Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/55722
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

O crime de rixa e responsabilidade penal do agente

O crime de rixa e responsabilidade penal do agente

||

Publicado em . Elaborado em .

Principais aspectos acerca do crime de Rixa, à luz da atual doutrina penalista brasileira.

RESUMO:A respeito do crime de rixa qualificada a legislação é pouco abrangente o que dá aos doutrinadores o papel de interpretá-la. Por isso, surgem relevantes questionamentos acerca da responsabilidade penal do agente no crime de rixa com figura qualificada, como por exemplo, o caso de rixa com resultante em morte em que se identifica o autor do homicídio ou na resultante em morte em que o responsável pelo dolo de dano não é identificável. Nesse sentido, há várias correntes doutrinárias que divergem entre si das quais será abordado no presente “paper”. Para isso, inicialmente o delito de rixa será analisado apontando suas principais características e em subtópicos individuais será abordado as modalidades do crime de rixa e as possiblidade de concurso de crime. Depois, abordar-se-à as principais questões que circundam o delito de rixa e objetos principais de estudo, como: a responsabilidade objetiva do agente e o bis in idem. Tendo por fim o presente “paper” mostrar que o crime de rixa, por conta da legislação pouco abrangente,e acaba por deixar algumas lacunas, cabendo a doutrina interpre-la de forma consciente, no intuito de promover maior segurança jurídica e justiça na imputação da pena.

Palavras-chave: Rixa; Bis in idem; Responsabilidade penal objetiva


INTRODUÇÃO

Diante dos movimentos sociais frequentes no Brasil, é comum o indício de tumultos que se tornam brigas violentas incriminadas de crimes de rixa. Esse tipo penal está previsto no artigo 137 do Código Penal e possui duas modalidades, a rixa simples e a qualificada, nos casos de lesão corporal grave e homicídio.

A rixa se caracteriza por ser um crime plurissubjetivo com concurso de pessoa necessário, ou seja, para ser caracterizado como crime de rixa é fundamental a participação de 3 ou mais pessoas.

No entanto, nos casos em que é perceptível a separação de dois grupos antagônicos, não se define como rixa, pois nela não há uma identificação de grupos. Por não ser possível identificar quem iniciou a rixa todos os participantes são responsabilizados.

Essa confusão de sujeitos ativos e passivos torna o crime de rixa o objeto de estudo de muitos estudiosos do direito, visto que a legislação aborda o tema de forma muito sucinta.

As divergências entre correntes doutrinárias se intensificam quando há uma figura qualificante, como a lesão corporal grave e o homicídio. A definição da responsabilidade penal dos envolvidos em rixa qualificada ainda é o centro de intensas discussões.

 O estudo do tema traz uma perspectiva mais profunda acerca da punibilidade do agente, além do conhecimento das várias correntes doutrinárias, dando enfoque à corrente majoritária.

Serão abordadas duas problemáticas relevantes para a compreensão do crime de rixa, principalmente no tocante a modalidade qualificada que são o bis in idem e a responsabilidade objetiva do agente.

 Esses dois temas são temidos pelo direito penal, pois antigamente eles eram usados como forma de incriminar o agente injustamente. Eles foram excluídos do direito penal brasileiro, no entanto ainda se faz presente em algumas leis.


1.DO CRIME DE RIXA

O crime de rixa está tipificado no artigo 137 do Código Penal, que pune a participação em rixa, exceto se for para separar os “briguentos”. As penas são detenção de 15 dias a 2 anos, ou o pagamento de multa. É um delito de baixa ofensividade que recentemente foi criminalizado como crime autônomo.

Segundo BITENCOURT (2013), a evolução do crime de rixa se deu pela sua autonomia e desvinculação ao crime de lesão corporal ou homicídio. A partir da codificação das leis penais surgiram dois tipos de sistemas: a participação na rixa e o homicídio ou lesão corporal grave em rixa.

