Do dano ambiental e da responsabilidade do agente degradador

15/06/2018 às 22:56
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Esclarece os principais aspectos relacionados à proteção do Meio Ambiente, às constantes alterações no nosso ordenamento jurídico realizadas para facilitar a responsabilização do agente degradador.

Proteger o Meio Ambiente tem sido, atualmente, uma preocupação constante no mundo todo. No Brasil não seria diferente. Ocorre que, por termos áreas verdes em grande escala territorial, o controle de fiscalização ambiental acaba sendo afetado por problemas de vários tipos, como logística, pessoal, e claro, legal.

Nossa Carta Maior prevê em seu artigo 225 que todos temos direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado; todavia, prevê, também, neste mesmo diploma legal, que é dever de todos defender e preservar nosso meio ambiente.

No que tange ao conceito de meio ambiente, Édis Milaré (2000, p. 52-53) ensina que:

Numa visão estrita, o meio ambiente nada mais é do que a expressão do patrimônio natural e suas relações com e entre os seres vivos. Tal noção, é evidente despreza tudo aquilo que não seja relacionado com os recursos naturais.

Numa concepção ampla, que vai além dos limites estreitos fixados pela Ecologia tradicional, o meio ambiente abrange toda a natureza original (natural) e artificial, assim como os bens culturais correlatos. Temos aqui, então, um detalhamento do tema, de um lado com o meio ambiente natural, ou física, constituído pelo solo, pela água, pelo ar, pela energia, pela fauna e pela flora, e, do outro, com o meio ambiente artificial (ou humano), enfim, os assentamentos de natureza urbanística e demais construções.

Logo, o legislador buscou criar mecanismos de fiscalização e de aplicação de sanções aos casos em que danos são causados ao nosso sistema ambiental.

Édis Milaré (2001, p. 421) ensina que “dano ambiental é a lesão aos recursos ambientais, com consequente degradação - alteração adversa ou in pejus - do equilíbrio ecológico e da qualidade de vida”.

Já para Maria Isabel de Matos Rocha (2000, p. 130), dano ambiental é a lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio ambiental, levada a cabo por atividades, condutas ou até uso nocivo da propriedade.

É cediço que o dano pode ser compreendido como toda lesão a um bem juridicamente tutelado. Diante dos diversos conceitos supramencionados, entende-se por dano ambiental uma agressão ao meio ambiente, seja por qualquer de seus meios (ar, água, solo etc.). Dano ambiental, assim, corresponde a uma agressão contra o meio ambiente, como valor legalmente tutelado, causado por atividade econômica potencialmente poluidora, por ato comissivo praticado por qualquer pessoa ou por omissão voluntária decorrente de negligência, gerando, assim, uma responsabilidade de reparação pelo dano causado (BESSA, 2000, p.251).

Sendo assim, havendo o dano, torna-se necessária sua reparação, através da reposição (ex: extração de madeira suprida por plantio de um número x de árvores nativas), ou se faz necessária a indenização pelo dano causado, uma vez que a reposição não se faz possível (ex: queima de solo, tornando-se impossível novo plantio, aja vista que o solo perdeu suas fontes necessárias para a reposição).

Como nem todo bem é recuperável, nesse caso, será fixado um valor indenizatório pelo dano causado ao bem. Questão de difícil solução é a quantificação do dano ambiental ou difuso. Isso, contudo, não impede a indenização pelos danos causados ao meio ambiente (SIRVINSKAS, 2008, p. 186).

O primeiro grande passo no que tange à proteção ambiental no Brasil, foi a criação da Lei 6.938/81, dispondo sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, criando órgãos de proteção, como o SISNAMA – Sistema Nacional de Meio Ambiente-, e o CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente, bem como introduziu o regime de responsabilidade civil objetiva pelos danos causados, ou seja, são aplicadas sanções independentemente da existência de culpa ou dolo.

Segundo Elida Séguin (2002, p. 51):

A Lei nº 6.938/1981, que instituiu a Política Nacional para o Meio Ambiente, foi a certidão de nascimento do Direito Ambiental Brasileiro, apesar da Lei de Zoneamento Industrial, de 1980, ter a primazia de primeiro enunciar a questão sob uma ótica holística de Meio Ambiente.

