Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/79005
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

A PREJUDICIALIDADE DAS AÇÕES COGNITIVAS E A SUSPENSÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO

A PREJUDICIALIDADE DAS AÇÕES COGNITIVAS E A SUSPENSÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO

Publicado em . Elaborado em .

Trata das hipóteses de suspensão do processo de execução pela pendência de ações de conhecimento, inclusive ação rescisória e da aplicação do artigo 313, inciso V, do CPC ao processo de execução.

Sumário: 1) Delimitando o Tema. 2) O fundamento constitucional da busca da eficácia do processo executivo e suas condicionantes;. 3) A suspensão do processo de execução. 4) Ações cognitivas e sua influência no processo de execução. 5) A questão da Ação Rescisória   6) Da inaplicabilidade do artigo 313, inciso V, do CPC, ao processo de execução. 7) Conclusões.


Delimitando o tema

A presente abordagem tem por objeto a questão da suspensão do processo de execução na pendência e por conta de ações cognitivas.

A despeito da disciplina clara da lei, têm-se visto certas deturpações hermenêuticas, de modo a se dar maior elastério as hipóteses de suspensão do processo de execução, contradizendo a tendência de busca de celeridade do processo civil.

Esta situação implica no enfraquecimento da eficiência do processo civil e na repristinação de uma visão que representa exatamente aquilo que o novo CPC veio para modificar.

A premissa fundamental para compreensão do tema é conceber a tutela executiva como uma fase fundamental do processo civil, figurando em par de igualdade ao processo de conhecimento em importância.

Por diversas razões históricas, o processo civil de inspiração romano-canônica, vigente na Europa continental e na América Latina, apresenta exacerbada tendência de focar na tutela cognitiva.

O acertamento da relação jurídica mediante uma sentença é perseguido como escopo magno da tutela jurisdicional, o que acaba obnubilando a percepção de que toda vez que envolvido conteúdo obrigacional (maioria dos casos, aliás), é mister, além da declaração do direito e de seu sancionamento[1], a produção de alterações concretas na realidade empírica.

Por outras palavras, o atual contexto tem por conseqüência uma marcante preponderância do conteúdo obrigacional nas relações jurídicas, o que dá azo a sentenças de natureza condenatória, as quais, via de regra, dimanam atuação executiva do Estado através de uma execução forçada, ou esta resulta do trato negocial, diretamente através de títulos executivos extrajudiciais[2].

Mas esta realidade ainda não está sedimentada na práxis de operação e ensino do Direito. Ao processo de execução ainda se reserva um papel secundário, olvidando-se que ele é elemento fundamental ao atingimento dos escopos do processo na maioria dos casos e que podem ser sintetizados na pacificação social mediante reposição do equilíbrio e do status quo determinado pela lei material.    

Ninguém ingressa, em regra, com ação judicial (excetuada as ações declaratórias) somente para obter uma sentença[3]. A parte persegue um bem da vida, uma vantagem concreta, a corporificação de um direito material, e isso demanda execução, atuação real do Estado na esfera de direitos do devedor, toda vez que o devedor não cumpre tempestivamente a obrigação. É isso que precisa ser compreendido. A tutela almejada só se completa com esta execução.

À medida em que abdicamos da ritualística pura, que marca, de forma ancestral e exacerbada, o ensino do Direito e a praxe judiciária, e compreendemos o processo como um serviço público, e a partir de suas finalidades últimas e concretas, percebemos que a efetiva satisfação do direito material encetado em decisão judicial é tão ou mais importante que seu acertamento e declaração nesta mesma decisão.[4]

Tudo quanto se pensa e se concebe para aprimorar a eficácia da atividade jurisdicional enquanto serviço público relevante, deve ser pensado e concebido em condições de igualdade entre as tutelas cognitiva (declaração, acertamento e sancionamento) e executiva (concretização do direito material obrigacional).

A meu ver, parte da deturpação hermenêutica e da postura ainda obtusa de alguns operadores em relação ao processo de execução e a principiologia que a sociedade moderna e suas demandas exige que lhe ilumine e conduza, decorre desta percepção míope, que foca no acertamento e esquece que ele é só uma fase em muitos casos.

É preciso que transcendamos esta visão difundida e arcaica incrustada na práxis do ensino e aplicação do Direito para que as verdadeiras necessidades, condicionantes e questões relacionadas despontem com clareza.

A partir daí, poderemos nos lançar à avaliação dos diferentes aspectos da influência das ações cognitivas em relação ao processo de execução com uma visão que, percebendo a finalidade real do processo como objeto, desborde de práticas e visões repetidas irreflexivamente como verdades inquestionáveis, e que nos conduzem a posturas e soluções equivocadas, que acabam por sabotar a efetividade da tutela jurisdicional.[5]


2) O fundamento constitucional da busca da eficácia do processo executivo e suas condicionantes

Pouca gente percebe, mas a tutela jurisdicional eficiente e eficaz tem foro constitucional, encontrando previsão em dois incisos do artigo 5º, da CF/88. É um direito constitucional de todo e qualquer cidadão.

O primeiro deles é o inciso XXXV, que alberga o princípio da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional.  A sua redação diz muito menos do que na verdade ele representa. Menciona que a “lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Na verdade, dita redação é fruto daquilo que mencionei alhures, ou seja, uma visão míope e focada no processo de conhecimento. De fato, extrai-se da tímida redação do dispositivo a ilação de que somente a “apreciação” em relação a ameaças ou lesões a um direito material estaria abrangida como direito fundamental. Disso se pode concluir que bastaria a mera emissão de um comando judicial ensejando a “apreciação” (declaração e ou sancionamento) da questão e bastaria. É rematado equivoco.

A rigor, o que deveria constar do dispositivo é que “o Estado, através do poder judiciário, assegurará medidas que evitem lesão ou ameaça a direito.” A inafastabilidade é de intervenção e atuação, em sentido amplo, (não só de controle) do Poder Judiciário, e não tem apenas um sentido negativo, mas é, antes de tudo, a imposição de um dever de atuar, não só de “apreciar”. Por outras palavras, este dispositivo cria para o Estado o dever de constituir um sistema de prestação de tutela jurisdicional que impeça que lesões ou ameaças a direito se concretizem, sistema, este, que deve suprir todas as atividades e medidas necessárias à efetiva realização dos direitos.

Com isso quero dizer que o inciso XXXV impõe ao Estado o dever não só de proferir sentença, “apreciando” lesão ou ameaça a direito e promovendo a declaração do direito e o acertamento e sancionamento (quando necessário), mas também de realizar atividades executivas na realidade empírica a fim de materializar estes direitos na forma da lei e concretamente[6]. O direito subjetivo constitucional criado é não só a obter a declaração e acertamento do direito subjetivo, mas à transformação da realidade de forma a concretizá-lo. Isso se faz através do processo de execução, que regula antes de mais nada, a atividade intrusiva do Estado na esfera de direitos do devedor.  

De outro lado, o artigo 5º, inciso LXXVIII, da CF/88, consagrou a celeridade da tutela jurisdicional como um valor constitucional e um direito subjetivo. Diz o dispositivo que a “todos são assegurados a razoável duração do processo e meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. Processo aqui é cognitivo ou de execução, sem distinção.

Isso se torna induvidoso ao verificamos o teor do artigo 4º do CPC, quando afirma que “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.

Disso tudo se extraem duas condicionantes. Primeiro, a atividade jurisdicional deve, para cumprir seus escopos, providenciar não somente atividades de declaração e acertamento de relações jurídicas, mas também meios de efetivação concreta dos direitos, com atividades materiais na realidade, o que se faz através do processo de execução. Segundo, a atividade como um todo, incluída a satisfação do direito subjetivo lesionado ou ameaçado, deve ocorrer em tempo razoável.

