Aspectos relevantes da guarda do menor.

10/12/2021 às 14:44
Leia nesta página:

O artigo trata das hipóteses de exitinção da guarda, suas semelhanças e diferenças com o poder familiar, diferenças de guarda compartilhada e unilateral, jurisprudência atualizada sobre guarda de pais que residem em cidades diferentes entre outros.

 

Em termos simplificados, podemos dizer que guarda, para o direito de família, é o ato de cuidado e proteção praticado, normalmente, pelos pais aos seus filhos. Porém há casos em que essa função de cuidar e proteger será exercida por um terceiro, substituto dos genitores.

 

Aquele que possui a guarda é chamado de guardião, ficando responsável legalmente pelo menor até ele completar a maioridade.

 

Nesse sentido, a guarda possui um prazo de validade, extinguindo-se, de pleno direito, quando o filho completar 18 anos, isso se não existir algum comando legal ou judicial que a estenda até os 21 anos.

 

A propósito, segundo o artigo 1.635 do Código Civil, o poder familiar, igualmente, se extingue com a maioridade civil do filho, ocasião em que passará a responder pelos próprios atos, tanto na esfera cível quanto na criminal. O referido artigo, também, prever outras hipóteses de extinção do poder familiar, veja:

Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar:

I - pela morte dos pais ou do filho;

II - pela emancipação, nos termos do art. 5º, parágrafo único;

III - pela maioridade;

IV - pela adoção;

V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.

Nessa esteira, por analogia, podemos dizer que, uma vez extinta o poder familiar dos pais aos filhos, pela maioridade, fatalmente haverá a extinção da guarda na mesma hipótese. Lembrando que a guarda não destitui o poder familiar dos pais biológicos, mas limita o seu exercício que é transferido, em parte, ao guardião.

 

Diferente é nos casos de tutela, por ser uma forma de inserir o menor em uma família substituta pressupõe, ao contrário da guarda, a prévia destituição ou suspensão do poder familiar dos pais (família natural), como por exemplo no caso de adoção. A tutela é utilizada quando o menor não tem pais conhecidos ou forem falecidos e quando os genitores forem suspensos ou destituídos do poder familiar, antigamente conhecido por pátrio poder.

 

Seguindo no estudo sobre guarda, o artigo 1.583 do Código Civil dispõe que a guarda pode ser unilateral ou compartilhada. Será unilateral quando atribuída a um só dos genitores ou a quem o substitua e compartilhada quando atribuída a ambos os genitores com responsabilização conjunta no cuidado e criação dos filhos.

 

Na guarda unilateral ocorre a custódia física e o poder exclusivo na tomada de decisões quanto às questões da vida diária do filho. Contudo, incumbe ao outro genitor, que não detenha a guarda, o dever de supervisionar/fiscalizar e exigir informações bem como prestação de contas sempre que entender necessário, segundo dispõe o §º5 do artigo 1.583 do Código Civil:

Art. 1.583 - CCB: (...)

§ 5º A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos, e, para possibilitar tal supervisão, qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos. (Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014)

Importante lembrar que a guarda unilateral, não retira do outro genitor o seu poder familiar, das quais incluiu a responsabilidade de prestar alimentos, saúde, educação, visitação nos termos do artigo 229 da Constituição Federal:

 

Art. 229 - CF. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

 

Por sua vez, o artigo 1.634 do Código Civil, dispõe que o poder familiar compete a ambos os pais:

 

Art. 1.634 - CC. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:

I - Dirigir-lhes a criação e a educação;

II - Exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584;

III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV - Conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;

V - Conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;

VI - Nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

IX - Exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

 

Por seu turno, o artigo1.584, § 2º do Código Civil, deixa subentendido que a guarda compartilhada será a regra e a unilateral exceção:

 

Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser:

§ 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.

 

No que diz respeito aos genitores residem em cidades diferentes, a jurisprudência não é pacífica quanto a aplicação da guarda compartilhada nesses casos, isso porque, aqueles que defendem não ser possível, sustentam que a distância de moradia entre os genitores inviabilizaria esse tipo de guarda, a qual pressupõe divisão equânime das responsabilidades relativas aos menores.

 

Porém, recentemente, em decisão do dia 23/06/2021, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), fixou entendimento de que a guarda compartilhada é possível mesmo que pais morem em cidades diferentes.

 

"Não existe qualquer óbice à fixação da guarda compartilhada na hipótese em que os genitores residem em cidades, estados ou, até mesmo, países diferentes, máxime tendo em vista que, com o avanço tecnológico, é plenamente possível que, a distância, os pais compartilhem a responsabilidade sobre a prole, participando ativamente das decisões acerca da vida dos filhos", afirmou a relatora do recurso do pai, ministra Nancy Andrighi.

 

A ministra Nancy Andringhi, lembrou que a guarda compartilhada não se confunde com a guarda alternada, esclarecendo que é na guarda alternada, em que há a fixação de dupla residência, e cada genitor exerce a guarda de forma individual e exclusiva enquanto está com a custódia física do menor e não na compartilhada.

 

"É imperioso concluir que a guarda compartilhada não demanda custódia física conjunta, tampouco tempo de convívio igualitário, sendo certo, ademais, que, dada sua flexibilidade, essa modalidade de guarda comporta as fórmulas mais diversas para sua implementação concreta, notadamente para o regime de convivência ou de visitas, a serem fixadas pelo juiz ou por acordo entre as partes em atenção às circunstâncias fáticas de cada família individualmente considerada", disse a ministra.

 

Portanto, apesar de forte oposição na Jurisprudência, quanto a não ser possível a guarda compartilhada quando os genitores morarem em cidades diferentes, segundo precedentes do STJ, não há qualquer óbice à sua fixação.

