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Arbitragem, conciliação e mediação:

métodos eficientes para dirimir conflitos e promover a pacificação social

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10/10/2022 às 18:00
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Conciliação 

De acordo com o artigo 165, $2 do código de processo civil, define-se que a figura do conciliador atuará preferencialmente nos casos em que não houver vinculo anterior entre as partes, podendo sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem; por isso é mais indicada quando não houver uma necessidade de preservação de relacionamento entre as partes, como ocorre nas relações de consumo (direitos patrimoniais disponíveis), onde os conflitos são objetivos e advêm de circunstancias pontuais que dirimiram os interesses ou satisfação plena de alguma das partes. Não obstante, além de direitos materiais, não raro, tais desfazeres alcançam a honra, atingindo a personalidade da pessoa promovendo, de tal modo, dano moral, impossível de ser reparado, todavia passível de ser indenizado, constituindo direito indisponível, que pode ter, de certa forma, o seu valor convencionado e de tal maneira será submetido a avaliação subjetiva, como ocorre, por exemplo, em casos de negativação de crédito por inserção indevida de nome no cadastro de inadimplentes.    

De acordo com o CNJ, resolução 125/2010, a conciliação ocorre em dois momentos: antes do processo (preventivo) e durante o processo (incidental). Quando anterior ao processo, a conciliação é classificada como extrajudicial, visto que a intervenção estatal ainda não foi provocada, não possuindo assim jurisdição sobre o litigio. Faz-se imprescindível ressaltar que é facultado as partes a presença de advogado, mas quando comparecer apenas o representante de uma das partes, a audiência deverá ser suspensa, tendo em vista o equilíbrio processual e o princípio da paridade das armas, ainda que não haja a jurisdição estatal. Nesta sessão conciliatória, os litigantes têm uma maior liberdade negocial, isentos da concepção pungente do tudo ou nada e o desgaste que perdura em uma relação de conflito, pois somente os interessados possuem o poder de decisão e a estes competem abreviar o tempo na solução das pendências, sobretudo, a resolução proverá da harmonização espontânea dos desavindos através do diálogo, o qual sobrepese a pacificação social. Em regra, as sessões de conciliação extrajudiciais ocorrem em câmaras privadas ou órgãos semelhantes e não precisam estar cadastrados no tribunal respectivo ou no cadastro nacional de conciliadores (art. 12-C, res. 125/10). Todavia, quando designadas pelos tribunais, deverão suportar um percentual de audiências não remuneradas com o fim de atender aos processos em que foi deferida a gratuidade da justiça, como contrapartida de seu credenciamento (art. 12-D, res. 125/10) e ficam sujeitas a avaliação do SEJUSC. É relevante aludirmos que o provimento nº 67/2018 do CNJ, disciplina a conciliação e mediação em cartórios. Embora seus procedimentos sejam consubstanciados na lei 13.140/15 e no código de processo civil, de igual forma, o termo de conciliação é considerado como título executivo extrajudicial, previsto no art. 784, IV, do CPC. Apesar do título extrajudicial possuir força equiparada a sentença, para que obtenha eficácia quando o acordo torna-se insolvente, é necessário ajuizar uma ação de execução para forçar a pretensão satisfativa do direito, não olvidando que o título auferido pode ser desconstituído e declarado ineficaz por meio de embargos à execução, que possibilita ao devedor arguir, além dos pressupostas de impugnação que incidem sobre o título judicial, qualquer matéria que lhe seria lícita deduzir como defesa no processo de conhecimento, (Art. 917, VI, CPC), sendo assim discutível e mutável, o que não acontece com os títulos judiciais por já serem produtos de uma sentença e seguirem os ritos naturais do processo ordinário.    