Também se extrai um princípio, qual seja, qualquer suspensão da tramitação de processo, seja de conhecimento, seja de execução, é medida excepcional, que deve ser tomada somente dentro das estritas hipóteses legais e de forma justificada, sob pena de comprometimento do valor da celeridade processual, que é em si um direito subjetivo da parte[7].   


A suspensão do processo de execução

A partir dos apontamentos supra, verificamos que suspender processo é medida excepcional, pois pode fazer periclitar a eficiência da tutela jurisdicional, seja cognitiva, seja executiva, assim entendida como tutela efetiva[8] e célere[9]. Suspensão é exceção, é um mal. Uma vez iniciado processo, o Estado tem o dever de apresentar uma tutela célere, dever este que hoje é extensivo as partes, que devem colaborar para tanto, a teor do artigo 6º, do CPC. 

No caso do processo de execução, tal princípio é ainda mais pertinente, porque temos ou uma sentença ou um documento ao qual é dada força executiva, em ambos os casos havendo prévia exigência de condições que asseguram presunção relativa de certeza, exigibilidade e liquidez.

No caso de um título judicial, houve cognição, plena e exauriente, dando certeza da relação jurídica e de seus lindes. No caso do titulo extrajudicial, há um documento com requisitos e condições que lhe revestem de presunção relativa, de forma que, em ambos os casos, somente motivos de sobeja gravidade podem obstar a marcha da atividade executiva neles lastreada.

Todavia, não era isso o que se notava na legislação pretérita. No regime do CPC de 1973, o processo de execução acabava por favorecer o devedor, pois a regra era os embargos terem efeito suspensivo, pouco importando o seu teor. O processo era de fato um solo fértil para a chicana, para o retardo e para a protelação. 

O devedor lograva criar um quadro de dano colateral ao credor pela demora do processo, de forma que o tempo se tornava moeda de troca para redução do devido, forçando-se acordos ou se protelando processo até uma situação de insolvência. O devedor lograva assegurar anos sem ter de fato de ver a responsabilidade patrimonial realizar-se sobre si.[10]

Hoje, mudada a legislação, laivos desta mentalidade ainda se fazem sentir em detrimento de uma tutela comprometida com resultados concretos, efetivos e céleres, os quais demandam uma mentalidade nova, onde o princípio de que o processo de execução se move a bem do credor (art. 797, do CPC), é de fato considerado, e, embora assegurados ao devedor o devido processo legal e a ampla defesa, não se descura da sua situação de sujeição patrimonial (art. 789, do CPC).[11]  

A suspensão do processo de execução pode se dar por motivos internos ou externos. As hipóteses estão elencadas no artigo 921 do CPC e somente uma delas tem inconcussa relação com outro processo (inciso II). É a hipótese dos embargos recebidos com efeito suspensivo (art. 919, parágrafo primeiro, do CPC).

Há, porém, a hipótese do inciso I, que se reporta aos artigos 313 e 315 do CPC, onde alguns dirão haver hipótese de suspensão com motivação externa, no caso prejudicialidade externa de ação de conhecimento, invocando, para tanto, o artigo 313, inciso V, do CPC.

Sob abrigo desta argumentação, postulam suspensão do processo de execução pela simples pendência de ação cognitiva que questione o titulo. 

É preciso salientar que quando estamos diante de um título executivo judicial, haverá ensanchas a uma fase de cumprimento de sentença que poderá ser atacada por uma impugnação à fase de cumprimento de sentença.

A impugnação à fase de cumprimento de sentença (art. 523 do CPC) embora se assemelhe aos embargos à execução, não se trata de processo autônomo, mas de um incidente, ainda mesmo quando processada em autos separados.

De qualquer sorte, é bom considerar que ela não tem efeito suspensivo automático podendo este ser deferido se: a) Houver garantia do juízo. b) Os fundamentos forem relevantes. c) O prosseguimento da execução “manifestamente” suscetível de “causar grave dano de difícil ou incerta reparação”.

É fácil ver que os requisitos dos itens “b” e “c” caracterizam verdadeiro caso de tutela provisória, como adiante veremos no caso dos embargos à execução e ações ordinárias. 

Há, porém, um caso em que execução de titulo judicial poderá ser atacada por ação ordinária. É a hipótese da ação rescisória, onde pode ser pedida tutela provisória liminar para sustar a execução.

É uma situação sui generis, pois temos uma tutela provisória de cognição sumária tentando obliterar a execução de uma decisão tomada a conta de tutela plena e exauriente, o que enseja questões de solução espinhosa e discutível, abaixo vistas.

Nos demais casos, quando falamos na pendência de ações cognitivas como óbice ao prosseguimento do processo de execução, estamos falando de execução de título extrajudicial.  


Ações cognitivas e sua influência no processo de execução

As ações voltadas a atacar a execução podem ser típicas ou atípicas. O caso de ação típica reside nos embargos à execução. As ações atípicas são ações ordinárias com causa de pedir voltada a atingir o título e os requisitos da sua exequibilidade.

Os embargos à execução constituem ação cognitiva autônoma, que apresenta conexão com a execução[12], com causa de pedir vinculada, e eficácia constitutiva negativa (ou desconstitutiva) ou declaratória. Pode se voltar diretamente contra o título ou a aspectos de natureza processual, sejam relacionados ao exercício do direito de ação (condições da ação da execução) ou aspectos de pressupostos processuais. Seu processamento é em autos autônomos, que podem ou não ser apensos.

A previsão de suspensão da execução por ajuizamento de embargos encontra-se nos artigos 921, inciso II, e 919, §1º, do CPC.

Os embargos, hoje, não tem efeito suspensivo automático. A suspensão da execução pela agregação deste efeito estará condicionada aos requisitos do §1º, do artigo 919, vale dizer, presença de pedido da parte executada, dos requisitos da tutela provisória, e de garantia do juízo. A decisão respectiva é proferida nos embargos e somente depois na execução[13].

A primeira série de questionamentos que pode surgir e ter de ser solvida no caso de pedido de efeito suspensivo concerne à garantia do juízo, quando cabível, e que tem direta relação com a penhora. 

Já a segunda série, que diz com a aferição dos requisitos da tutela provisória, notadamente a “probabilidade do direito” ou a plausibilidade da alegação, ocorrerá em conformidade à causa de pedir invocada, sendo que, no caso dos embargos, o fundamento jurídico é vinculado ou específico, pois o artigo 917 elenca os que podem ser utilizados. 

A “inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação” (art. 917, inciso I, do CPC), diz respeito a casos onde a execução ou está lastreada em documento que não é titulo executivo, ou em título nulo; ou a obrigação não é exigível, seja porque não vencida, seja porque falta condição para tanto, como ocorre no caso do artigo 476 do CC, ou na ausência de implementação de uma condição ou termo. O CPC, porém, qualifica as hipóteses do artigo 476 do CC e da falta de implemento de condição como excesso de execução. Obviamente houve um erro (um dos muitos do CPC) de redação e conceito nisso, pois isso somente poderia ser qualificado como excesso de execução se for parcialmente afetado o objeto dela.

De fato, falar em excesso é admitir que há uma parte da obrigação em execução devida e que parte da execução está se dando para além do que é correto ou de forma diversa. Faltando o cumprimento de obrigação a cargo do credor/exequente ou não se tendo implementado condição que afeta a totalidade da execução não há excesso, há e inexequibilidade ou inexigibilidade total. Por outras palavras, excesso é, por lógica, sempre parcial. 

 Enquanto que a inexequibilidade do título no mais das vezes não carecerá de prova ou a terá na via documental, a inexigibilidade poderá demandar dilação probatória, podendo ser solicitada justificação prévia em caso de prova testemunhal se prova pré-constituída não houver. 

