Fragmentos do estudo dos contratos: comentários didáticos às modalidades contratuais de compra e venda e doação

26/09/2016 às 12:00
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O presente, assentado no que preceitua a melhor doutrina, versa sobre as espécies contratuais citadas. Sem esgotar o tema pretende-se oferecer ao leitor exposição objetiva do conjunto de regras e princípios jurídicos que regem a ambos.

RESUMO

Não é preciso ser um civilista para intuir que diariamente celebra-se número imensurável de contratos. Trata-se, por óbvio, da espécie de negócio jurídico mais difundida e socialmente aceita. Empregam-se contratos para quase todos os fins: de relações econômico-financeiras complexas a triviais permissões para utilização de aplicativos na internet. Fácil deduzir, portanto, a importância do estudo pormenorizado de tal figura jurídica. O presente, assentado no que preceitua a melhor doutrina, versa sobre as espécies contratuais de “compra e venda” e “doação”. Sem esgotar o tema pretende-se oferecer ao leitor exposição objetiva do conjunto de regras e princípios jurídicos que regem a ambos.

Palavras-chave: Direito civil; contratos; compra e venda; doação.

ABSTRACT

No need to be a civilian to intuit that every day is celebrated immeasurable number of contracts. This is, obviously, the kind of legal business more widespread and socially accepted. They are used contracts for almost all purposes: economic-financial complex relationships trivial permissions to use applications on the Internet. Easy to deduce, therefore, the importance of the detailed study of such legal figure. This sitting in which state the best doctrine deals with the contractual terms of "buying and selling" and "donation". Without exhausting the subject is intended to provide the objective exposure reader set of legal rules and principles governing both.

Keywords: Civil law; contracts; buying and selling; donation.

1. INTRODUÇÃO

O ponto de partida de toda análise sobre espécies contratuais deve ser a necessária explicação sobre o que são, por definição, os contratos. Conceituar, como acertadamente prelecionam alguns autores, não é tarefa fácil. Ao fazê-lo corre-se o risco de explicitar preferência por uma ou outra corrente doutrinária.  Para efeito deste breve estudo, contudo, tomaremos como referência pensamento de Martinho Garcez, perpetuado na versão eletrônica do Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Para este, contrato pode ser entendido como “acordo de vontades entre as partes, com o fim de adquirir, resguardar, transferir, modificar, conservar ou extinguir direitos”.

Nesse sentido também asseveram Gagliano e Pamplona Filho:                                             

[...] entendemos que o contrato é um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades. Não se poderá falar em contrato, de fato, sem que se tenha por sua pedra de toque a manifestação de vontade. Sem “querer humano”, pois, não há negócio jurídico. E, não havendo negócio, não há contrato. Ocorre que toda essa manifestação de vontade deverá fazer-se acompanhar pela necessária responsabilidade na atuação do contratante, derivada do respeito a normas superiores de convivência, com assento na própria Constituição da República. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2014, p.38).

 Destarte, esta breve dissertação sobre o estudo de dois tipos contratuais historicamente bem estabelecidos é tão somente exercício introdutório de direito positivo. Embasado em pesquisa bibliográfica, tenciona-se apresentar a fundamentação legal dos contratos de “compra e venda” e “doação”. Pretende-se, além disso, elencar suas principais características, bem como prazos, deveres e obrigações das partes contratantes, e, por fim, a forma de extinção dos mesmos.

Como dito anteriormente, longe da aspiração de esgotar o assunto, intenta-se abordar a análise das citadas espécies contratuais sob a perspectiva de quatro doutrinadores contemporâneos, relacionando interpretações doutrinárias com o previsto na lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. (Código Civil Brasileiro).  

2. ASPECTOS GERAIS

Com fulcro no que prelecionam Gagliano e Pamplona Filho (2014, p.31) é possível dizer que “o contrato está para o civilista, assim como o crime está para o penalista”. Não se trata, obviamente, de simples retórica. Na verdade tem-se no comentário o reconhecimento ao mérito histórico da citada figura jurídica; haja vista ser impossível conceber no presente uma sociedade humana em que as relações contratuais não se estabeleçam, mesmo que implícitas.

Sob esta perspectiva, no estudo dos contratos destacam-se as espécies contratuais de “compra e venda” e “doação”. Ambas compõem, como se sabe, parte dos chamados contratos nominados e típicos. A terminologia, como ensina magistralmente Rafael de Menezes, expressa tão somente o fato de terem nome e previsão na lei.