 

No tange a guarda unilateral ou compartilhada, inevitável deixar de falar de Alienação Parental entre os genitores ou por um só deles, sobretudo nos casos de intensa litigiosidade, seja no divórcio ou na ação de guarda, pois os efeitos negativos sobre a criança são desastrosos.

 

Regulamentada pela Lei 12.318/2010, a Alienação Parental, tem seu conceito expresso no artigo 2º, na qual diz que:

 

Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

 

No parágrafo único do mesmo artigo, o legislador trouxe um rol exemplificativo das formas de alienação parental:

 

Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:

I - Realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;

II - Dificultar o exercício da autoridade parental;

III - Dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;

IV - Dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;

V - Omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;

VI - Apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;

VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

 

Os efeitos causados pela alienação parental, estão expressos no artigo 3º desta lei, que deixa claro a violação do direito fundamental da criança ou adolescente:

 

Art. 3º A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.

 

Existindo alienação parental, o pedido de providências, pelo genitor prejudicado, pode ser feito por meio de uma ação judicial autônoma ou incidental.

 

Caso a ação seja incidental, o recurso cabível contra decisão proferida em incidente de alienação parental instaurado no curso de ação de reconhecimento e dissolução de união estável é o agravo de instrumento e não a apelação, segundo entendimento da Terceira Turma do STJ em decisão no ano de 2014.

 

Outra questão que merece atenção é a distinção do direito dos genitores quanto a guarda com a obrigação de prestar alimentos, pois os alimentos são direitos da criança e um dever dos genitores.

 

Inclusive a pensão alimentícia deve ser paga, mesmo quando a criança estiver passando férias com o genitor alimentante, visto que por certo existem despesas fixas da criança que não desaparecem só porque o filho foi passar 30 dias fora da residência base de moradia.

 

Despesas esta, referente a cota parte da mensalidade escolar, plano de saúde, internet, cursos de natação, inglês, entre outros conforme bem observado pelo professor Dr. Conrado Paulino da Rosa em seu livro Direito de Família Contemporâneo, 8ª ed., Salvador: Juspodivm, 2021, pag. 553.

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Dito isto, passemos a tratar das hipóteses de guarda avoenga ou a atribuída a terceiros.

 

Nessa seara, vale dizer que, a guarda atribuída a terceiros não significa extinção do poder familiar pelos genitores, salvo decisão judicial nesse sentido, sendo que em regra ocorre a transferência a terceiros na substituição provisória no cuidado e proteção do menor.

 

O artigo 1.584, § 5º esclarece que Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda a pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade nas quais se abre a possibilidade para os avós, desde que provem possuir condições econômicas e emocionais para assumir tamanha responsabilidade.

 

Em caso de transferência da guarda dos genitores para terceiros, terão prioridade os integrantes da família que podem ser os avós e tios e inclusive a um irmão mais velho.

 

Ressalta-se que, salvo decisão judicial em contrário, a transferência da guarda para terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, bem como o dever de pagar pensão alimentícia se solicitado pelo interessado ou a pedido do Ministério Púbico segundo dispõe o artigo 33, § 4º do ECA:

Art. 33...§ 4º Salvo expressa e fundamentada determinação em contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando a medida for aplicada em preparação para adoção, o deferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público.

 

Por fim, vale observar que nas ações de guarda por terceiro, a competência será definida pelo grau de risco a que a criança ou adolescente está sendo submetida segundo previsão do artigo 98 da Lei 8.069/90:

Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:

I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;

II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;

III - em razão de sua conduta.

 

A regra é que, quando não há situação de risco para o menor, a competência para processar e julgar os pedidos de guarda por terceiros é da Vara de Família, e quando existir situação de risco segundo previsto no artigo 98 do ECA, a competência se desloca para a Vara da Infância de Juventude.

 

No caso de ação de guarda avoenga, em que os netos já convivam com seus avós, sendo por eles cuidados, em tese não há situação de risco e, portanto, a competência para processar e julgar o pedido de guarda feito pelos avós será da Vara de Família.

 

Lembrando que segundo o artigo 30 do ECA, a guarda por terceiro só será permitida com autorização judicial:

Art. 30. A colocação em família substituta não admitirá transferência da criança ou adolescente a terceiros ou a entidades governamentais ou não-governamentais, sem autorização judicial.

 

Em se tratando de pedido de guarda de pais aos filhos, a competência será, sempre, da Vara de Família, independente de situação de risco, por se tratar de questões essencialmente de família, envolvendo o poder familiar que é concedido por Lei aos seus genitores.

 

E por falar em poder familiar, vale lembrar que segundo o artigo 1.634, IV do Código Civil a autorização para viagem ao exterior é atributo desse poder e compete a ambos os genitores.

 

Mesmo no caso de guarda unilateral existe a necessidade de autorização do outro genitor que não detenha a guarda, para que o menor possa realizar viagens para o exterior.

 

Nessa esteira, a Resolução 131 do CNJ prever que crianças ou adolescentes que forem viajar acompanhados de apenas um dos pais ou responsáveis devem levar autorização por escrito do outro.

 

Assim, independentemente do tipo de guarda, unilateral ou compartilhada, no caso de viagens para o exterior, será necessário a autorização, expressa e com firma reconhecida, do outro genitor.

 

Havendo recusa nesta autorização para a viagem internacional do filho, será necessário, entrar com uma ação de suprimento de consentimento a fim de que o Juiz autorize a viagem, observado o contraditório e ampla defesa das partes.

Sobre o autor
Ezequiel Pereira da Silva

Advogado especializado em causas de natureza Cível, Família e Previdênciária. Atuando em toda região metropolitana da grande Vitória/ES.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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