Segundo HUNGRIA (1955 apud BITENCOURT, 2013, p. 758):

“O primeiro por sua vez apresenta duas formas: a da solidariedade (Códigos da Suécia e do Cantão de Friburgo) e a da chamada ‘cumplicidade correlativa’ (Códigos austríaco, húngaro e espanhol). Duas modalidades, igualmente, apresenta o segundo sistema: o da punibilidade da rixa em si mesma quando ocorra homicídio ou lesão corporal (Código alemão, holandês ou italiano de 1889)  e o da punibilidade da rixa simples, funcionando o eventual resultado letal ou lesivo como condição de maior punibilidade, ressalvada a responsabilidade individual do autor do homício ou lesão (Código do Cantão de Vaud, de 1844)”

Nosso código, contuto, adotou para o crime de participação em rixa a autonomia, excluindo as teorias da solidariedade e da cumplicidade. Isso significa que em caso de rixa em modalidade qualificada não sendo descoberto o agente responsável pelo dolo de dano, todos os participantes serão punidos na modalidade qualificada.

O delito de rixa surge para evitar impunidades decorridas da impossibilidade de identificar o agente agressor e o agente agredido, proporcionando maior segurança jurídica. Como afirma MAGGIORE (1972 apud GRECO, 2012, p. 380):

“criar um delito a parte, como a rixa, para castigar uma luta entre somente duas pessoas, cujas respectivas responsabilidades podem ser individualizadas. Quando duas pessoas contendem, ou querem injuriar-se, ameaçar-se ou ferir-se, e por tanto podem responder eventualmente por suas injúrias, ameaças ou lesões (consumadas ou tentadas), com a situação precisa da parte culpável ou da parte lesionada, uma a respeito da outra, a lei não tem necessidade de criar um delito especial para castiga-las. Se se configura ad hoc o delito de participação na rixa, é porque na incerteza da responsabilidade de cada pessoa, indiscernível a causa da contenda, lhe parece conforme a justiça castiga-las somente pelo fato de haver tomado parte da rixa.”

1.1Definição, bem jurídico tutelado, sujeitos do crime e elemento subjetivo

Antes de iniciar o aprofundamento do assunto é necessário conhecer o que é rixa, pois o código penal apenas estabeleceu crime à participação na rixa. Ela pode ser identificada como um tumulto generalizado, com agressões mutuas, que tenham vias de fato ou violências, praticadas por três ou mais agentes (CAPEZ, 2012).

A rixa poderá ser desencadeada por duas formas: ex proposito ou ex improviso. A ex proposito surge de forma planejada com hora, data e local pré-determinados, enquanto a ex improviso acontece segundo a circunstância.

Segundo, CAPEZ (2012) a concepção da rixa  ex proposito é divergente na doutrina, pois para alguns estudiosos, a rixa surge apenas de forma ex improviso, no entanto, não há um consenso sobre o assunto.

 Como exemplo, MORAIS (1944 apud GRECO, 2012, p. 380, grifo nosso) define rixa como “o conflito que, surgindo de improviso entre três ou mais pessoas, cria para estas uma situação de perigo imediato à integridade corporal ou a saúde”.  

O bem tutelado com a criminalização da rixa de forma imediata é a incolumidade física e mental do ser humano e de forma mediata é a ordem pública (CAPEZ, 2012).

 Segundo BITENCOURT (2013), a concepção de que o bem tutelado é a incolumidade física e mental do ser humano se baseia em interpretações doutrinárias, pois o legislador não deixou expresso na lei, como nos artigos 133 e 134 do Código Penal. Por isso, adotou-se a mesma lógica do crime de abandono de incapaz, no que pese a proteção à saúde física e mental da pessoa.

 O autor levanta uma discussão pertinente sobre o assunto, abordando o próprio conceito de tipicidade, para explicar o porquê de a doutrina ter adotado o bem jurídico tutelado do crime de rixa a incolumidade física e mental do ser humano.  A explicação leva em consideração o crime de abandono de incapaz, que tem como objetivo proteger o mesmo bem tutelado pelo crime de rixa e que também não está expresso em lei.

“Adotamos aqui os argumentos que utilizamos ao examinarmos o crime de abandono de incapaz. Assim, embora a descrição típica não se refira expressamente à vida ou à saúde do agente, sua preocupação com esses bens jurídicos está exatamente na punição da simples participação na rixa, pois o legislador reconhece que esta possibilita, em tese, a produção de maiores danos à integridade físico-psíquica do indivíduo. E a própria posição geográfica desse tipo penal, a exemplo dos antecessores, admite a afirmação de que a objetividade jurídica é efetivamente a incolumidade da pessoa humana. Na verdade, embora a rixa seja um crime de perigo para a integridade físico-psíquica, a grande preocupação está no dano que dela pode resultar” (BITENCOURT, 2013, pag.759-760).