A “penhora incorreta ou avaliação errônea” (art. 917, inciso II) dizem respeito a casos de impenhorabilidade ou de avaliação notoriamente equivocada. A avaliação raramente é incontroversa. Para que tal alegação lastreie pedido de suspensão, deve vir acompanhada de indicação correta do preço por perícia, ou indicação de profissional ou por preços cotados em mercado. A discrepância deve ser significativa e um bom parâmetro do o percentual jurisprudencial usado para caracterização do valor venal.  

No caso do “excesso de execução ou cumulação indevida de execuções” (art. 917, inciso III) o embargante tem que indicar precisamente o excesso e sua causa, havendo, no caso de execução de valor, obrigação processual de indicar o quanto do excesso, sob pena de inépcia (art. 917, parágrafos 3º e 4º). Isso ocorre com apresentação de cálculo com indicação exata das origens das divergências de valor. No caso de obrigação de entrega de coisa, a divergência que caracteriza o excesso pode dizer respeito à espécie do que entregar (qualidade, por exemplo), o que demandará prova pré-constituída documental, como v. g laudos técnicos. O mesmo raciocínio vale para obrigações de fazer e de não fazer; A questão pode surgir quanto ao objeto preciso, ou seja, o que deve ser feito ou não deve, quais suas características?

As hipóteses de excesso estão descritas no parágrafo 2º do artigo 917 do CPC, de redação assaz fraca e misturando coisas diversas.

A cumulação indevida diz respeito à inviabilidade por divergência de partes ou de forma de execução prevista para cada modalidade obrigacional. Não se podem cumular em um mesmo processo ritos diferentes[14]. A suspensão ocorrerá até que o exeqüente opte por uma das execuções.

A retenção por benfeitorias úteis ou necessárias (art. 917, inciso IV) demandará prova técnica, documental ou até testemunhal, esta última a ser produzida em justificação prévia.

A incompetência do juízo suspenderá o processo até ser estabelecido o juízo competente, sem prejuízo da possibilidade de convalidação dos atos já praticados. A questão não demanda em regra apresentação de prova e se houver esta necessidade, será documental[15].

Por fim, o inciso VI do art. 917, afirma que poderá ser aduzido em embargos qualquer matéria que seria lícito ao embargante invocar em ação de conhecimento. Ora, com a devida vênia, tal inciso abarca todos os demais anteriores. Trata-se de uma repetição verdadeiramente inútil[16].

Em cada uma destas hipóteses, em fazendo a alegação e em havendo pertinência, terá o embargante de dar fundamento de probabilidade ao direito alegado (art. 300) ou caracterizar a evidência (art. 311), adiante vistos. 

No caso de ações cognitivas ordinárias, cuja tipologia mais comum é a das ações anulatórias lato sensu[17], a suspensão da execução decorrerá da concessão da tutela de urgência ou de evidência (requisitos comuns aos embargos à execução), que são espécies do gênero tutela provisória.

As ações ordinárias irão voltar-se diretamente a atacar aspectos relativos à existência, validade e eficácia do título, não abarcando aspectos relativos ao exercício do direito de ação ou pressupostos processuais do processo de execução. Disso se infere que tem espectro mais limitado que os embargos à execução.

Todavia, apresentam a vantagem de não haver necessidade legal de segurança do juízo da execução para que liminar seja concedida suspendendo o processo executivo. Isso não impede que tal requisito seja exigido, até por uma questão de paridade com os embargos[18]. No caso da tutela de urgência, a segurança do juízo executivo mediante penhora pode ser exigida com respaldo no artigo 300, parágrafo primeiro, do CPC, como contra-cautela.

A tutela de urgência pressupõe indicação e comprovação pelo postulante, autor da ação anulatória ou embargos, de elementos que evidenciem probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo de conhecimento.

A probabilidade do direito dirá com a causa de pedir invocada especificamente, seja no caso de ação ordinária, seja embargos (ex vi dos artigos 917 e 919, § 1º, do CPC).

Esta probabilidade surge da conjunção de dois elementos. O primeiro são os fatos, dos quais se deverá apresentar prova pré-constituída, cuja forma mais evidente é a documental. Esta prova poderá ser bilateral ou unilateral, sendo à segunda atribuído menor valor probante por razões óbvias.

No caso de necessidade de prova testemunhal, pode ser pedida audiência de justificação prévia[19], conforme faculta o artigo 300, §2º, do CPC.

O segundo elemento diz com o enquadramento legal dos fatos em um fundamento jurídico viável. 

Como se nota facilmente, estes elementos nada mais são do que a causa de pedir da ação de conhecimento. Pode-se, portanto, afirmar, que o embasamento da tutela provisória de urgência nada mais consiste do que respaldar a causa de pedir da própria ação com provas que ab initio fornecem, aplicada a lógica, relativo grau de segurança ao julgador. Por outras palavras, nada mais é do que se antecipar a fase de instrução.

Indo adiante, se pode afirmar que o quadro fático-probatório que legitima a concessão da tutela de urgência é idêntico ao que legitimaria a procedência do pedido se o julgamento fosse feito no momento da sua avaliação e se o contraditório não fosse imprescindível.

A par disso, ainda é necessária comprovação de que a não concessão da tutela e a continuidade do processo executivo irá implicar prejuízo ao resultado útil do processo cognitivo ou embargos.

O resultado almejado pela ação cognitiva é obstar, no todo ou em parte, o processo de execução. Desta forma, se o processo de execução chegasse ao seu escopo pela invasão estatal da esfera de direitos do devedor se poderia afirmar que o resultado útil do processo cognitivo que ataca a execução estaria comprometido.

A partir desta premissa, o prejuízo estaria sempre presente potencialmente, estaria in re ipsa. O prosseguimento da execução sempre comprometeria a ação cognitiva, no todo ou em parte. 

Mas ai surge a pergunta: por que motivo se deve priorizar o direito do devedor em detrimento do credor que tem a seu favor título executivo? Por que o credor exeqüente tem de suportar a inadimplência enquanto tramita o processo de execução e a ação que seja movida contra ele e os prejuízos daí advindos?

Não há motivos plausíveis, sob o ponto de vista da lógica e do sistema processual, para se priorizar a pretensão do devedor sic e simpliciter.

Outrossim, prejuízo sempre haverá ao devedor por conta de uma execução contra si movida, mas este prejuízo nada mais é do que um ato que visa repor o equilíbrio de uma relação jurídica. De fato, a sua esfera de direitos é invadida, mas isso ocorre para afastar a mora em que ele, em tese, incidiu a qual causou prejuízo ao credor. Cuida-se de um prejuízo legítimo que afasta um ilegítimo. Ele, devedor, esta em posição de relativa sujeição patrimonial.

Desta forma, quando falamos em prejuízo para o efeito de aferir a presença dos requisitos da tutela de urgência em ação que ataque uma execução ou seu título, devemos fazer isso em cotejo com o primeiro requisito, ou seja, com a plausibilidade da pretensão.

Em síntese, sempre há prejuízo ao devedor com o prosseguimento da execução na visão deste. Mas o prejuízo que autoriza a concessão da tutela provisória para sustar o andamento da execução é aquele que resulta de uma situação onde a pretensão do autor ou embargante seja extremamente plausível.

A evidência da probabilidade de lograr êxito em atacar a execução é que demonstra o prejuízo que deve ser considerado.  Quando o julgador verificar que a pretensão tem grande probabilidade, o prejuízo do devedor passa a preponderar sobre o do credor.[20]

Também podem ocorrer situações de prejuízo excepcional e transcendente da esfera de direitos do devedor e que podem caracterizar este requisito. Seria o exemplo de uma execução cuja penhora poderá comprometer a funcionalidade de uma empresa ou o cumprimento de obrigações trabalhistas de seus funcionários. Mas também neste caso ainda se há de ter alegação plausível como motivação do pedido de sustação e o autor da ação ordinária ou embargos não está isento de provar a excepcionalidade e gravidade do prejuízo que alega 

Já no caso da tutela provisória de evidência, parecem ser aplicáveis ao caso de ação anulatória ou embargos à execução os incisos II e III do artigo 311 do CPC.

