária, mas o que era uma reivindicação parlamentar se desdobrou em uma poderosa contestação política e social, promovida por frações avançadas do Terceiro Estado54, para enfim desembocar em uma violenta e incomparável revolução, que rompeu os paradigmas preestabelecidos e operou mudanças significativas em toda a cultura ocidental.

Em 14 de julho de 1789, as ruas de Paris estavam em sangrenta efervescência revolucionária. A Bastilha – prisão-fortaleza que simbolizava o poder repressivo da Corte – foi tomada de assalto e colocada abaixo, enquanto os nobres eram guilhotinados em praça pública55.

Estes foram os primeiros passos dados pela humanidade rumo ao Estado de Direito. A despeito da barbárie, observada em toda convulsão social, política e econômica, houve um movimento intelectual que antecedeu o fenômeno revolucionário francês, consubstanciado, sobretudo, nas correntes teóricas liberais do Iluminismo.

Notas conclusivas

Como visto, superado o feudalismo, a partir do capitalismo comercial, e nascido o Estado moderno, os monarcas nacionais passaram a centralizar todo o poder político, de modo a controlar absolutamente a administração do reino, a edição e revogação das leis, a criação e o aumento de tributos e o julgamento dos súditos, conforme sua própria vontade.

Sua legitimidade estava lastreada nas teorias do direito divino dos reis, da soberania estatal, e do contrato social para a manutenção da paz sob uma única autoridade, desenvolvidas respectivamente por Bossuet, Bodin e Hobbes.

Na Inglaterra, porém, a autoridade absoluta da coroa encontrou obstáculos, notadamente em virtude da submissão do monarca ao controle do Parlamento, que impôs limites à sua atuação desenfreada. Por outro lado, na França, a concentração cada vez maior do poder na pessoa do rei conduziu o país a um absolutismo insustentável, e esta fadiga provocada pelo excesso de autoridade – especialmente sobre a burguesia, que àquela altura já dominava o mercado e reunia o poder econômico da sociedade – rompeu-se em uma sangrenta revolução, marcada pela atividade incessante da guilhotina.

A crise gerada pelo colapso do Antigo Regime, teoricamente inspirada nos ideais Iluministas de liberdade e igualdade, desaguou na formação do Estado liberal democrático, cujo objetivo precípuo se volvia ao estabelecimento de limites ao poder estatal, por meio da divisão de suas funções, sob o império da lei e da razão. Desde então a humanidade adota este modelo, e a despeito das críticas pertinentes, que visam aperfeiçoar o sistema, ainda hoje se caracteriza por ser o melhor caminho a ser seguido, dentre todas as experiências já vividas, na extenuante tarefa de perpetuar a espécie.

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Sobre o autor
Raoni Souza Drummond

Advogado. Especialista em Direito Processual Civil (PUC-SP).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DRUMMOND, Raoni Souza. Anotações sobre a ascensão e queda do Antigo Regime. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7203, 22 mar. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/103095. Acesso em: 27 abr. 2024.

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