Após a criação da Lei 6.938/81, foi editada, em 1985, a Lei 7.347/85, disciplinando a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e dá outras providências. Ambas as Leis foram recepcionadas pela nossa Carta Magna, em 1988.

Conforme Antunes (2000, p. 42), “além de ser dotada de um capítulo próprio para as questões ambientais, a CF/1988, ao longo de diversos artigos, trata das obrigações da sociedade e do Estado brasileiro para com o meio ambiente”.

Nesse passo, a entrada em vigor da Lei de Crimes Ambientais – Lei 9.605/98-, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, representou importante passo à responsabilização pelo dano ambiental, no viés penal da conduta.

Adiante, após delongada discussão e polêmicas, em 2012, foi editado o novo Código Florestal - Lei nº 12.651/2012-, estabelecendo “normas gerais sobre a proteção da vegetação, áreas de Preservação Permanente e as áreas de Reserva Legal; a exploração florestal, o suprimento de matéria-prima florestal, o controle da origem dos produtos florestais e o controle e prevenção dos incêndios florestais, e prevê instrumentos econômicos e financeiros para o alcance de seus objetivos”.

Quanto ao termo Responsabilidade, este vem da palavra originária responsabilitatis, do latim, que tem a significação de “responsabilizar-se, assegurar, assumir o ato que praticou”. Gera qualidade de ser responsável na condição de responder, empregado no sentido de obrigação, encargo, dever, imposição de alguma coisa (CABRAL, 2003, p. 200).

Constatado o dano, é necessária a sua reparação ou ressarcimento, uma vez identificado o agente causador. A propósito, na visão de Paulo Affonso Leme Machado (1998, p. 267):

[...] a responsabilidade no campo civil é concretizada em cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer e no pagamento de condenação em dinheiro. Em geral, esta responsabilidade manifesta-se na aplicação desse dinheiro em atividade ou obra de prevenção ou de reparação do prejuízo.

Giselda Maria Hironaka (2002, p. 375), diz que a responsabilidade nada mais é do que o dever de indenizar o dano, que surge sempre quando alguém deixa de cumprir um preceito estabelecido num contrato, ou quando deixa de observar o sistema normativo que rege a vida do cidadão.

O doutrinador Luis Paulo Sirvinskas (2003, p. 103), em suas lições, aborda duas teorias acerca da responsabilidade: a responsabilidade objetiva e a responsabilidade subjetiva, “in verbis”:

A teoria subjetiva se consubstancia na necessidade de se comprovar a culpa do agente causador do dano, tendo por fundamento o art. 159 do Código Civil de 1916, que dizia: ‘Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.’. Essa culpa tinha por escopo a violação de um dever jurídico, legal ou contratual. O atual Código Civil mudou consubstancialmente a redação desse dispositivo, consignando que: ‘Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repara-lo’ (art. 927, caput, do CC de 2002). Assim, comete ato ilícito aquele ‘que, por ação ou omissão voluntário, negligência ou imprudência, violar direito ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral’ (art. 186 do CC de 2002). Comete ainda ato ilícito ‘o titular de um direito que, ao exerce-lo, excede manifestadamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes’ (art. 187 do CC de 2002). Vê-se, por esses dispositivos, que os danos morais foram definitivamente implantados, podendo ser pleiteados em juízo pela vítima.

Ainda no que tange à teoria objetiva, prossegue o doutrinador Luís Paulo Sirvinskas (2003, p. 103-104):

Ao contrário da teoria subjetiva, a objetiva não exige a demonstração da culpa, ou seja, o agente responderá pelos danos causados independentemente da culpa. Basta a demonstração da existência do fato ou do ato _ o dano e o nexo causal. Essa responsabilidade consiste no ressarcimento dos danos causados pelo agente mesmo que ele não tenha agido com culpa. Indeniza-se pelo ato ilícito. Contudo, o agente tem o direito regressivo contra o responsável pelo dano à semelhança de que dispõe o art. 37, § 6º, da CF.