O primeiro caso diz respeito a fatos comprováveis com documentos e presença de tese jurídica que conte com súmula ou julgamento de caso com repercussão geral.

O segundo diz com presença de prova documental dos fatos que seja considerada suficiente, e o réu, no caso o exeqüente ou embargado, não logre opor prova capaz de gerar dúvida razoável.  Seria, o caso, por exemplo, de o devedor que ajuíza embargos ou ação anulatória apresentar instrumento de quitação ou novação que prejudicasse o titulo e o exeqüente réu ou embargado não apontasse causa de invalidade plausível.  

No caso de tutela de evidência, não há necessidade de alegação e comprovação de prejuízo pelo devedor executado. Mas como se nota, para sua caracterização na segunda hipótese, é mister primeiro a manifestação do réu ou embargado (que é o exeqüente).

Fora estas hipóteses, o credor tem a seu favor título executivo e ao devedor, se vitorioso, caberá o solve et repete.[21]

Por conseguinte, verificamos que, seja em caso de ação ordinária, seja de embargos, a suspensão de uma execução que é atacada por estes meios, carecerá de segurança do juízo (exigida como contra-cautela no caso de tutela de urgência) e da presença dos requisitos da tutela provisória, seja para deferir liminar na ação ordinária, seja para atribuir efeito suspensivo aos embargos. A única exceção que poderá ser feita à segurança do juízo diz respeito a tutela de evidência no caso de ação ordinária. 

Não concedida liminar, ou recebidos embargos com efeito suspensivo, a execução é definitiva (a de titulo extrajudicial sempre é)[22] e vai até o fim, nada impedindo a satisfação do direito do credor.


A questão da Ação Rescisória

Antes de tecermos algumas considerações sobre a suspensão da execução por conta do ajuizamento de ação rescisória é importante salientar a nova disciplina do CPC de 2015 quanto a seu espectro de abrangência.

É que na disciplina do CPC anterior somente as sentenças de mérito eram rescindíveis por ação rescisória, ao passo que as demais poderiam ser anuladas com ação ordinária. De fato o artigo 486 determinava que nos casos onde não fosse necessária sentença ou esta fosse meramente homologatória, os atos judiciais poderiam ser rescindidos como os atos jurídicos em geral. 

Desta forma, sentenças que extinguiam o processo por conta de aspectos relativos ao exercício do direito de ação ou pressupostos processuais não podiam ser objeto de ação rescisória. Isso só ocorria nos casos do inciso V do artigo 267, ou seja, caso de acolhimento de perempção, litispendência e coisa julgada, segundo a jurisprudência então vigente e o artigo 268 do revogado CPC. A decadência e a prescrição eram casos de sentença de mérito (art. 269, inciso IV, do CPC revogado). As demais decisões processuais que extinguiam o processo e eram sentenças que não eram homologatórias ou de mérito não podiam ser atacadas vias ação posterior. O revogado CPC previa que a propositura de ação rescisória não inibia a execução da decisão atacada. 

Agora temos mudanças que clarearam as coisas. A transação judicial homologada é sentença de mérito conforme o artigo 487, inciso III, alínea “b”, mas esta decisão não poderá ser objeto de ação rescisória conforme o artigo 966, §4º[23]. 

O parágrafo 2º do artigo 966 diz que a apesar de não serem de mérito, poderão ser rescindiras via ação rescisória decisões que impeçam a propositura novamente da demanda[24] ou neguem seguimento a recurso respectivo.

Agora o artigo 486 expressamente aduz que a decisão que não atinja o mérito não impede nova propositura da ação, mas o parágrafo primeiro deste mesmo artigo diz que nos casos de litispendência (inciso V), e dos incisos I[25], IV[26], VI[27] e VII[28] a propositura novamente da demanda depende da correção do vício. Por outras palavras, nestes casos não se pode manejar a ação rescisória, pois a demanda pode ser novamente proposta (feita a ressalva da nota nº 24).

O novo CPC expressamente ressalva que a propositura de ação rescisória não impedirá a execução da decisão rescindenda excetuada “a concessão de tutela provisória” (art. 969). Embora desde que criada a antecipação de efeitos da tutela, e mesmo antes dela quando só havia a tutela cautelar inominada, nunca tenha havido duvida de que liminar tinha cabimento, agora ela está expressamente prevista.

Dito isso, façamos uma avaliação das hipóteses das causas de pedir tipificadas para ação rescisória e da possibilidade de concessão de tutela de urgência ou de evidência para o fim de sustar a execução.

O inciso I do artigo 966 diz respeito aos casos de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz. Eram casos da chamada “peita”. As condições indicadas não podem ser genéricas[29]. Devem dizer respeito ao caso julgado e que se pretende rescindir. A parte autora da rescisória terá de comprovar a presença de uma das situações mencionadas e sua potencial ligação com o caso concreto. Por exemplo, que a parte contrária deu valores ao juiz para que julgasse de determinada maneira. Não se pode exigir que a parte que ingressa com a ação rescisória comprove que o fato efetivamente atuou sobre a formação da convicção do juiz. Isso está in fieri. Significaria exigir uma prova impossível. A prova testemunhal ou documental (v.g inquérito ou ação criminal em curso) poderá ser manejada para o efeito de postulação da liminar. 

O caso do inciso II do art. 966 refere-se às hipóteses de impedimento e de incompetência absoluta. Os casos de impedimento estão no art. 144 e uma olhada nos seus nove incisos revela que na maioria dos casos as situações ali descritas podem ser comprovadas por prova documental.

O caso do inciso III diz com dolo ou coação da parte ou mesmo de colusão ou simulação das partes na demanda originária. O dolo ou coação em regra dificilmente terá prova documental. A prova testemunhal se afigura como a mais comum e no caso se pedida liminar, se pode produzir por audiência de justificação prévia. A colusão ou simulação será caso demandado por terceiro ou pelo Ministério Público.

O inciso IV, que se refere a coisa julgada, é caso de prova documental Juntam-se elementos que comprovem a identidade de demandas e o trânsito em julgado.

O inciso V concerne a “violação manifesta de norma jurídica”. Cuida-se de matéria com nítido viés de direito, de forma que a comprovação se faz com invocação de julgados e doutrina ou simples indicação da lei.

O inciso VI reporta-se à prova falsa, já assim declarada ou cuja falsidade venha a ser provada no processo rescisório. É uma hipótese em que se tem de indicar prova robusta da falsidade e demonstrar que a prova teve influência no julgamento. Mostra-se o fato da falsidade, por prova documental, pericial ou testemunhal, e indica-se na decisão rescindenda o trecho onde a prova foi utilizada. Não se pode exigir comprovar o grau de interferência na formação da convicção do julgador que teve a prova em questão.

O inciso VII indica caso de prova nova, de que não se tinha conhecimento ou não pode se valer, capaz de assegurar julgamento diverso ao ocorrido.

O postulante terá de trazer a prova nova, que diga respeito aos fatos que estavam na causa de pedir do processo cuja rescisão se quer rescindir via rescisória. Terá de indicar e comprovar que não teve acesso a esta prova ou de que não a pode trazer aos autos por justo motivo. Por fim, ainda tem de mostrar que esta prova tem tal peso que mudaria o julgamento em seu favor. Esta condição terá mais facilidade de ocorrer nos casos de prova “tarifada” que existem na legislação como ressalva o artigo 406 do CPC. Devemos recordar a disciplina dos artigos 212 a 232 do CC bem como as disposições do art. 374 e 373, §1º, do CPC[30].

A última hipótese é a do erro de fato.  Este na própria definição legal ocorre quando “a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado.”

A prova neste caso é ampla, mas o fato não figurar dentre aqueles em vista dos quais o juiz teria de se manifestar é bastante rara.