Dessa forma, o crime de rixa se configura como um crime de perigo abstrato e a sua criminalização surge como função de garantia ao cidadão.

Segundo CAPEZ (2012), ele se objetiva na própria participação, podendo ser direta ou indireta (participação em sentido estrito).

A participação direta é a forma por meio da qual o indivíduo participa com socos, pontapés ou com o auxílio de algum material.

 A participação em sentido estrito é quando o individuo, indiretamente, induz ao surgimento da rixa, ajudando o outro a iniciá-la. Ela pode ser material ou moral, material é quando o indivíduo disponibiliza a outro algum tipo de instrumento, como punhal ou arma, enquanto a moral é o próprio incentivo ou instigação ao crime.

HUNGRIA (1958 apud CAPEZ, 2012, p. 269) distingue a participação na rixa e a participação no crime de rixa “no primeiro caso, dá-se a interferência pessoal na briga, o ingresso efetivo no entrevero; no segundo, dá-se o concurso (material ou moral) para a rixa, mas sem intervenção direta nesta.

 O código, porém, para o efeito da pena, não faz distinção alguma (arts. 137 e 25): todos os participantes incorrem na pena cominada à rixa”. Nesse caso todos serão condenados ao crime de participar de rixa, no caso de participação material, será por concurso material, sem vias de fato.

 No entanto, BITENCOURT (2013) diz que não será punido quem participa apenas do momento da discursão, antes do início da rixa, exceto se ele tiver contribuído para o início da rixa.

“Quem intervém para separar os rixosos não infringe o tipo penal, pois falta-lhe o elemento subjetivo, qual seja, a vontade consciente de participar do conflito. No entanto, se o “pacificador” exceder-se do intuito de apartar os rixosos, transforma-se em participante, e deverá responder pelo crime de rixa.” BITENCOURT (2013, p. 763)

A rixa é um crime de concurso necessário, com no mínimo três participantes e não pode ter grupos definidos, pois se apresenta como um legítimo tumulto. Entre os participantes serão computados também os inimputáveis, mesmo não sendo responsabilizados pelo crime de rixa, se houver três pessoas, sendo dois inimputáveis e um imputável, este responderá pelo crime de participação em rixa (GRECO, 2012).

Nos casos de brigas de torcidas, muito frequentes nos estádios de futebol brasileiro, não é definido como crime de participação na rixa, como diz o artigo 137 do Código Penal, mas como rixa esportiva tipificado no artigo 41-B da Lei nº 10.679/2003. Como afirma BITENCOURT (2013, p.765) “estando definida a posição dos contendores, não haverá rixa”.

Os sujeitos no ato do crime agem um contra o outro, sendo ativo em relação a agressão aos demais e passivo em relação a agressão sofrida (BITENCOURT, 2013). Para CAPEZ (2012), o Estado também pode ser considerado uma vítima em segundo grau do crime de rixa, pois o crime de forma mediata atenta contra a ordem e tranquilidade, ou seja, a incolumidade pública.

O elemento subjetivo é o animus rixante que representa o dolo, a vontade, o querer de participar da rixa.

 Segundo CAPEZ (2012), se houver por parte de algum dos agentes o dolo de dano, ele responderá por participação na rixa (simples ou qualificada) em concurso material, enquanto os outros responderão por participação na rixa simples ou qualificada.

A consumação do crime acontece com a presença de atos de violência ou vias de fato, apenas palavrões ou discursões não o caracterizam.

Assim afirma HUNGRIA (1955 apud GRECO, 2012, p. 383):

“É indispensável à configuração da rixa, a parte objecti, que haja vias de fato, atos de militante hostilidade (socos, empurrões, engalfinhamentos, pontapés, cambapés, safanões, arremesso de objetos contundentes, eventualmente disparos de tiros, etc). Não basta uma simples altercação, por mais acalorada que seja. É preciso que os contendores venham às mãos, formando-se o entrevero, ou que, embora sem o contato dos brigadores, estes se acometam reciprocamente, por exemplo, com pedradas ou disparos de arma de fogo.”