Nas palavras precisas do nobre magistrado os mencionados “fazem parte dos principais contratos dentre os vinte previstos no nosso Código, entre os arts. 481 e 853” (MENEZES, 2012).  

3. COMPRA E VENDA

3.1. Conceito          

Por se tratar de espécie contratual bem estabelecida, sendo mesmo parte da vida do homem moderno, conceituar o contrato de compra e venda é tarefa relativamente simples. Gonçalves (2012, p.161), por exemplo, preleciona ser “contrato bilateral”. O autor lembra que o art. 481, do Código Civil brasileiro, é taxativo ao decretar que “pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro”.

É, admita-se, acepção didática “de per si”. Ajuda, obviamente, a estabelecer noção fundamental sobre o assunto.

Importante, no entanto, não perder de vista o que assevera Tartuce. Para este “trata-se de um contrato translativo, mas que por si só não gera a transmissão da propriedade”. Explica o eminente autor, citando Diniz (2005):

Como é notório, regra geral, a propriedade móvel se transfere pela tradição (entrega da coisa) enquanto a propriedade imóvel transfere-se pelo registro do contrato no Cartório de Registro Imobiliário (CRI). Dessa forma, o contrato de compra e venda traz somente o compromisso do vendedor em transmitir a propriedade, denotando efeitos obrigacionais (art. 482 do CC). Em outras palavras, o contrato é translativo no sentido de trazer como conteúdo a referida transmissão, que se perfaz pela tradição nos casos que envolvem bens móveis ou pelo registro, nas hipóteses de bens imóveis (TARTUCE, 2014, p. 209).

Pensamento semelhante encontra-se explícito na obra de Gagliano e Pamplona Filho. Para os juristas baianos “no sistema jurídico brasileiro, o contrato de compra e venda produz apenas efeitos jurídicos obrigacionais, não operando, por si só, a transferência da propriedade, senão a simples obrigação de fazê-lo”.

Com isso queremos dizer que, celebrado o contrato de compra e venda, as partes ainda não podem considerar-se donas do preço (vendedor) ou da coisa (comprador), senão até que se opere a tradição da coisa vendida, embora já sejam titulares do direito de exigir a sua prestação. Ou seja, a transferência de propriedade, no direito positivo brasileiro, resulta da constituição do título (contrato) e de uma posterior solenidade (modo — tradição do bem móvel/registro do bem imóvel). Por exemplo: se Caio celebrou contrato de compra e venda com Silvio (vendedor), enquanto não se operar o registro do título constitutivo no cartório de imóveis, o primeiro não poderá ser reputado dono da coisa. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012, p.29).

Por fim, necessário destacar também que, para todos os efeitos, a coisa transacionada deve ser corpórea. De outra forma, como bem observa Tartuce, não seria possível se falar em compra e venda, tão somente em cessão de direitos.

3.2. Principais características

Não sem o devido fundamento Gonçalves (2012, p.164), afirma que a compra e venda é o mais importante dos contratos e a origem de quase todo o direito das obrigações, bem como de quase todo o direito comercial. A realidade, como se sabe, atesta que tal espécie é a de maior incidência na prática, pois está incorporada ao dia a dia das pessoas.

Note-se, no entanto, a necessidade de observação a todos os requisitos dos contratos em geral. Importa considerar ser esta (compra e venda) “espécie” daquele “gênero” (contratos) e como tal sujeita, portanto, aos princípios que o norteiam.

Ensinam Gagliano e Pamplona Filho, com base na doutrina majoritária, tratar-se em síntese “de um negócio jurídico bilateral e sinalagmático, em regra consensual, comutativo ou aleatório, translativo de propriedade, de execução instantânea ou diferida, entre outras características”, (2012, p.30).

No caso da primeira, pode-se dizer sinalagmático ou bilateral perfeito considerando-se que gera obrigações recíprocas tanto para o comprador (a de pagar o preço em dinheiro), como para o vendedor (a de transferir o domínio de certa coisa).

A segunda fundamenta-se no fato de que, em oposição aos contratos reais, estabelece-se em regra de forma consensual. É cediço, como explica Gonçalves (p.164), que o contrato de compra e venda se aperfeiçoa com o acordo de vontades, independentemente da entrega da coisa, consoante dispõe o art. 482 do Código Civil.

A onerosidade, terceira característica, apoia-se na constatação de que ambos os contratantes obtêm proveito em troca de um sacrifício. Para uma parte entrega do bem negociado e recebimento do pagamento. Para outra, pagamento do preço acordado e consequente recebimento da coisa desejada.