Todos os casos supra pode ocorrer a tutela de evidência nos termos do artigo 311, incisos II[31] e IV, do CPC.

Nas hipóteses dos incisos V e VII do artigo 966 do CPC, já pode ter havido manifestação anterior sobre a questão ventilada na ação rescisória, e neste caso teremos a possibilidade de uma liminar decorrente de cognição sumária superando a cognição plena e exauriente. Isso clama por maior atenção do julgador e necessidade de maior robustez na causa de pedir e na comprovação da pertinência da ação rescisória, mas não se trata de um impeditivo ao deferimento da liminar suspendendo a execução, sobretudo quando em voga questão jurídica.[32]

Embora refuja aos limites desta abordagem, é importante lembrar que nada impede que sejam formulados pedidos de tutela provisória tanto para o judicium recindens quanto ao judicium rescissorium.[33]

Tem-se assim, que, feitas as devidas adaptações e consideradas as especificidades, o caso da ação rescisória segue as mesmas regras das ações ordinárias contra título executivo extrajudicial, podendo, inclusive, ser exigida contra-cautela (art. 300, §1º, do CPC), para conceder a liminar, pois o depósito do artigo 968, inciso II, não é antecipação de perdas e danos, mas destina-se a se converter em eventual multa.


Da inaplicabilidade do artigo 313, inciso V, do CPC, ao processo de execução

A despeito da clareza lapidar da lei, ainda se encontram precedentes jurisprudenciais que aceitam suspender a execução com decisão proferida no âmbito deste processo e pela simples pendência de uma ação de conhecimento sobre o título. 

Invoca-se para tanto o artigo 921, inciso I, e 313, inciso V, do CPC.

Tem-se como exemplo:

“EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. SUSPENSÃO. POSSIBILIDADE. AÇÃO ORDINÁRIA NA QUAL AS MESMAS PARTES DISCUTEM AS OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS NO TÍTULO EXEQUENDO. CONEXÃO POR PREJUDICIALIDADE. EXEGESE DOS ARTIGOS 313 , V , A, 921 , I , E 55 , § 2º , I, DO CPC. Caso em que se mostra viável a suspensão da execução, uma vez presente uma das hipóteses previstas no artigo 921 do CPC e, nos termos do que dispõe a alínea a do inciso V do artigo 313, do mesmo diploma legal, suspende-se o processo quando a sentença de mérito depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente. Precedentes jurisprudenciais. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70077853117, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Kraemer, Julgado em 08/11/2018) 

Também:

“Execução e embargos à execução. Cédula de crédito bancário. Ação declaratória ajuizada. Suspensão da execução e dos embargos, em razão da prejudicialidade externa. Agravo de instrumento. Inteligência dos artigos artigo 921, I, e 313 , V do CPC . Possibilidade de suspensão da execução, quando a sentença de mérito depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica. Doutrina. Jurisprudência. Decisão mantida. Recurso desprovido. (TJSP AGI 2250507-88.2016.8.26.0000, Relator Virgílio de Oliveira Junior, julgado em 02/08/2017).

Ainda:

“EMBARGOS À EXECUÇÃO. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO. COMPRA DE VEÍCULO. AÇÃO DE RESCISÃO DO CONTRATO PROPOSTA PELA EMBARGANTE. PREJUDICIALIDADE EXTERNA. AUSÊNCIA DE GARANTIA DO JUÍZO. SUSPENSÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO. Em regra, a oposição de embargos à execução não tem efeito suspensivo. Entretanto, nos termos do artigo 919, § 1, do CPC, é possível que, havendo requerimento do embargante e verificado o preenchimento dos requisitos legais para concessão da tutela antecipada, possa ser determinada a suspensão da execução, desde que tenha havido a garantia do juízo. Nesse contexto, uma das causas de suspensão do processo dá-se com o reconhecimento, no caso concreto, de relação de prejudicialidade entre ações, visando evitar a prolação de decisões conflitantes, conforme está previsto no art. 313 , inc. V , alínea ?a?, do CPC . Resta evidente a prejudicialidade externa quando, na ação de conhecimento proposta pelo executado, consta o pedido de rescisão do contrato objeto da execução, em razão de alegado vício no veículo automotor negociado pelas partes. Levando em consideração as particularidades do caso, em especial a relevância da fundamentação, visto que o pedido de concessão de efeito suspensivo não se relaciona apenas com a norma prevista no artigo 919 do CPC , mas aponta para uma interpretação conjunta dele com o artigo 313 , V , “a”, também do CPC , pode ser dispensada a garantia da execução. (TJDF Ap 0716134-56.2018.8.07.0003, Relator Carmelita Brasil, julgado em 28/03/2019). 

Trata-se de jurisprudência equivocada, malsã e que desconsidera não só a letra da lei, mas uma interpretação sistemática e histórica do CPC.

Por, primeiro, em se tratando de execução de título extrajudicial, há disciplina expressa a respeito materializada nos artigos 784, §1º; e 919, §1º, do CPC.

O primeiro diz que “a propositura de qualquer ação relativa a débito constante de título executivo não inibe o credor de promover-lhe a execução”.

De fato, a simples existência de ação ordinária atacando o título ou a execução de titulo não impede que ela prossiga, e não autoriza sua suspensão, exceto se deferida liminar ou recebidos embargos com efeito suspensivo, e com segurança do juízo, em ambos os casos (feita a ressalva supra quanto a este requisito) estando condicionada aos requisitos da tutela provisória, de urgência ou de evidência.

Não se pode prescindir destes requisitos, que devem ser avaliados no processo cognitivo, e, desbordando de exigências legais, se proferir decisão na execução, suspendendo-a pela mera alegação de prejudicialidade externa decorrente da simples propositura de ação de conhecimento. Isso implica voltarmos aos tempos pretéritos, onde o processo de execução era esteio para a recalcitrância do devedor. Cria-se uma forma legalmente não prevista de suspensão em detrimento do princípio e valor da efetividade da tutela jurisdicional, sendo de bom alvitre recordar que, conforme o artigo 797 do CPC, a execução opera em favor do credor/exequente. 

A propósito da incidência do artigo 784, §1º, do CPC, como óbice a que se suspenda a execução pela simples presença de ação cognitiva, cita-se:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE EXECUÇÃO. PROSSEGUIMENTO. AÇÃO REVISIONAL. Não deve ser conhecida da alegação de impenhorabilidade com fulcro no artigo 833, V, do CPC, na medida em que a questão não foi enfrentada pela decisão agravada, de modo que a análise da insurgência diretamente pelo Tribunal implicaria supressão de um grau de jurisdição. O pedido de suspensão da ação de execução não deve ser acolhido, pois o artigo 784, § 1º, do CPC expressamente possibilita o ajuizamento da execução mesmo havendo ação da parte adversa contestando o título executivo. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento, Nº 70079339552, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Maria Rodrigues de Freitas Iserhard, Julgado em: 13-03-2019)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. PRELIMINAR DE COISA JULGADA AFASTADA. PREFACIAL DE EXTINÇÃO DO FEITO POR VÍCIO NA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL REJEITADA. MÉRITO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. SUSPENSÃO DA DEMANDA EM RAZÃO DO POSTERIOR AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE ANULAÇÃO DE TÍTULO. DESCABIMENTO. O artigo 792, do Código de Processo Civil (artigo 921, do NCPC), prevê as hipóteses de suspensão da execução, não constando, dentre elas, a existência de ação anulatória do título que embasa a ação de execução. Incidência do artigo 585, §1º, do CPC (artigo 784, §1º, do CPC/2015), que expõe que o ajuizamento de demanda referente ao débito representando pelo título não inibe o credor de promover-lhe a execução. PRELIMINARES AFASTADAS. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70069640993, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Beatriz Iser, Julgado em: 03-08-2016)”