 Em relação à possibilidade de tentativa, a doutrina se mostra divergente. Segundo JESUS (2005), é possível a tentativa nas rixas ex proposito, pois por ser uma rixa programada, poderá ser impedida por força policial.

Contudo, MIRABETE (2007) afirma não ser possível tentativa, pois o crime se consome no seu acontecimento, no caso de rixa ex proposito que não ocorreu, os participantes não podem ser punidos por tentativa em participação em rixa, nesse caso eles poderão ser responsabilizados por tentativa de lesão corporal.

1.2.Modalidades do crime de rixa

O delito de rixa possui duas modalidades: a simples e a qualificada. O artigo 137, do Código Penal, diz que a modalidade qualificada acontece quando há morte ou lesão corporal grave, com detenção de 6 meses a 2 anos.

Apesar do crime de rixa indicar um ato comissivo, ou seja, implica em uma ação ou atitude, há autores que concordam na possibilidade única de modalidade omissiva no crime de rixa.

Como afirma GRECO (2012, p. 386):

“Entendemos que somente será possível a modalidade omissiva no delito de rixa quando o omitente gozar do status de garantidor. Assim, por exemplo, suponhamos que no interior da cela de uma delegacia de polícia os cincos detendos que ali se encontravam comecem a se agredir reciprocamente, gerando uma pancadaria indiscriminada. O carcereiro, que tinha a obrigação legal de evitar ou, pelo menos, interromper as agressões apartando os contendores, a tudo assiste passivamente, divertindo-se, inclusive, com o ocorrido. Nesse caso, poderá o carcereiro, na qualidade de garantidor, ser responsabilizado pelo delito de rixa, por omissão.”

Para a doutrina majoritária, existe a possibilidade de legitima defesa no delito de rixa. Segundo HUNGRIA (1955 apud BITENCOURT, 2013, p. 770), “quem, por exemplo, intervém na rixa em defesa própria ou de terceiros poderá invocar a excludente, pois não há participação em rixa sem animus rixandi”.

No entanto, CAPEZ (2012) afirma que a possibilidade de legitima defesa ocorre apenas nos casos em que a rixa se torna mais grave, por exemplo, quando o indivíduo, participante da rixa, saca uma arma para se defender. Nesse caso ele será punido por rixa qualificada, sem concurso com o homicídio.

A rixa simulada não é considerada crime de participação em rixa ainda que resulte em algum tipo de agressão, como dispõe o artigo 137, pois não possui o animus rixandi e sim o animus jocandi, como afirma GRECO (2012)

1.3.Concurso de crime

Há alguns casos de crimes que ocorre o concurso material, como o homicídio e a lesão corporal grave. Segundo BITENCOURT (2012), o concurso material difere do formal, no que pese a conduta do agente, no concurso formal com apenas uma conduta se pratica dois ou mais crimes, enquanto no concurso material há duas ou mais condutas (dolo de dano e o animus rixandi) que geram dois ou mais crimes.

Para melhor ilustrar, CAPEZ (2012) faz uma relação dos principais crimes que ocorrem concurso material, tais como: homicídio, lesão corporal, porte ilegal de arma, crime de disparo de arma de fogo, crime contra o patrimônio.

Entretanto, BITENCOURT (2012, p. 771) ressalta que “é indispensável a relação de causalidade, isto é , que a rixa seja a causa do resultado, isto é, da lesão grave ou da morte”. Dessa forma, não serão qualificados os casos de morte ou lesão corporal grave que ocorrerem antes ou depois da rixa.

Para GRECO (2012), o concurso de crime não se apresenta de forma material, mas formal, pois com uma só conduta o agente comete dois ou mais crimes.