Há de ser falar, deste modo, em interesse e utilidade recíproca, podendo por “oneroso” ser comutativo (se as prestações das partes forem certas) ou aleatório (se não houver certeza quanto à ocorrência de uma das prestações).

3.3. Elementos da compra e venda

            Não se pode negar que o legislador, ao formalizar a previsão normativa do contrato de compra e venda, cuidou para simplificá-lo. Essa conclusão deriva da simples interpretação do art. 482, do Código Civil, conforme alude Gonçalves.

Por se tratar da espécie de contrato mais utilizada no comércio jurídico e na convivência social, a lei procura facilitar a sua celebração, simplificando-a. O art. 482 do Código Civil, retrotranscrito, nessa ordem, a considera obrigatória e perfeita, desde que as partes acordem no objeto e no preço. (GONÇALVES, 2012, p.165).

Pautando-se no que preceitua a melhor doutrina é possível afirmar, portanto, que o contrato de compra e venda exige como elementos essenciais a coisa, o preço e o consentimento (res, pretium et consensus).

3.4. Efeitos da compra e venda

Antes de adentrar na seara dos efeitos advindos do contrato de compra e venda compete oportunamente explicar que a doutrina não é pacífica ao nominar aspectos de estudo da espécie contratual hora em tela. Apesar das distinções e conceitos próprios, de modo geral, tem-se pontos que merecem maior destaque, como, a exemplo, a distinção dada por Gonçalves (2012) ao presente capítulo.

Nesse sentido divide o estudo dos efeitos em principais e secundários (ou subsidiários). Concernente ao primeiro aduz o autor:

Os principais efeitos da compra e venda são: a) gerar obrigações recíprocas para os contratantes: para o vendedor, a de transferir o domínio de certa coisa, e para o comprador, a de pagar-lhe certo preço em dinheiro (CC, art. 481); e b) acarretar a responsabilidade do vendedor pelos vícios redibitórios e pela evicção. (2012, p.170).  

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Consoante ao afirmado anteriormente, têm-se efeitos secundários a título de consequências que a compra acarreta. Gonçalves classifica a estes em: “responsabilidade pelos riscos”, “repartição das despesas” e “direito de reter a coisa ou o preço”.

3.5. Prazos contratuais

Gagliano e Pamplona Filho prelecionam que o contrato de compra e venda é “instantâneo, pelo fato de seus efeitos serem produzidos de uma só vez” (2012, p.33).

Os autores baianos explicam que essa distinção comporta outras duas, podendo a citada espécie contratual ser de execução imediata — quando se consuma no momento da celebração, com a entrega do bem móvel ou registro do contrato de transferência de bem imóvel —, ou diferida — quando as partes fixam prazo para a sua exigibilidade ou cumprimento.

Em face do exposto reitera Menezes assinalando que “a compra e venda dura segundos, minutos, e mesmo se o pagamento é a prazo, continua sendo instantânea, porém de execução diferida”.

3.6. Extinção

A analogia entre contratos e seres vivos é uma maneira apropriada de tratar do tema em pauta. Assim como os demais negócios jurídicos, contratos são semelhantes a entes viventes: têm um ciclo vital que se extingue depois de cumprir determinado papel no campo da existência.

No caso específico dos contratos, estes nascem do acordo de vontades e chegam ao fim depois de produzir os efeitos que lhe são próprios.

Humberto Theodoro Júnior (2001), citado por Gonçalves (2012), assevera a esse respeito que:

“[...] ao contrário dos direitos reais, que tendem à perpetuidade, os direitos obrigacionais gerados pelo contrato caracterizam-se pela temporalidade. Não há contrato eterno. O vínculo contratual é, por natureza, passageiro e deve desaparecer, naturalmente, tão logo o devedor cumpra a prestação prometida ao credor”. (THEODORO JR, 2001, p.100)

Em outras palavras é pela execução que ocorre, em regra, a extinção. Esta pode ser instantânea, diferida ou continuada. Aduz Gonçalves que “o cumprimento da prestação libera o devedor e satisfaz o credor. Este é o meio normal de extinção do contrato. Comprova-se o pagamento pela quitação fornecida pelo credor” (p.135).

Importa, no entanto, atentar para o disposto no art. 320, do Código Civil, como salienta o próprio autor. O texto normativo estabelece que:

Art. 320. A quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular, designará o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor, ou do seu representante.

Parágrafo único. Ainda sem os requisitos estabelecidos neste artigo valerá a quitação, se de seus termos ou das circunstâncias resultar haver sido paga a dívida.