Reforçando esta conclusão, o STJ já afirmou, sob o égide do anterior CPC cujo regramento o atual repete:

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. EXECUÇÃO DEFINITIVA. LEVANTAMENTO DE DEPÓSITOS JUDICIAIS. EXIGÊNCIA DE GARANTIA. AÇÃO ANULATÓRIA. SUSPENSÃO. NÃO CABIMENTO. 1. Em se tratando de execução definitiva, é prescindível a apresentação de garantia para fins de levantamento dos valores devidos. Precedentes. 2. A simples propositura de ação anulatória do título executivo, inclusive aquela fundada na alegação de falsidade de assinatura, não suspende o curso da execução, porquanto se cuida de hipótese não albergada no art. 791 do Código de Processo Civil. Precedentes. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 616047/SP,  Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 15/05/2015)


Ainda daquele sodalício:

“PROCESSUAL. EMBARGOS DO DEVEDOR. AÇÃO ANULATÓRIA. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. - É definitiva a execução por título extrajudicial, ainda que haja embargos do devedor pendentes de julgamento em grau de apelação. - Proposta a ação de execução pelo credor, posterior ação ordinária intentada pelo devedor, discutindo o mesmo débito, não constitui causa de suspensão da execução. Precedentes. (REsp 595613 / DF, Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ 04/09/2006 p. 260)

Nota-se que somente o artigo 784, §1º, do CPC já solveria a situação afastando a hipótese de suspensão ventilada. Mas é mister irmos adiante, e vermos o que consta de fato dos artigos 921, inciso I, e 313, inciso V, do CPC.

O primeiro diz que a execução se suspende nas hipóteses dos artigos 313 e 315 “no que couber”. A ressalva é expressa e clara e afasta a automaticidade de aplicação dos dispositivos.

Quando vamos ao artigo 313, inciso V, do CPC, lá verificamos constar que o processo poderá ser suspenso quando “ a sentença de mérito”:

“a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente;

b) tiver de ser proferida somente após a verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada a outro juízo;”

E de palmar evidência que a ação que pode ser suspensa por força do inciso V e suas duas alíneas por conta de pendência de ação ou providência judicial, é somente ação de conhecimento, pois é ela que tem sentença meritória a ser proferida.

Nas execuções se podem proferir em regra sentenças meramente terminativas. Excepcionalmente pode surgir no âmbito do processo de execução uma sentença de mérito quando houver manejo de exceção de pré-executividade, sobretudo se alegada prescrição[34]. Mas é uma excepcionalidade raríssima e não vai ocorrer em todas as hipóteses de exceções de pré-executividade.

Esta bem evidente no dispositivo que a prejudicialidade somente se gera quando há uma tutela cognitiva dependendo de outra da mesma natureza, ou seja, a prejudicialidade é homogênea. Não há prejudicialidade entre as tutelas executiva e cognitiva, de modo que a segunda possa obstar a primeira fora das hipóteses de liminar ou embargos com efeito suspensivo.

Salientando a inexistência de sentença de mérito a ser proferida, como regra, na execução, e afastando a aplicação do artigo 313, inciso V, do CPC a esta espécie de tutela, colaciona-se por conta disso: 

“SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO - Ação de execução de título executivo extrajudicial – Ação revisional de contrato objeto da execução - Suspensão em razão de causa prejudicial externa – Impossibilidade – Inteligência do artigo 784, § 1º, do CPC/2015 e Súmula 380 do STJ: - Nos termos do artigo 784, § 1º, do CPC/2015 a propositura de ação relativa a débito constante de título executivo não impede o prosseguimento da ação executiva, não havendo que se cogitar em questão prejudicial do artigo 313, inciso V, letra a, pois não há na ação executiva a prolação de sentença que dependa do resultado de ação revisional. RECURSO PROVIDO. (TJSP, Agravo de instrumento nº 21784896920168260000, julgado em 25/10/2016, Relator Nelson Jorge Júnior, 13ª Câmara de Direito Privado)”

Ainda daquele Tribunal:

Agravo de instrumento – Execução de título extrajudicial – Decisão proferida na origem que determinou a suspensão do feito executivo e dos embargos à execução pelo prazo de um ano, nos termos do artigo 313, inciso V; ”a”, do CPC, com o fim de evitar decisões conflitantes – Descabimento - Hipótese em que a propositura de ação revisional não inibe o credor de promover o feito executivo - Título líquido, certo e exigívelInexistência de decisão de mérito na execução que afasta o risco de decisões conflitantes - Inteligência do § 1º, artigo 784 do estatuto processual - Outrossim, não se verifica nenhuma das hipóteses do art. 921 do CPC /2015 para determinar a suspensão do processo executivo – Decisão reformada – Recurso provido. ( TJSP agravo nº 2069191-40.2019.8.26.0000, julgado em 07/05/2019, Relator Sérgio Gomes, 37ª Câmara de Direito privado).      

Por fim, não bastassem a presença de disciplina específica e a clara inaplicabilidade do artigo 313, inciso V, do CPC para suspender a execução que não tem sentença de mérito, ainda é imperativo a consideração de uma interpretação histórica e sistemática do CPC, a qual também de forma inconcussa repele tal possibilidade.

Estamos em um momento histórico em que a legislação quer avançar e deixar para trás os tempos em que um processo civil em geral, e especialmente o de execução, se pautavam pela morosidade e pela ineficiência, verdadeiramente premiando a conduta do devedor recalcitrante e a forma ao resultado.

Isso hoje não é apenas uma questão de justiça e de política legislativa. Cuida-se de uma necessidade imperativa, pois com o incremento da quantidade de demandas, se os processos não tiverem solução em prazo razoável se terá uma situação de inviabilização.

O espírito que emerge da legislação vai ao encontro do anseio de efetividade, que se compõe de eficiência e celeridade, partindo-se da premissa que o serviço jurisdicional é um serviço público, sendo direito subjetivo do jurisdicionado que seja eficiente (art. 22 do CDC), até porque submetido ao princípio da eficiência (art. 37, caput, da CF/88).

Esta premissa já serve quantum satis para mostrar que a suspensão de qualquer processo é medida excepcional, e que somente se justifica com motivação relevante e para evitar mal maior que a morosidade[35].

O legislador, representando do soberano poder do povo, fez suas opções, e no caso da execução extrajudicial expressamente consignou que a simples propositura de demanda acerca do titulo não obsta o seu prosseguimento. Ao mesmo tempo vinculou a concessão de liminares que possam suspender execuções em ações ordinárias ou embargos aos requisitos da tutela provisória e a segurança do juízo (acrescentamos, e para todas as hipóteses ressalvada a hipótese da tutela de evidência em ação ordinária que não seja embargos). 

Descabe, neste contexto, a pretexto de “interpretação” do texto a criação de aberrações exegéticas as que contrariam a letra clara da lei e a notória intenção do sistema processual. Contrariam e afrontam, produzindo resultado diametralmente oposto ao desejado.

Já dizia Carlos Maximiliano que o brocardo in claris cessat interpretatio de há muito perdeu espaço e que toda a legislação comporta algum nível de interpretação. Diz ele:

“A nenhum jurista ficaria bem repetir hoje as definições de Richieri e Paula Batista. Os domínios da Hermenêutica se não estendem só aos textos defeituosos; jamais se limitam ao invólucro verbal: o objetivo daquela disciplina é descobrir o conteúdo da norma, o sentido e o alcance das expressões do Direito. Obscuras ou claras, deficientes ou perfeitas, ambíguas ou isentas de controvérsias, todas as frases jurídicas aparecem aos modernos como suscetíveis de interpretação.

