A execução de alimentos no novo CPC

Leia nesta página:

Considerando o conceito jurídico e do ponto de vista do direito material, alimento é tudo aquilo que o indivíduo precisa para ter uma vida digna por meio dos bens materiais, seja com alimentação, vestuário, lazer, habitação, tratamento médico, educação etc.

Estabelece o Código Civil no artigo 1.695 que “são devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento”. Trata-se, portanto, dos alimentos que decorrem do parentesco (que o pai paga ao filho, o filho paga para o pai, o neto para o avô ou o avô paga para o neto), do casamento ou da união estável – alimentos, assim, que se originam do direito de família.

Os alimentos do direito de família podem ter como origem um título executivo judicial (decisão interlocutória, sentença ou acordão) ou extrajudicial. Quando judicial, há que se falar em cumprimento de sentença, seguindo o rito dos artigos 528 a 533 do Código de Processo Civil. E, quando se tratar de título executivo extrajudicial, segue o rito dos artigos 911 a 913 do código. Importante frisar que ambos os títulos executivos admitem a utilização dos dois procedimentos de execução: coerção (prisão civil) ou expropriação (penhora).

Verifica-se, então, que a execução de alimentos foi regulamentada em quatro ritos pelo CPC: execução de título extrajudicial pelo rito da expropriação (art. 911, CPC) e prisão (art. 913, CPC) e a execução de título judicial pelo rito da expropriação (art. 530, CPC) e prisão (art. 528, CPC).

EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DE PRESTAÇÕES ALIMENTÍCIAS – ARTIGOS 528 A 533

Com objetivo de facilitar a execução dos alimentos, prevê o CPC que há quatro juízos competentes para o processamento do cumprimento da sentença ou decisão que condena ao pagamento de prestação alimentícia: juízo que proferiu a decisão exequenda; juízo do atual domicílio do executado; juízo do local onde se encontrem bens sujeitos a execução; e juízo do domicílio do credor.

A abrangência do cumprimento de sentença é tanto de alimentos definitivos como de alimentos provisórios, sendo que a execução dos alimentos provisórios, bem como a dos alimentos fixados em sentença ainda não transitada em julgado, se processa em autos apartados. Por outro lado, o cumprimento definitivo da obrigação de prestar alimentos será processado nos mesmos autos em que tenha sido proferida a sentença.

Considerando a existência do rito da prisão e o rito da penhora, quando é cabível cada um? O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até as 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo. Para as prestações mais antigas (da quarta para trás ao ajuizamento da execução), obrigatoriamente o rito deve ser o da penhora. A escolha pelo rito da prisão é uma faculdade do credor que, mesmo se tratando das três ultimas prestações, pode optar pelo rito da penhora e não da prisão.

É possível cumular em uma mesma execução o rito da penhora e o da prisão? Essa questão não é resolvida. Há quem entenda que por uma questão de efetividade do processo executivo o cumular de execuções por ritos diversos é possível. Contudo, há quem entenda que não é possível uma vez se tratando de ritos diversos (ofensa ao art. 780 do CPC/15).

O Recurso Especial nº. 2.004.516 – RO, julgado pelo STJ em outubro de 2022, que teve como relatora a Ministra Nancy Andrighi, teve como propósito “definir se é admissível a cumulação, em um mesmo processo, de cumprimento de sentença de obrigação de pagar alimentos atuais, sob a técnica da prisão civil, e alimentos pretéritos, sob a técnica da penhora e da expropriação”. O Tribunal entendeu que “é inquestionável a possibilidade de se determinar, no mesmo processo e conjuntamente, o cumprimento de sentença que contenha obrigações de diferentes naturezas e espécies, ainda que existam técnicas executivas diferenciadas para cada espécie de obrigação e que impliquem em adaptações procedimentais decorrentes de suas respectivas implementações” (...) “Em suma, a nova legislação processual não apenas autoriza, como anseia pela simplificação processual, pela liberdade das formas, pela flexibilização procedimental, pela celeridade e pela efetividade da tutela de mérito, especialmente em se tratando de prestações alimentícias. Nesse cenário, respeitosamente, não se afigurar razoável e adequado impor ao credor, obrigatoriamente, a cisão da fase de cumprimento da sentença na hipótese em que pretenda a satisfação de alimentos pretéritos e atuais, exigindo-lhe a instauração de dois incidentes processuais, ambos com a necessidade de intimação pessoal do devedor, quando a satisfação do crédito é perfeitamente possível no mesmo processo”.