Assim, constatado o dano ambiental, o agente causador irá responder, de forma independente, nas esferas civil, penal e administrativa, como forma de melhor proteger o meio ambiente.

Neste sentido, o art. 225, § 3º, da CF dispõe que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Passando ao exame da responsabilidade civil pelo dano ambiental, não se analisa mais a vontade do agente, mas somente a relação entre o dano e a causalidade (nexo causal). Adotou-se, desta forma, a teoria objetiva, responsabilizando o agente causador do dano independentemente de ter agido com culpa (SIRVINSKAS, 2008, p. 189).

Agregada ao fato do Brasil ter adotado a teoria da responsabilidade objetiva, agregou, também, a solidariedade passiva na reparação do dano, expresso no artigo 942, do Código Civil, que diz que os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.

Segundo Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 727/728):

A lei impõe, entretanto, a certas pessoas, em determinadas situações, a reparação de um dano cometido sem culpa. Quando isto acontece, diz-se que a responsabilidade é legal ou objetiva, porque prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Esta teoria, dita objetiva ou do risco, tem como postulado que todo dano é indenizável e deve ser reparado por quem a ele se liga por um nexo de causalidade, independentemente de culpa. Nos casos de responsabilidade objetiva, não se exige prova de culpa do agente para que este seja obrigado a reparar o dano. Ela é de todo prescindível (responsabilidade independente de culpa).

Ora, então, ao adotar o sistema da responsabilidade objetiva, a disciplina legal e jurídica mostra-se evidentemente preocupada com a mais extensa reparação dos danos causados ao meio ambiente, dentro daquela que ficou conhecida como sendo a “teoria do risco”. Nessa linha, Gonçalves ainda assevera, na mesma obra antes citada:

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Uma das teorias que procuram justificar a responsabilidade objetiva é a teoria do risco, segundo a qual toda pessoa que exerce alguma atividade cria um risco de dano para terceiros e deve ser obrigada a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. A responsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a ideia de risco, ora encarada como “risco-proveito”, que se funda no princípio de que é reparável o dano causado a outrem em consequência de uma atividade realizada em benefício do responsável (ubi emolumentum, ibi onus, isto é, quem aufere os cômodos (lucros) deve suportar os incômodos ou riscos); ora mais genericamente como “risco criado”, a que se subordina todo aquele que, sem indagação de culpa, expuser alguém a suportá-lo, em razão de uma atividade perigosa; ora, ainda, com o “risco profissional”, decorrente da atividade ou profissão do lesado, como ocorre nos acidentes de trabalho.

Diante do exposto, podemos concluir que as recentes mudanças no nosso ordenamento jurídico trouxe grandes avanços na defesa do meio ambiente, facilitando, assim, a tarefa do julgador, em benefício dos interesses maiores da sociedade, para a proteção ambiental conforme a Constituição, ao fixar a responsabilização dos causadores do dano, porque sem a necessidade de apreciar ou perquirir a culpa, o que, do contrário, na temática ambiental, poderia surgir muitas vezes como real entrave à proteção desse bem da vida tutelado, traz uma segurança maior ao sistema de proteção ambiental e demonstra uma maior atenção ao enunciado do art. 225, da Constituição Federal de 1988.


REFERÊNCIAS

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BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente. Planalto, Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. 04 junho. 2018.

BRASIL. Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985. Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico e turístico. Planalto, Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. 04 junho. 2018.

CABRAL, Gutemberg José C. Marques. O Direito do mangue. João Pessoa: Sal da Terra, 2003.

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HIRONAKA, Giselda Maria Fernanda Novaes. (Coord.). Direito e responsabilidade. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 1998.

MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: Doutrina, Prática, Jurisprudência e Glossário3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

ROCHA, Maria Isabel de Matos. Reparação de danos ambientais. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n.19, 2000.

SÉGUIN, Elida. Direito ambiental: nossa casa planetária. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental, São Paulo: Saraiva, 2003.

SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental, São Paulo, Editora Saraiva, 2008.

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Sobre o autor
Renan Machado dos Santos

Advogado pela OAB/RS, especialista em Ciências Criminais, Advocacia Coorporativa e em Direito Tributário.

Informações sobre o texto

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