A palavra é um mau veiculo do pensamento;por isso, embora de aparência translúcida a forma, não revela todo o conteúdo da lei, resta sempre margem para conceitos e dúvidas; a própria letra nem sempre indica se deve ser entendida à risca, ou aplicada extensivamente; enfim, até mesmo a clareza exterior ilude; sob um só invólucro verbal se conchegam e escondem várias idéias, valores mais amplos e profundos do que os resultantes da simples apreciação literal do texto.

(...)

Não há fórmula que abranja as inúmeras relações eternamente variáveis da vida; cabe ao hermeneuta precisamente adaptar o texto aos fatos, que dia a dia surgem e se desenvolvem sob aspectos imprevistos.

Nítida ou obscura a norma, o que lhe empresta elastério, alcance, dutilidade, é a interpretação. Há o desdobrar da fórmula no espaço e no tempo: multiplicando as relações no presente, sofrendo, no futuro, as transformações lentas, imperceptíveis, porém contínuas, da evolução”.[36] 

Isso é absolutamente correto. Mas, não menos verdade é que a atividade interpretativa deve se limitar aos lindes do que se pode, com bom senso e razoabilidade, extrair do texto legal. Quando um sentido oposto ao que consta do texto é extraído a título de interpretação, ou o texto está muito errado em sua redação, ou está decrépito e obsoleto, ou o aplicador extrapolou de suas funções. A base maior da lei é o que diz o legislador, não o jurista.

E isso é tanto mais válido quando o texto em questão é recente, e não se verificam mudanças sociais que legitime a discrepância entre o que está no texto e o que a justiça tem como meta.

No caso telado, a solução alvitrada de interpretação extensiva do artigo 313, inciso V, do CPC, ao processo de execução de forma genérica e geral, cria, inclusive, um sentido que contrasta com aquilo que o sistema, que busca celeridade e eficiência, requer.

Obviamente que uma interpretação destas substitui a objetividade da lei pelo subjetivismo do aplicador, e não pode ser considerada correta.


Das conclusões

O Direito, e especialmente o processo, servem a um propósito. Não constituem um sistema fechado que se justifica em si mesmo. A realização do Direito como expressão da justiça através de um processo judicial é um serviço público, que está sujeito aos mesmos princípios aplicáveis a todo serviço de natureza publica e custeado pelo contribuinte e que cumpre uma finalidade funcional no Estado de Direito.

Não bastasse a incidência do artigo 37, caput (princípio da eficiência) o caso da tutela jurisdicional ainda tem direitos fundamentais inseridos no artigo 5º, incisos XXXV e LXXVIII, da CF/88, relativos à eficiência e celeridade da tutela jurisdicional.

A leitura do artigo 5º, inciso XXXV, deve ser a de que ali se prevê uma intervenção eficaz do Poder Judiciário para afastar lesão ou ameaça a direito, ai se incluindo a atividades satisfativa do direito, pois muitas vezes uma sentença não basta para conceder à parte aquilo que o Direito lhe defere.

O processo de execução não pode continuar a ser tratado como algo secundário, pois dele depende a concreta materialização do direito subjetivo.

O atual CPC em parte caminhou para mudar alguns aspectos deste tratamento secundário. Uma das feições disso se verifica no caso do artigo 784, §1º, do CPC que inibe a suspensão da execução pelo mero ajuizamento de ação que se volte contra o titulo. No mesmo norte, o artigo 919, §1º, ao exigir além da garantia do juízo, a presença dos requisitos da tutela provisória para que sejam recebidos com efeito suspensivo.

Isso mostra a excepcionalidade da suspensão do processo, tenha ele a natureza que tiver. O processo deve ser considerado um mal contra o qual se bate permanentemente o julgador. A meta e fazê-lo se extinguir com justiça no mais breve tempo possível.

As hipóteses de suspensão do processo de execução por pendência de ações cognitivas somente se dá na hipótese de concessão de liminar em ação ordinária, ou recebimento de embargos com efeito suspensivo. Pretender criar outras formas de suspender a execução por conta de ações cognitivas fora destas hipóteses implica exegese contra legem e que afronta os princípios do novo CPC.

Aqueles que assim agem, tornam a um passado de triste lembrança, onde o processo de execução favorecia a recalcitrância do devedor, a velhacaria, o descumprimento da palavra empenhada.

A possibilidade de interpretação conferida ao aplicador do Direito não vai ao ponto de lhe conferir capacidade de burlar e deturpar não só a letra da lei, como o seu inequívoco sentido, tanto mais quando a lei é recente.

Não se aplica ao processo de execução o artigo 313, inciso V, do CPC, que diz respeito somente ao processo de conhecimento, onde exista uma sentença de mérito dependendo de julgamento de outra causa. Só em casos raríssimos se poderá ter uma sentença de mérito sendo proferida em uma execução.

Todos devem ter o compromisso de atuar para a rápida solução dos litígios, a começar pelo juiz (art. 6º do CPC). O devedor tem o direito de pedir o que lhe aprouver, mas cabe ao juiz modular o exercício do direito de defesa, repelindo pedidos que não tenham respaldo legal, o que a rigor é litigância de má-fé.

Só em hipóteses excepcionais o processo deve ser suspenso, e, no caso do processo de execução, tendo o credor/exeqüente um título executivo com presunção de certeza, liquidez e exigibilidade, ainda mais excepcional deve ser esta suspensão, decorrendo de presença dos requisitos legais específicos e expressos e de decisão fundamentada.

Basta de um processo marcado pela morosidade e de um Poder Judiciário que se arvora em legislador. A justiça não emergirá deste quadro.

Janeiro de 2020.  


Notas

[1] Cuja fórmula essencial é a sentença condenatória. Ela diz o direito e o sanciona com a possibilidade de execução forçada.  

[2] E o direito brasileiro é um dos mais pródigos em criar títulos executivos extrajudiciais. 

[3] Mas mesmo estas em regra terão algo a se executar, mesmo que sejam apenas os honorários. Quase sempre temos uma condenação em todo tipo de sentença, tenha ela o objeto principal que tiver.

[4] Somos ensinados a pensar no processo de conhecimento e na sua ritualística e deixamos de pensar no processo como algo voltado a uma finalidade prática. O rito, a forma, serve a um objetivo de fundo, e é ele que importa, pois é a razão de existir do processo e do Direito. 

[5] Esta visão finalística do processo deve iluminar todos os seus segmentos. Os que ensinam, os que postulam e os que julgam. 

[6] Lembremos que o Estado tem o monopólio da força e o exercício arbitrário das próprias razões constitui, inclusive, crime. Isso é uma característica de nosso sistema. Nos sistemas de inspiração anglo-saxã há a possibilidade de medidas executivas praticadas pela própria parte. 

[7] É um direito que se volta, sobretudo, em vista do Estado-Juiz, mas que também tem emanações direcionadas a parte contrária. As partes tem o dever de lealdade processual. O direito de defesa não acoberta o uso de qualquer expediente visando procrastinar ou dificultar o andamento processual. Infelizmente os latinos são lenientes com a litigância de má-fé. A chicana e a obliteração do processo atingem e prejudicam não só a parte contrária, mas o Estado, que tem um serviço seu atingido em sua eficácia. 

[8] Poderíamos incluir a celeridade no conceito de efetividade. Mas aqui uso efetividade como o resultado da tutela jurisdicional quando ela defere à parte tudo aquilo que ela teria direito em vista do direito material. A meta seria que se produzisse um resultado equivalente aquele que teria azo se processo não tivesse ocorrido. Porém, o processo sempre implica demora, e isso já implica em si um dano colateral.   

[9] A celeridade deve ser entendida como uma duração razoável. É bastante fácil identificar os casos onde a razoabilidade é desconsiderada e as Corregedorias fazem pouco e nada.   

[10] Em muitos casos isso fazia pessoas desistirem de ingressar na Justiça. Muitas lesões se concretizaram pelo sombrio prospecto representado pelo calvário do processo judicial.

