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Tributação e Justiça Social: uma perspectiva filosófica

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10/03/2013 às 16:59
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4.Conclusão

O conceito de justiça na sua vertente distributiva, na qual é função do Estado em dar a cada um o que é seu na medida de sua proporcionalidade e necessidade, traz na esteira a justiça social como equilíbrio entre o econômico e o social, visando a compensação das desigualdades. Corresponde à justiça distributiva, aplicada aos desiguais.

Não há justiça social sem justiça fiscal. O tributo deve ser ético. O Estado deve garantir os valores constitucionais e em essência o princípio da dignidade da pessoa humana. Para que a vinculação entre a imputação tributária e a justiça social sejam efetivas existe a necessidade de uma regulação na distribuição de bens dentro da estrutura fundamental da sociedade, a oferta de serviços devem ser assegurados pela equidade a todos os cidadãos. O tributo ideal deve ser justo no sentido de garantir uma distribuição eqüitativa do ônus tributário pelos indivíduos.

O desequilíbrio na distribuição da carga tributária vem da neutralidade da tributação adotada e que afasta a justiça tributária. O peso da arrecadação acaba por ser suportada pelos mais pobres e assalariados, vítimas de uma tributação indireta absurda. A humanização da imputação tributária através do respeito aos valores maiores (constitucionais e ideológicos) ocorrerá pela efetividade de vários aspectos que vão desde uma atuação comprometida do poder até uma atuação crítica da própria sociedade, que deve se postar  igilante quanto aos abusos e desmandos praticados.

Assim, não há como analisar a imputação tributária afastada da Justiça social. O paradoxo criado entre o campo da arrecadação e da aplicação dos recursos públicos coloca poucos favorecidos em detrimento de grande parte da sociedade. A tributação somente faz sentido se subordinada a princípios de justiça, questão esquecida pelos governos diante do sistema econômico. Neste diapasão justiça fiscal é antes de mais nada questão de vontade política.


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Notas

[1] "As leis promulgadas sobre qualquer coisa visam à utilidade comum a todos ou à utilidade de quem se destaca pela virtude ou por outra forma; desse modo, com uma só expressão definimos como justas as coisas que propiciam ou mantêm a felicidade ou parte dela na comunidade política" In ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco, V, 1 - 1129 b4.

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[2] “A virtude é um estado médio no sentido de que almeja atingir o meio, (…) o excesso e a deficiência são marca do vício, e a observância do meio é a marca da virtude.” (In ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco, 1106b)

[3] O termo “geral” aplicado a este tipo de justiça refere-se à sua abrangência: todos os atos, independentemente da sua natureza, na medida em que são devidos à comunidade para que esta realize o seu bem, constituem deveres de justiça. (BARZOTTO, 2003, p. 18)

[4] “que se exerce nas distribuições de honras, dinheiro e de tudo aquilo que pode ser repartido entre os membros do regime (politeia)” (BARZOTTO, 2003,p. 19).

[5] É “aquela que exerce uma função corretiva nas relações entre indivíduos”. Ela visa ao reestabelecimento do equilíbrio nas relações privadas, voluntárias (contratos) e involuntárias (ilícitos civis e penais). (BARZOTTO, 2003 p. 19).

[6] “O que sucede com o texto de Aristóteles, como aliás o que virá a ocorrer com Santo Tomás, é, para nós, deveras interessante: é que não sendo nem um nem outro juristas, tendo vivido aliás ambos em períodos de não-Direito, isto é, sendo o primeiro anterior à autonomização epistemológica do saber jurídico, e tendo vivido o segundo em época em que tal especificidade se havia de algum modo perdido, há séculos já, revelam-se um e outro dos principais responsáveis pela teoria do ius redigere in artem, sendo um e outro pais do chamado Isolierung jurídico. Ou seja: se deve ter saído o Direito do caldo de cultura amalgamado de várias racionalidades e várias normatividades – eles contribuíram para que claramente se recortasse das diferentes ordens sociais normativas, da política e de outras formas de comando e organização”. CUNHA, Paulo Ferreira da. O Comentário de Tomás de Aquino ao Livro V da Ética a Nicómaco de Aristóteles. Disponível em: < http://www.hottopos.com/videtur14/paulo2.htm > Acesso em: 15.02.2012.

[7] “A obra de John Rawls, intitulada Uma teoria da justiça, tem como objetivo central a discussão da justiça como eqüidade. Ao trazer à tona essa questão, e estabelecer uma nova forma de ver e pensar a justiça, o autor pretende, na verdade, oferecer uma teoria da justiça que constitua uma alternativa viável às doutrinas utilitarista clássica e intuicionista da justiça, às quais a sua nova teoria pretende se contrapor. Na verdade, o autor "enfoca a justiça como base de um novo contrato social, na esteira de Kant e Rousseau.” (NOVAIS, 2004, p. 203).

[8] “Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.”

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Sobre o autor
Marcelo Gollo Ribeiro

Professor Universitário. Procurador do Município de Ribeirão Pires (SP). Pós graduado em Direito Tributário pela PUC-SP. Pós graduado em Filosofia pela Universidade Gama Filho-RJ. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Mackenzie-SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Marcelo Gollo. Tributação e Justiça Social: uma perspectiva filosófica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3539, 10 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23866. Acesso em: 17 mai. 2024.

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