A Ministra entendeu que, nos casos em que há a cumulação dos ritos, para uma melhor elucidação dos pagamentos e organização processual, cabe ao credor “especificar, detalhadamente, no requerimento do cumprimento de sentença e em suas demais manifestações, se a parcela cobrada se refere aos alimentos pretéritos, sobre os quais incidirá a técnica da penhora e expropriação, ou se se refere aos alimentos atuais, sobre os quais incidirá a técnica da prisão civil. Ao julgador caberá especificar, no mandado de intimação que será endereçado ao devedor, quais parcelas ou valores são referentes aos alimentos pretéritos e que, na hipótese de inadimplemento, ensejarão penhora e expropriação, e quais parcelas ou valores são referentes aos alimentos atuais e que, na hipótese de inadimplemento, resultarão na prisão civil do devedor.” E “ao devedor, por sua vez, caberá, sobretudo nas hipóteses em que houver apenas a quitação parcial da dívida, especificar se o pagamento se refere aos alimentos pretéritos, que elidirão a possibilidade de penhora e expropriação, ou se se refere aos alimentos atuais, que impedirão a decretação de sua prisão civil, sob pena de ser lícito ao credor recebê-los na modalidade que melhor lhe convier”.

Também, a possibilidade de cumulação das duas técnicas executivas é defendida na doutrina:

Ainda remanesce a dúvida: como proceder quando o débito abrange tanto prestações antigas quanto novas? Segundo a jurisprudência e a doutrina dominantes, ainda interpretando o Código anterior, devia-se promover duas medidas: execução das três últimas prestações mais vincendas sob pena de prisão e das demais pela execução comum de forma separada. No sistema do Novo CPC, a sistematização soa facilitadora: há espaço para promover um único cumprimento de sentença que veicule cobrança de prestações antigas e novas. Assim, o exequente sempre será, segundo o art. 528, caput, intimado pessoalmente para em 3 dias pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de fazê-lo. O § 1º do art. 528 prevê que, caso o pagamento não seja efetuado, provado ou tenha sua falta justificada, o juiz mandará protestar o pronunciamento judicial. O protesto, por óbvio, poderá ocorrer em relação a qualquer decisão que fixe os alimentos, seja sentença ou decisão interlocutória, tenha a decisão transitado em julgado ou não. Até aí, o processo segue da mesma maneira para as prestações novas e antigas. A diferença é apenas a determinação da prisão civil, que não soa incompatível com a determinação de penhora no mesmo processo. É prudente que o mandado preveja as diferentes consequências para as diferentes prestações1.

Contudo, há quem sustente a necessidade de dois cumprimentos de sentença, sendo um para dívidas alimentares pretéritas (penhora) e um para dívidas alimentares atuais (prisão):

Com o devido respeito, contudo, somos adeptos da opinião contrária – que rejeita a possibilidade de cumulação de execuções de alimentos sob ritos distintos – pois parece ser mais aceitável, não apenas porque os procedimentos são diferentes (e o art. 780 do CPC literalmente exige que sejam idênticos), mas especialmente pelo fato de que tal cumulação seria agressiva ao princípio da economia processual e à instrumentalidade do processo, fato que se torna mais grave quando o pleito é de alimentos. Não é exagero imaginar, por exemplo, que num determinado momento processual não se saberá mais o que se está cobrando ou a que título o executado fez um pagamento parcial (parcelas recentes ou pretéritas). O direito aos alimentos, exatamente pelas qualidades que ostenta, deve estar blindado de discussões desnecessárias e contraproducentes que invariavelmente surgirão se admita a cumulação de execuções por técnicas distintas2.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

RITO DA PRISÃO

No cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo, sendo que somente a comprovação de fato que gere a impossibilidade absoluta de pagar justificará o inadimplemento. Importante frisar que na execução pelo rito da prisão a intimação do executado deve ser pessoal (artigo 528 do CPC).