 Por fim, cabe reproduzir também no presente a lição do civilista italiano Massimo Bianca, citado por Nader (2016), para quem “as duas fundamentais figuras de extinção do contrato são a anulação e a resolução” (BIANCA, 2001, p. 731). Na interpretação correta do nobre jurisconsulto brasileiro “o natural na vida dos contratos é o cumprimento das obrigações, por ambas as partes, até que os resultados finais previstos sejam alcançados”.

4. DOAÇÃO

4.1. Conceito          

Considerada por certa corrente doutrinária a prática mais antiga de transmissão da propriedade, a doação pode ser interpretada como exercício máximo do direito real do proprietário sobre a coisa, já que este abre mão do que é seu para transferi-la de forma gratuita ao beneficiado.

No Código Civil brasileiro sua previsão encontra-se instituída no art. 538. Este a define como o “contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.

Para Tartuce (2014) torna-se válido reforçar que “a doação é um contrato que gera inúmeras consequências jurídicas”, estando tipificado, como bem lembra o autor, não somente no citado artigo, mas em todos deste ao art. 564 do Código Civil.

Por esse negócio jurídico, o doador transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o donatário, sem a presença de qualquer remuneração. Pelo que consta no art. 538 do CC, trata-se de ato de mera liberalidade, sendo um contrato benévolo, unilateral e gratuito. Sendo negócio jurídico benévolo ou benéfico, somente se admite a interpretação restritiva, nunca a interpretação declarativa ou extensiva (art. 114 do CC). (TARTUCE, 2014, p.257).

 Menezes (2012), ao abordar a temática, lembra ainda que a doação constitui contrato tão antigo quanto a troca, sendo ambos mais antigos do que a compra e venda.

4.2. Principais características

            Como explicado em momento anterior, doação, assim como compra e venda, constitui contrato típico e nominado. Sua principal característica, como assevera a melhor doutrina, é a unilateralidade, ou seja, a condição de que só uma das partes (doador) se obriga para com a outra (beneficiário).

             Consoante a isto, Gonçalves certifica que do conceito legal é possível também ressaltar os traços característicos da espécie contratual em tela. Nas palavras do autor é possível relacioná-los da seguinte forma: “a) a natureza contratual; b) o animus donandi, ou seja, a intenção de fazer uma liberalidade; c) a transferência de bens para o patrimônio do donatário; e d) a aceitação deste” (2012, p.208).

4.3. Modalidades

A doutrina diverge em pequenos aspectos a respeito da classificação das diversas modalidades de doações. Em regra, no entanto, destacam-se algumas espécies. Gonçalves (2012) as identifica da seguinte forma:

a) Pura e simples ou típica (vera et absoluta) — Quando o doador não impõe nenhuma restrição ou encargo ao beneficiário, nem subordina a sua eficácia a qualquer condição. [...]. b) Onerosa, modal, com encargo ou gravada (donatione sub modo) — Aquela em que o doador impõe ao donatário uma incumbência ou dever. [...]. c) Remuneratória — É a feita em retribuição a serviços prestados, cujo pagamento não pode ser exigido pelo donatário. É o caso, por exemplo, do cliente que paga serviços prestados por seu médico, mas quando a ação de cobrança já estava prescrita; e, ainda, do que faz uma doação a quem lhe salvou a vida ou lhe deu apoio em momento de dificuldade [...]. d) Mista — É aquela em que se procura beneficiar por meio de um contrato de caráter oneroso. Decorre da inserção de liberalidade em alguma modalidade diversa de contrato (p.ex., venda a preço vil ou irrisório (venda amistosa), que é venda na aparência, e doação na realidade) [...]. e) Em contemplação do merecimento do donatário (contemplativa ou meritória) — Configura-se quando o doador menciona, expressamente, o motivo da liberalidade, dizendo, por exemplo, que a faz porque o donatário tem determinada virtude [...]. f) Feita ao nascituro — Dispõe o art. 542 do Código Civil que tal espécie de doação “valerá, sendo aceita pelo seu representante legal” [...]. g) Em forma de subvenção periódica — Trata-se de uma pensão, como favor pessoal ao donatário, cujo pagamento termina com a morte do doador, não se transferindo a obrigação a seus herdeiros, salvo se o contrário houver, ele próprio, estipulado [...]. h) Em contemplação de casamento futuro (donatio propter nuptias) — Constitui liberalidade realizada em consideração às núpcias próximas do donatário com certa e determinada pessoa [...]. i) Entre cônjuges — O art. 544 do novo Código Civil estatui que a doação “de um cônjuge a outro importa adiantamento do que lhes cabe por herança” [...]. j) Em comum a mais de uma pessoa (conjuntiva) — Quando a doação é feita em comum a várias pessoas, entende-se distribuída entre os beneficiados, “por igual”. Estabelece-se, assim, uma obrigação divisível [...]. k) De ascendentes a descendentes — Proclama o art. 544 do Código Civil que a doação de ascendentes a descendentes “importa adiantamento do que lhes cabe por herança” [...]. l) Inoficiosa — É a que excede o limite que o doador, “no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento”. O art. 549 do Código Civil declara “nula” somente a parte que exceder tal limite, e não toda a doação [...]. m) Com cláusula de retorno ou reversão — Permite o art. 547 do Código Civil que o doador estipule o retorno, “ao seu patrimônio”, dos bens doados, “se sobreviver ao donatário” [...]. n) Manual — É a doação verbal de “bens móveis de pequeno valor”. Será válida “se lhe seguir incontinenti a tradição” (CC art. 541, parágrafo único) [...]. o) Feita a entidade futura — Dispõe o art. 554 do Código Civil que a doação a “entidade futura”, portanto inexistente, “caducará se, em dois anos, esta não estiver constituída regularmente”. (GONÇALVES, 2012, p.213-219)