Quando a audiência de conciliação é proposta durante o processo, de maneira incidental, é classificada como judicial, pois encontra-se sobre a égide jurisdicional do estado-juiz, instituído do poder de decidir, mas que a priori, oferece as partes a oportunidade de uma resolução consensual em apelo a razoabilidade dos interesses, sem qualquer imposição ou determinação que contrarie as partes. Caso não haja acordo, o processo será impulsionado oficiosamente para uma solução heterocompositiva, a qual o juiz definirá a quem pertence o direito, entretanto, a concordância poderá ser convencionada até antes da prolação da sentença. Normalmente a sessão de conciliação judicial é única, podendo ser presidida pelo próprio juiz da ação ou por conciliador obrigatoriamente cadastrado nos respectivos órgãos, como observamos anteriormente nos procedimentos comuns de mediação e conciliação judicial. 

Há diversas críticas quanto a função de juiz-conciliador, com alegações de que é inerente ao magistrado a condição de julgar, e a proposição da resolução do conflito, estaria ainda que de forma implícita, inclinada a projetar a sua decisão. Em uma concepção axiológica, decerto que a plena imparcialidade é utopia, pois resguardamos em nossa personalidade valores sociais pré-constituídos. Nem o distanciamento do problema irá conferir a total neutralidade quando empáticas a nossa essência, embora esta medida possa conferir ponderação, também constituem fontes do direito os costumes, que são convencionados em pró da paz social. 

Ao magistrado é atribuída a função de guardião destes valores, de mantenedor da ordem social a partir de normas já estabelecidas, sobretudo o dever de pacificação como razão primeva nas resoluções de conflitos, ainda que o direito contemple apenas uma das partes, a finalidade sempre será a instituição de uma sociedade justa. Ressaltamos que apesar da possibilidade da construção de uma concepção de juízo de valor, mediante a exposição prévia dos fatos, antes mesmo da apresentação da contestação, que ocorrerá 15 dias após a audiência, não há imposição de uma sentença e o objetivo da conciliação consiste nas seguinte medidas:  Demonstrar ao autor que não possui direito sobre a razão a que se funda a ação, incentivando-o a renunciar após reconhecer que não possui o direito alegado;  incentivar o reconhecimento do réu acerca da procedência do pedido; fomentar a transação mediante concessões mútuas, ou seja, incentivar o acordo equilibrado entre as partes, o qual ambos terão que ceder em alguns aspectos da demanda, de tal modo, que nenhum interesse se sobreponha totalmente ao outro;  É oportuno evidenciar que a transação é uma medida, uma espécie contida na conciliação e com ela não se confunde, por não contemplar a sua totalidade, como denotamos nas duas situações anteriores, que se firmam de forma independente. Salientamos que uma transação na esfera civil sobre danos morais seria uma renúncia processual para esfera penal, desde que esteja expressa. 

A resolução do litigio por conciliação judicial será reduzida a termo e homologada por sentença com resolução de mérito transitado em julgado e não cabe recurso, constituindo título judicial, encaminhado para liquidação. 


Mediação

Discorreremos doravante acerca do instituto da mediação no âmbito extrajudicial e judicial de maneira específica, que além das disposições gerais previstas no código de processo civil, possui lei regulamentar própria para a aplicação do instituto. De acordo com o CPC:        

o mediador atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo reestabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos. (Art. 165, $3, CPC/2015). 

Como expostos no dispositivo normativo, o mediador não é instituído do poder de decidir e tão pouco fará qualquer sugestão sobre como dirimir o conflito, apenas lhe é atribuído a função de reestabelecer o diálogo entre as partes, para que possam juntas, compreender a amplitude dos seus interesses e em que ponto colidem. Somente a partir da compreensão mútua poderão alcançar um resultado que beneficie ambas as partes. 

Versando sobre as disposições comuns do instituto nas duas esferas, o mediador alertará as partes sobre as regras de confidencialidade e ainda que haja processo judicial ou arbitral em curso, poderão submeter o conflito à mediação, hipótese em que os respectivos juízes suspenderão o processo até a solução consensual do litígio, bem como o prazo prescricional. Sendo a submissão consensual, torna-se irrecorrível a suspenção, mas não obsta que os respectivos juízes concedam medidas de urgência a fim de evitar o perecimento do direito. Em relação às sessões, o mediador poderá se reunir com as partes separadamente ou conjuntamente e solicitar maiores esclarecimentos sobre as razões do conflito para que possa melhor compreender a causa e reaproximar as partes. Vale salientar que as informações prestadas não poderão servir como provas, tão pouco reveladas em juízo, salvo quando consentida pelas partes, determinação da lei ou para cumprimento do acordo.    

