A Humanidade e um Direito Robótico

06/05/2024 às 12:29
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A substituição das pessoas por robôs, ganha na maioria das vezes uma projeção lúdica em nossas mentes, com a futurística ideia que esbarraremos nas ruas com máquinas transitando nas calçadas ou servindo um café em nossas casas, porém a presença deles em nossas rotinas já ocorre de forma intensa, e em boa parte das vezes imperceptível, pela intangibilidade do seu uso.

A elevada presença deles em nossas rotinas exige de forma acelerada uma regulamentação transversal, como toda tecnologia. O fato é que a ligação do homem com robôs, sempre foi, uma ligação cercada de amor, admiração, e medo, e que é claro, já não vem de hoje. Certamente, os autômatos podem ser considerados os primeiros robôs, ainda que com infinitas limitações.

Ao longo da nossas história, diversos são os autômatos que surgem inicialmente como brinquedos, o Instituto Smithsoniano possui em seu acervo um Monge-relógio com em torno de 380mm de altura que é possivelmente datado de antes de 1560. O monge é movido por uma mola e se mexe por um caminho em formato de quadrado, batendo em seu peito com o braço direito, enquanto levanta e se desce uma pequena cruz e um rosário na sua mão esquerda, mexendo sua cabeça, rolando seus olhos e falando rituais. De tempos em tempos, ele leva a cruz ao seus lábios e a beija.

Uma nova percepção em relação a autômatos foi tomada por Descartes quando ele sugeriu que o corpo de animais não seriam nada além de máquinas complexas, os ossos, músculos e órgãos poderiam ser substituídos por engrenagens, pistões e cames. Assim, a mecânica se tornou padrão de comparação em relação a natureza e ao organismo vivo, um estudo bastante polêmico para época, tal qual a polêmica que os novos usos de robôs vem enfrentando na sua ocupação de espaço na sociedade moderna.

Essa paixão por autômatos, também é relatada no cinema, no filme “Hugo”, de 2011, o personagem principal, Hugo Cabret, deve consertar um autômato em forma de homem, o qual ele e seu pai já tentaram consertar antes, acreditando que ele contém uma mensagem secreta deixada por seu pai antes de sua morte. Perto do final do filme, é revelado que o mesmo autômato foi criado por Georges Méliès, que doou o mecanismo para o museu onde o pai de Hugo trabalhava, depois que o próprio Méliès não conseguiu o consertar. Este filme é baseado no livro de 2007 intitulado “A invenção de Hugo Cabret”, uma bela obra que ilustra a paixão pelo homem e essas maquinas fantásticas.

Em alguns períodos da nossa história, os autômatos eram queimados, como se fossem representantes do mal.

Recentemente na cidade de São Francisco decidiu acabar com a proliferação de robôs de entrega de mercadorias de várias empresas que estavam timidamente começando a aparecer em suas calçadas, o que eu imagino seja uma parada(vista como retrocesso0 para uma melhor regulamentação), e após consideráveis limitações, cada empresa só poderá contar com um máximo de três robôs(período de teste para ajuste da regulamentação e da compreensão do impacto social), haverá apenas um máximo de nove em toda a cidade, eles só poderão operar em determinadas áreas industriais com pouco tráfego de pedestres (o que praticamente elimina sua utilidade para entrega domiciliar), eles terão que ir a um máximo de cinco quilômetros por hora (atingiram um máximo de 6,5) , e deve ser compulsoriamente supervisionado por uma pessoa, ou seja o uso desse modernos autômatos nas calçadas de São Francisco, sofre limitação pelo regramento municipal, agora imagine eles andando em um futuro bem próximo por nossas ruas realizando entregas?

No caso de São Francisco, o argumento por trás das medidas era inspirado na proteção de idosos, crianças e deficientes, apesar de em todo o tempo que os robôs estiveram em testes na cidade, os robôs não geraram problemas ou acidentes com pedestres, e foram essencialmente “cordiais” no uso do espaço urbano.

Por outro lado, localidades como Redwood City, San Carlos, Sunnyvale ou Concord deram sua aprovação a vários programas de implantação de robôs desse tipo, assim como estados como Flórida, Idaho, Ohio, Virgínia ou Wisconsin.

Tudo é novo, logo esse enfrentamento entre costumes e normas deve se repetir em muitos lugares, e nesse período esses robôs sofrerão evoluções que devem reduzir essa resistência.