4.4. Da extinção da doação

Se atos de liberalidade caracterizam-se pela abnegação, nada mais natural que o codificador ao instituir o Código Civil cuidasse para protegê-los, permitindo que em determinadas situações a doação seja revogada (como, por exemplo, em casos de ingratidão).

O Art. 555, CC, exemplifica bem tal disposição ao determinar que “a doação pode ser revogada por ingratidão do donatário, ou por inexecução do encargo”.

Gagliano e Pamplona Filho ensinam que, nesse contexto, devem ser observados dois enfoques distintos. O primeiro se refere ao que os autores baianos chamam de modalidade natural, com a sua regular execução. Segundo este pensamento, o negócio jurídico se exaure no momento em que o doador cumpre a prestação a que se obrigou.

Uma especial forma de extinção do contrato de doação, entretanto, opera-se por meio da denominada revogação do doador [...]. Trata-se, pois, a revogação, do exercício de um direito potestativo, por meio do qual o doador, verificando a ocorrência de alguma das situações previstas expressamente em lei, manifesta vontade contrária à liberalidade conferida, tornando sem efeito o contrato celebrado, e despojando, consequentemente, o donatário do bem doado. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012, p. 126)

Cumpre ainda mencionar, como bem lembram os autores, que o Código Civil brasileiro admite a revogação da doação por duas ordens de motivos aludidas no art. 555, do citado diploma legal: por inexecução do encargo, na doação modal; e, como visto anteriormente, por ingratidão do donatário.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, ao esboçar considerações sobre os contratos de “compra e venda” e “doação”, o objetivo do artigo hora exposto foi convidar o leitor à reflexão sobre a simplicidade e importância de ambas as espécies contratuais.

Com efeito, ao descrever passagens da doutrina, bem como do diploma legal vigente, tencionou-se retratar, de forma didática, elementos que ajudem na compreensão dos diversos mecanismos dos institutos aludidos.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de JANEIRO de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em 18 set. 2016.

BIANCA, C. Massimo, Diritto Civile, 3, Il Contratto, seconda edizione, Milano, Giuffrè editore, 2001, p. 731.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil, volume 4: contratos, tomo I: teoria geral. 10 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: Contratos em espécie. 5 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012.

HOUAISS, A. Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva. Versão 3.0. 1 [CD-ROM]. 2009.

MENEZES, Rafael. Direito Civil - Parte especial dos contratos das várias espécies de contratos. Disponível em: < http://rafaeldemenezes.adv.br/assunto/Contratos/6/aula/1>. Acesso em 18 set. 2016.

NADER, Paulo. Curso de Direito Civil: Contratos. Vol. 3. 8 ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2016.

TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. Vol. 3. 9 ed. rev., atual. e ampl. Grupo Gen-Editora Método Ltda., 2014.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. O contrato e seus princípios. Aide, 2001.


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Sobre o autor
Wellington Cacemiro

Advogado, jornalista e pesquisador jurídico com publicações em revistas nacionais e internacionais. Graduado em Direito pela faculdade Multivix Cachoeiro Ensino, Pesquisa e Extensão Ltda., pós-graduado em Direito Processual Penal pelo Instituto Damásio de Direito da Faculdade Ibmec-SP, pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela mesma instituição e pós-graduando em Direito Penal pelo Instituto Damásio de Direito da Faculdade Ibmec-SP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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