No âmbito extrajudicial, a mediação é realizada em câmaras privadas, assim como ocorre na conciliação extrajudicial, é utilizada quando as partes optam por tentar resolver o conflito antes de ingressarem na via judicial, sendo definido como cláusula de mediação. De acordo com o art. 9º da lei 13.140/2015, qualquer pessoa capaz, que tenha a confiança das partes, poderá atuar como mediador, independentemente de integrar qualquer tipo de conselho, entidade de classe ou associação, ou nele inscrever-se.  Compactuando da mesma analogia entre os institutos, a equidade processual prevalecerá e ainda que seja facultada as partes a presença de advogados, na ausência do representante de uma das partes, o mediador suspenderá o procedimento, até que todas estejam devidamente assistidas (art.10, lei 13.140). Uma medida obviamente não aplicável ao método judicial pela exigência de capacidade postulatória. A convocação para o procedimento de mediação pode ser feita através de qualquer meio de comunicação e deverá conter a proposta, a data e o local da reunião. A aceitação da mediação e o compromisso de comparecer à audiência deverá ser expresso, caso contrário, se não for respondido em até trinta dias, contados a partir do recebimento, considerar-se-á rejeitado o convite para mediação do litigio e não incidirá qualquer sanção. A anuência ao instituto será regida por contrato de mediação, que deverá subscrever: o prazo para audiência (mínimo de dez dias e máximo de três meses), local adequado, lista com cinco nomes de mediadores e suas qualificações para ser escolhido um (ou mais se necessário) pelas partes em comum acordo e a previsão de multa de cinquenta por cento das custas e honorários sucumbenciais, caso venha a vencer em procedimento arbitral ou judicial. Em consonância com a mesma lei: 

 nos litígios decorrentes de contratos comerciais ou societários que não contenham cláusula de mediação, o mediador extrajudicial somente cobrará por seus serviços caso as partes decidam assinar o termo inicial de mediação e permanecer, voluntariamente, no procedimento de mediação. (Art. 22, $3, lei 13.140).

O processo de mediação será encerrado quando todos esforços para promover o entendimento entre as partes se tornarem injustificáveis, ou seja, quando o diálogo não for possível para chegar a um consenso. Quando houver acordo, este será reduzido a termo e constituirá titulo executivo extrajudicial. 

Na esfera judicial, a mediação ocorrerá após oferecida a ação, podendo atuar como mediadores àqueles previstos no art. 167 do CPC. Em geral, os mesmos procedimentos da conciliação judicial são aplicáveis a mediação (critério de escolha, remuneração, impedimento e suspeição, exclusão e afastamento), e as audiências também são designadas pelo juiz do processo, ou seja, são compulsórias, e o seu descumprimento fora das previsões legais incorrerá sob ato atentatório a dignidade da justiça. Há um aparente conflito de normas ao que se refere ao artigo 168 do CPC, que dispõe sobre qualquer pessoal em comum acordo entre as partes poder atuar como mediador, enquanto na lei 13.140/15 prevê apenas aqueles previstos no artigo 21 da referida lei. Compreendemos que o artigo 168 do CPC ao referir-se a câmara privada, versa sobre a esfera extrajudicial, que devido a omissão do termo, gera precedentes para uma interpretação extensiva, porém o artigo 21 da lei de mediação põe fim a dualidade cognitiva. O acordo realizado por mediação judicial gera título executivo judicial.