O embate homem e máquina não é um embate novo, é bom lembrar que historicamente surgiram em torno da tecnologia no nível social, desde a própria revolução industrial e os protestos dos luditas, quando da substituição dos homens pelas máquinas.

O mesmo embate ouve também na California com as empresas resolveram substituir trabalhadores imigrantes na colheita da laranja, por robôs.

Quanto tempo levará para a tecnologia concluir com sucesso um desenvolvimento adequado para uma tarefa tão mecânica? E quais são as atividades que irão incorporar primeiro essa mão de obra?

Não tenhamos dúvida, é um caminho sem volta, e por isso em muitos países já tratamos de um Direito dos Robôs, onde abordamos além da tributação a responsabilidade civil dos mesmos.

Seriam todos esses medos realmente justificados? Obviamente, ninguém quer imaginar ser perseguido pelo cão ou mula robótica do Google, que também certamente o conheceria melhor do que você mesmo e poderia antecipar suas reações.

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A economia deixa bem claro: a chegada dos robôs e o aumento que trarão em termos de produtividade serão a única possibilidade que teremos de financiar muitas das coisas, como o sistema universal de saúde ou os regimes de benefícios sociais.

É fato que a relação homem e máquina ao longo do tempo, desenvolveu muitos significados e significações, sempre construída com muita ficção seja nas histórias em quadrinhos, onde a máquina substitui o homem, até as séries como “Perdidos no Espaço” onde os robôs e suas multifaces povoaram o imaginário de muitas gerações.

Mas gosto da divisão histórica dessas máquinas feitas pelo Marco Aurélio de Castro, no livro Direito Robótico, parte dos elementos ficcionais para os novos e modernos robôs, utilizando o P2 apresentado pela Honda em 1997 e sucedido pelo P3 em 1998, seguidos em 2001 pelo modelo ASIMO, os robôs parecem com pessoas portando trajes espaciais. Trata-se dos primeiros exemplares de robôs bípedes com andadura humana quase natural, máquinas que levam a inteligência artificial embarcada a um outro patamar.

Já mais a frente a Siemens lançou no mercado europeu em 2004, ao preço de €1.399 (um mil trezentos e noventa e nove euros), o robô Dressman, cujo sistema usa ar quente para secar e passar a camisa ao mesmo tempo. O robô possui o formato de um manequim, bastando vestir a roupa lavada nele e ativar um dos 12 programas que possui para diferentes tecidos.

Aqui no Brasil já existe o robô Vigilante, capaz de monitorar ambientes e transmitir informações (inclusive áudio) em tempo real a uma Central de Vigilância externa, bem como enviar imagens via internet. O robô é capaz de fazer rondas por diversos cômodos e possui sensores que permitem detectar qualquer alteração no ambiente, que será comunicada diretamente à Central de Comando. A máquina também pode ser utilizada para investigar os casos de disparo de alarme, constatando se se trata de tentativa de invasão ou mero acidente. Todos esses modernos equipamentos trazem embutidos sistemas de inteligência artificial que se comportam, no todo ou em parte, como suas contrapartes biológicas, emulando uma rede neural como referência.

Para o Professor John von Neumann, do Instituto de Estudos Avançados de Princeton, o entendimento é que não é fácil, nem irrealizável, construir uma máquina que podemos garantir que fará o melhor que se possa fazer durante um número limitado de lances à frente, digamos dois, e depois se deixará ficar na posição que é a mais favorável, de conformidade com algum método mais ou menos fácil de avaliação, o que implica dizer que todas sempre tem muito por evoluir.

O fato é que o uso da inteligência artificial fascina o homem desde o princípio, pois, a capacidade cognitiva das máquinas ainda não encontrou seu limite, o que deve ser expandido consideravelmente com o computador quântico e isso estimula o desenvolvimento de novas tecnologias e permite sonhos, como as máquinas dos filmes.

O desafio regulatório reside entre o equilíbrio de proteger a humanidade e não desestimular a inovação.

Sobre o autor
Charles M. Machado

Charles M. Machado é advogado formado pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, consultor jurídico no Brasil e no Exterior, nas áreas de Direito Tributário e Mercado de Capitais. Foi professor nos Cursos de Pós Graduação e Extensão no IBET, nas disciplinas de Tributação Internacional e Imposto de Renda. Pós Graduado em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Salamanca na Espanha. Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários, onde também é palestrante. Autor de Diversas Obras de Direito.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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