[11] Embora o artigo 7º do CPC mencione a igualdade de tratamento que deve ser deferida às partes, isso não infirma que possa haver situações diferentes em cada caso, consideradas as faculdades, direitos e obrigações das partes. O executado está em situação de sujeição patrimonial e sua situação é diferente da do credor exeqüente. Isso de forma alguma infirma o artigo 7º, mas resulta dos comportamentos pretéritos das partes e da incidência do direito material. Esta diferença, todavia, deve sempre obedecer à lei. É isso que o art. 7º assegura.  

[12] Aqui, conexão não tem o sentido tradicional da locução, pois a execução não será julgada junto com embargos. A conexão ocorre por prejudicialidade, mas isso não implica nem mesmo apensamento obrigatório. O que há é necessidade de que ambas as ações se processem no mesmo juízo a fim de que a decisão dos embargos não seja prejudicada pela execução.  

[13] Ou simplesmente comunicada na execução remetendo-se cópia.

[14] Uma execução de valor não se pode cumular com uma de entrega de coisa certa ou de fazer ou de não fazer. Os ritos são diversos e haveria balbúrdia processual. Todavia, multas impostas em execuções de obrigações podem ser cumuladas com uma obrigação outra de valor desde que envolvidas as mesmas partes. Inclusive em havendo multa de valor aplicada em execução de obrigação de fazer ou não fazer ou de entrega de coisa (astreintes) este valor deverá ser objeto de execução separada.  

[15] Será o caso, por exemplo, do foro de eleição. No mais das vezes ele está previsto no próprio titulo executivo. Todavia, não podemos ignorar a hipótese de um instrumento posterior onde matéria seja tratada pelas partes e que não esteja nos autos da execução.  

[16] O artigo poderia conter somente esta afirmação e a limitação de exigir a indicação do valor correto em caso de excesso, nada mais. Qual sentido se prever casuísmos e depois usar uma fórmula genérica? 

[17] Incluem ações declaratórias de nulidades ou voltadas a decretar a anulabilidade. A nulidade tem efeito ex tunc; a anulabilidade ex nunc. A nulidade dá azo a sentença declaratória, ao passo que a anulabilidade é constitutiva. Também poderá ser objeto de ação ordinária a declaração de inexigibilidade do titulo, ou de sua iliquidez. A totalidade ou somente parte do título pode ser atingida.   

[18] Quando uma forma apresenta certos requisitos, permitir-se o manejo de forma alternativa com mesmo resultado sem eles implicará fadar a primeira ao desuso. Fora isso, há que se considerar que se o legislador exigiu nos embargos a segurança do juízo, tal garantia a bem do credor deve viger como regra para qualquer forma de suspensão da execução por pendência de ação ordinária. O juízo de valor feito é que a segurança do juízo é importante na medida em que evita que o devedor apenas retarde o processo de execução e enquanto dilapida patrimônio. O tempo sem a segurança do juízo é um fator que atua contra o credor e pode inclusive fazer o processo de execução malograr.      

[19] Realiza-se a audiência antes de analisar a liminar, devendo, como regra, ter a participação de ambas as partes, situação que somente é excepcionada se a informação ao réu implicar possibilidade de risco à efetividade da liminar. Colhida a prova testemunhal específica para a liminar, se terá elementos para avaliação.

[20] Ou seja, não se pode aceitar alegação genérica de prejuízo. Este, de forma genérica, sempre ocorrerá ao devedor sob sua perspectiva.  

[21] O credor exeqüente não teve de aguardar todo processo? Por que o devedor, se vitorioso no todo ou em parte não pode ter o mesmo critério de ter de se valer da tutela jurisdicional? Suspender processo de execução por possibilidade de causar prejuízos ao devedor implica em trocar um prejuízo possível a ele por um prejuízo certo ao credor.

[22] Erro muito comum que é cometido é pensar que a interposição de embargos à execução torna a execução “provisória” ou de alguma forma limitada, de forma que não possa ir até a efetiva satisfação do credor. Somente a execução de título executivo judicial pode ser provisória e sofrer limitação por conta desta condição. A execução de título extrajudicial é sempre definitiva e, salvo ajuizamento de embargos recebidos com efeito suspensivo ou concessão de liminar em ação ordinária, não será suspensa por conta do ataque do devedor, podendo ir até o final, ou seja, a satisfação do credor. 

[23] Transigir é um ato de disposição das partes que é homologado pelo juiz. Quando fala de sentença, o CPC já deveria tecer os esclarecimentos do alcance do caráter meritório desta decisão homologatória para efeitos de rescisão.  A redação como está dá margem a equívocos e duvidas. 

[24] Um adendo precisa ser feito. E que quando se mudam partes, pedido ou causa de pedir, a demanda não é mais a mesma. É outra demanda. A redação não deixa claro se o conceito de nova propositura da demanda diz respeito à demanda exatamente como antes proposta ou se se refere aquela que resulta da correção de problemas que redundaram na sua anterior extinção.

[25] É o caso de indeferimento da inicial que, conforme o art. 330 do CPC pode se dar nas seguintes hipóteses: 1)  Inépcia, que ocorre com falta de pedido ou causa de pedir; pedido indeterminado fora das hipóteses legais; incompatibilidade de pedidos. 2) Manifesta ilegitimidade de parte. 3) Falta de interesse processual. 4) Não atendimento as prescrições dos artigos 106 e 321do CPC.   

[26] Diz respeito aos pressupostos processuais, subjetivos (relativos as partes e ao juiz) e objetivos.

[27] Falta de legitimidade e interesse processual, que são condições da ação. Sobre elas e sobre as condições da ação, ver de minha autoria “O saneamento do processo e a preclusão”, escrito sob a égide do CPC anterior, mas ainda com ensinamentos válidos. Está disponível in “https://docs.google.com/file/d/0ByIqIKbd6naPMzg0MzdmYzUtMzUwYy00YWE1LWIzOTYtZDcxYTQxMjNiZDU5/edit”  

[28] Presença de convenção de arbitragem.  

[29] Ou seja, não podemos tomar uma situação em que se tenha constatado corrupção  de um juiz em outro processo ou processos para se manejar ação rescisória se nenhuma ligação existe com mínima comprovação em relação ao processo cuja decisão se pretenderia rescindir. 

[30] Isso vale para todos os casos. A carga dinâmica da prova e as presunções devem ser consideradas igualmente para o efeito de concessão de liminares.

[31] Para o caso do artigo 966, inciso V, em tese.  

[32] Exemplificativamente temos os casos da incidência da multa de 10% nas execuções do processo trabalhista ou dos honorários sem credencial sindical onde ainda há tribunais teimando em desconsiderar a jurisprudência do TST. São casos onde a cognição plena e exauriente produz verdadeiras teratologias contra lei ou jurisprudência consolidada e sumulada de tribunal superior.      

[33] O pedido de tutela provisória do judicium rescindens se volta a suspender a execução da decisão rescindenda, pois ele visa a anular a decisão. O pedido relativo ao judicium rescissorium pode ter por objeto qualquer bem da vida e a rigor deve ser voltar a obter aquilo que a demanda originária pretendia. Como no judicium rescissorium se busca depois da anulação o rejulgamento do mérito da demanda originária cuja decisão se rescindiu, a situação do pedido liminar que pode ser então feito é igual ao pedido de liminar que se poderia fazer na demanda originária.      

[34] Uma das características da sentença de mérito é a formação da coisa julgada, e esta só existe em caso de exceção de pré-executividade quando alegada prescrição. A princípio, todas as outras alegações carecem de algum nível de dilação probatória e a priori sequer poderia ser veiculada em exceção de pré-executividade.     

[35] Pior que ela (a morosidade), seria a perda completa da atividade jurisdicional. 

[36] Hermenêutica e Aplicação do Direito, 11ª Edição, Forense, 1981, pgs. 35-37.


Autor


Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelo autor. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.