Conclusão

Em nossa análise explanamos, ainda que de forma substancial sem esgotar o tema, os principais aspectos que instituem a arbitragem como a nomeação consensual do árbitro, as cláusulas compromissórias, o compromisso arbitral e os princípios norteadores desse método extrajudicial de resolução de conflitos introduzido no ordenamento jurídico brasileiro a fim de promover maior economicidade e celeridade processual, evidenciando quão imprescindível é a relação de confiança entre as partes e o árbitro e sua atuação consonante aos princípios postulados na lei de arbitragem. Ademais, os  poderes conferidos aos árbitros pelas partes e pela Lei torna-os juízes de fato e de direito, investidos de jurisdição própria e as suas sentenças são equiparadas àquelas proferidas no âmbito do poder judiciária, produzindo igual título executivo, porém, o árbitro não está investido de poder coercitivo, sendo necessário uma atuação coordenada com o judiciário para o fiel cumprimento das suas diligências  e a executividade da sentença arbitral, quando não cumpridas voluntariamente.

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Também apresentamos no decorrer deste trabalho a distinção entre os institutos de mediação e conciliação que se diferenciam pela existência do vínculo entre as partes e a atuação do fomentador do acordo consensual acerca das medidas adotadas. Analisamos a aplicação destes institutos nas esferas judiciais e extrajudiciais quanto a constituição dos seus títulos, órgãos e legitimação dos seus titulares para dirimir conflitos. É imprescindível ressaltarmos a viabilidade destes métodos de resolução de controvérsias, pois são formas rápidas de resolver conflitos e não significam renúncia ao direito, mas sim, um ganho mútuo entre as partes, que além de ponderarem com razoabilidade sobre as causas do litigio, não enfrentarão o desgaste enfadonho do processo nas demandas jurisdicionais e não suportarão os altos custos do seu andamento, sobretudo, contribuem as partes litigantes para a pacificação social.  


Referências: 

BRASIL, LEI Nº 9.099, DE 26 DE SETEMBRO DE 1995. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 27 de SET de 1995;

BRASIL, LEI Nº 9.307, DE 23 DE SETEMBRO DE 1996. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 24 de SET de 1996;

BRASIL, RESOLUÇÃO Nº 125, DE 29 DE NOVEMBRO DE 2010. CNJ - Conselho Nacional de Justiça, Poder Executivo, Brasília, DF, 29 de NOV de 2010;

BRASIL, LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 17 de MAR de 2015;

BRASIL, LEI Nº 13.140, DE 26 DE JUNHO DE 2015. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 29 de JUN de 2015;

BRASIL, PROVIMENTO Nº 67, DE 26 DE MARÇO DE 2018. CNJ - Conselho Nacional de Justiça, Poder Executivo, Brasília, DF, 26 de MAR de 2018;

SCAVONE JUNIOR, Luiz Antônio. Manual de Arbitragem, Mediação e Conciliação. 8º edição, Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2018. 

VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas. Ed. Método, São Paulo, 2008.

LINHARES, José Ronaldo. A Conciliação Judicial Levada à Sério. São Paulo: Revista Eletrônica Âmbito Jurídico. 2012. Disponível em:< https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-processual-civil/a-conciliacao-judicial-levada-a-serio/.HTML> Acesso em: 23 de Março 2020.  

SILVA, Fernanda Sayuri Yoshida da. Arbitragem no Novo Código de Processo Civil. São Paulo: Revista Eletrônica Direito Net. 2017. Disponível em: <https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/10141/A-arbitragem-no-Novo-Codigo-de-Processo-Civil.HTML> Acesso em 15 de Abril 2020. 

DA ROCHA, João Victor Gonçalves, ROCHA Thiago Gonçalves da. A Contribuição da Conciliação na Celeridade Processual Cível da Justiça Brasileira. Trabalho de conclusão de Curso (Bacharel em Direito) Universidade Multivix, Espirito Santo, 2018. Disponível em: < https://multivix.edu.br/wp-content/uploads/2018/09/a-contribuicao-da-conciliacao-na-celeridade-processual-civel-da-justica-brasileira.pdf. Acessado em 25 de Março 2020.

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Sobre o autor
Rick Lima

Bacharel em Direito pela UniFBV widen - Pós graduando em direito Penal e processo Penal pela EBRADI (escola brasileira de direito) - Graduado em Letras pela FAESC Servidor Público do Estado do RN

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Rick. Arbitragem, conciliação e mediação:: métodos eficientes para dirimir conflitos e promover a pacificação social. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7040, 10 out. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/100542. Acesso em: 14 mai. 2024.

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