“Apesar de a posição majoritária adotar a tese do concurso material de crimes, permissa venia, entendemos, no caso de concurso entre a rixa e outra infração (lesões leves, graves ou mesmo homicídio), que a regra do concurso formal é que deverá ser aplicada, uma vez que, se analisarmos detidamente os fatos, veremos que, na verdade, o que existe é tão somente uma situação de rixa, que dizer, o agente está envolvido numa situação de agressão tumultuária, na qual sua  vontade é dirigida finalisticamente a causa les~~oes ou mesmo a morte do outro contendor. O dolo, aqui, é o de produzir um dano à vítima, também contendora.” GRECO (2012, p. 391)


2.A RESPONSABILIDADE PENAL DO AGENTE NO CRIME DE RIXA

A modalidade qualificada do delito de participação em rixa traz dois principais questionamentos muito debatidos na doutrina no que pese a responsabilidade penal do agente.

Nos casos de rixa qualificada com resultado morte em que o autor do homicídio é desconhecido, todos os participantes da rixa serão penalizados por participação em rixa na forma qualificada (BITENCOURT, 2013).

Para alguns doutrinadores, essa punibilidade na forma qualificada a todos, agride o princípio da responsabilidade subjetiva ou culpabilidade, trazendo à tona a responsabilidade objetiva do agente (CAPEZ, 2012).

O princípio da culpabilidade, segundo BITENCOURT (2012, p. 51) indica que “não há crime sem culpabilidade”, ou seja, a culpabilidade é conditio sine qua non para a punibilidade. Esse princípio tem como objetivo afastar a responsabilidade objetiva utilizada pelo Direito primitivo que punia o agente pela produção do resultado.

 Como afirma CAPEZ (2011, p. 45), “ninguém pode ser responsabilizado sem que reúna todos os requisitos da culpabilidade. Por exemplo: nos crimes qualificados pelo resultado, o resultado agravador não pode ser atribuído a quem não o tenha causado pelo menos culposamente”.

ZAFFARONI (2011, p. 456), sobre o assunto ressalta:

“A responsabilidade objetiva não ocorre somente quando se pune uma conduta só porque causou um resultado, mas também quando a pena é agravada pela mesma razão. Ambos os casos implicam, pois, violações ao princípio nullum crimen sine culpa.”

Entretanto, HUNGRIA (1955 apud CAPEZ, 2012, p. 271) discorda da concepção de que a rixa qualificada seria um retorno a responsabilidade objetiva do agente, pois cada agente agiu com o animus rixandi, ou seja, incorreram para o resultado da rixa.

“Todos os participantes quiseram a rixa, isto é, o fato que, segundo id quod plerumque accidit, podia ser, como realmente foi, causa de crimes de sangue. Cada um dos corrixantes incorre na pena especialmente majorada porque contribuiu para criar e fomentar a situação de perigo, de que era previsível resultasse o evento morte ou lesão corporal grave. Nenhum deles, portanto, responde pela consequências não imprevisíveis de uma situação ilícita, a que consciente e voluntariamente prestou sua cota de causalidade.”

Outra questão relevante é quando ocorre a participação na rixa com resultado morte ou lesão corporal grave e o autor do homicídio ou da lesão é conhecido. Neste caso, o autor dos dois crimes, responderá por participação na rixa qualificada em concurso material com o homicídio ou com a lesão corporal, segundo BITENCOURT (2013).

HUNGRIA (1955 apud GRECO, 2012, p. 392) também ressalta sobre o assunto “se averiguado quais os contendores que praticaram o homicídio ou lesão grave, ou concorreram diretamente para tais crimes, responderão eles individualmente por estes, em concurso material com o de rixa qualificada”.

Entretanto, alguns autores discordam desse posicionamento, pois estaria punindo o acusado duas vezes pelo mesmo crime, no caso da rixa na forma qualificada e o crime de dolo de dano, caracterizando bis in idem.

 Nesse sentido, GRECO (2012,             p. 392) afirma:

“sendo permitida a responsabilização do agente que praticou o homicídio ou as lesões corporais de natureza grave em concurso (seja ele formal ou material) com o delito de rixa qualificada, estaríamos permitindo a adoção do repudiado bis in idem, ou seja, um mesmo fato – lesão corporal grave ou morte – repercutindo duas vezes sobre o comportamento do agente”.

No caso em que o acusado de participação na rixa é também a vítima de lesão corporal grave é outro fator de grande discussão doutrinária, pois, nesse caso, o agente será acusado, mesmo sendo vítima, pelo crime de participação em rixa na forma qualificada. Como afirma HUNGRIA (1955 apud GRECO, 2012, p. 273):

“para aplicação da pena majorada, não importa que o crime de homicídio ou de lesão corporal seja doloso, culposo ou preterdoloso. Nem é preciso que a vítima seja um dos contendores: se por error ictus, é atingida uma pessoa estranha à rixa (espectador, transeunte, pacificador, interveniente em legítima defesa, policial que procura prender os contendores), a rixa se tem por qualificada”.

Discordando sobre essa posição, NORONHA, afirma:

“Mas é preciso que o envento, ainda que por error ictus, seja oriundo da rixa, seja por ela provocado. Se v. g., em plena rixa, um dos briguentos divisa a certa distância um inimido e, não sopitando seu rancor, desfecha-lhe um tiro, matando-o, não há falar em rixa qualificada, pois a contenda coletiva não doi a causa da morte: o que houve foi um simples homicídio, atribuível única e totalmente a seu autor; e ocorrido no momento da rixa, mas não produzido por ela”

A corrente majoritária incrimina, de forma autônoma, a todos os participantes de forma qualificada, quando ocorrer morte ou lesão corporal grave, pois o crime de rixa se configura em si um perigo abstrato. Por isso, ao ingressar em uma rixa, o indivíduo com o animus rixandi traz para si as consequências que poderão gerar com os seus atos no decorrer do entrevero.


CONCLUSÃO

Sabe-se que a doutrina vigente é pouco abrangente quando se trata de crime de rixa, deixando com isso algumas lacunas, e por esse motivo cabe a doutrina interpretá-la, o que acaba ocasionando diversas divergências entre os doutrinadores. O Código Penal em seu artigo 137 dispõe sobre crime de rixa, dizendo que o mesmo tem como pena detenção de 15 dias a 2 anos ou pagamento de multa.

A rixa é um crime de concurso necessário, para ser considerado como tal, exige-se no mínimo três participantes, não podendo existir grupos definidos, apresentandos-se, assim, como um legítimo tumulto.

Decerto a rixa apresenta uma confusão de agentes e condutas, por isso é definida com crime plurissubjetivo, pois exige o concurso necessário de agentes, no mínimo três.

Outra questão abordada no subtópico é o bem jurídico tutelado que apesar de ser a proteção da incolumidade físico-mental do ser humano, também se apresenta como uma ameaça à ordem pública.

Ela se apresenta de duas formas: simples ou qualificada. A forma simples pude apenas a participação no crime de rixa, enquanto a forma qualificada ocorre quando há morte ou lesão corporal grave, sendo que a morte ou a lesão corporal tem que ocorrer durante a rixa, não pode ser antes ou depois.

O crime de rixa também poderá ocorrer em caso de concurso material ou formal, para a doutrina majoritária ocorre o concurso material. Ela não aceita tentativa, pois se caracteriza como crime instantâneo.

Os principais problemas que foram abordados no “paper” foram o bis in idem e a responsabilidade objetiva do agente quando ocorre a punibilidade na modalidade qualificada, pois para alguns autores o agente é punido duas vezes por um mesmo crime ou é punido de forma qualificada por um crime que não cometeu.

A doutrina majoritária, no entanto, diz que não ocorre bis in idem ou responsabilidade objetiva, pois o agente, com animus rixandi e sendo um crime de perigo, expõe a saúde física e mental dos outros indivíduos, sabendo disso, e querendo participar do crime de rixa, o agente poderá ser criminalizado por participação na rixa, quando está tiver resultado de morte ou lesão corporal grave


REFERÊNCIAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal – parte geral. v. 1. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal – parte especial. v. 2. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

CAPEZ, Fernando. Curso de direito - penal geral. v. 1. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

CAPEZ, Fernando. Curso de direito - penal especial. v. 2. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2010.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal parte especial. v. 2. 9 ed. Niterói: Impetus, 2012.

JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte especial. v. 2. São Paulo: Saraiva, 2005.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal. v. 2. São Paulo: Atlas, 2007.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl; José Henrique Pierangeli. Manual de direito penal brasileiro – parte geral. v. 1. 9 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.



Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelas autoresa. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.