Caso o executado não pague a dívida ou sua justificativa não seja acolhida, a decisão poderá ser protestada e poderá ser decretada a sua prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses, sendo que a prisão será cumprida em regime fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns.

O cumprimento da pena não exime o executado do pagamento das prestações vencidas e vincendas, ou seja, não é porque o executado cumpriu a pena de prisão na sua integralidade que ele não deve realizar o pagamento do débito – a dívida ainda existe.

Paga a prestação alimentícia, o juiz suspenderá o cumprimento da ordem de prisão.

Se a obrigação não é cumprida mesmo após o prazo da prisão, o executado não poderá ser preso novamente pela mesma obrigação alimentar e a execução prossegue pelo rito da penhora.

Há discussão na doutrina e na jurisprudência se é cabível a prisão civil no caso de inadimplemento de pensão alimentícia em favor de ex-cônjuge.

O STJ no julgamento do RHC 117.996/RS entendeu que “o inadimplemento dos alimentos compensatórios (destinados à manutenção do padrão de vida do ex-cônjuge que sofreu drástica redução em razão da ruptura da sociedade conjugal) e dos alimentos que possuem por escopo a remuneração mensal do ex-cônjuge credor pelos frutos oriundos do patrimônio comum do casal administrado pelo ex-consorte devedor não enseja a execução mediante o rito da prisão positivado no art. 528, § 3º, do CPC/2015, dada a natureza indenizatória e reparatória dessas verbas, e não propriamente alimentar.”

RITO DA PENHORA

A requerimento do exequente, o executado será intimado para pagar o débito no prazo de 15 (quinze) dias, sendo que a intimação pode ser feita na pessoa do advogado, não há necessidade de ser pessoal. O não pagamento acarreta a aplicação de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento (outra diferença em relação a execução pelo rito da prisão em que não há aplicação de multa ou verba honorária no caso de não pagamento).

Não é possível converter para o rito da prisão. Uma vez iniciada a execução pelo rito da penhora, esse será seguido até o fim.

A defesa do executado acontece por meio da impugnação, sendo possível alegar: I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia; II - ilegitimidade de parte; III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; IV - penhora incorreta ou avaliação errônea; V - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções; VI - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução; VII - qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença.

É possível a penhora de depósitos de FGTS e PIS do credor; salário, sendo que não pode superar 50%; depósitos em poupança sem a limitação dos 40 salários-mínimos, bem de família.

EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL QUE PREVÊ PRESTAÇÕES ALIMENTÍCIAS – ARTIGOS 911 A 913 DO CPC

Aplicam-se as mesmas regras do cumprimento da sentença com algumas adaptações procedimentais.

Na execução fundada em título executivo extrajudicial que contenha obrigação alimentar, o juiz mandará citar o executado para, em 3 (três) dias, efetuar o pagamento das parcelas anteriores ao início da execução e das que se vencerem no seu curso, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de fazê-lo.

Pode ser seguido tanto o procedimento da prisão como o da penhora. Pelo rito da penhora, segue o procedimento do artigo 829 do CPC, sendo o executado citado para pagar no prazo de 3 (três) dias ou defender-se por meio de embargos à execução.

Interessante mencionar quais títulos executivos extrajudiciais podem conter obrigação alimentar. São aqueles previstos nos incisos II, II e IV do artigo 784: II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; III - o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas; IV - o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos advogados dos transatores ou por conciliador ou mediador credenciado por tribunal;

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DONOSO, Denis; VANNUCCI, Rodolpho. Cumprimento da sentença que reconheça a exigibilidade da obrigação de pagar alimentos. In: ASSIS, Araken de; BRUSCHI, Gilberto Gomes. (Org.). Processo de Execução e Cumprimento da sentença: temas atuais e controvertidos. 2ª ed., São Paulo: Thomson Reuters, 2022, v. 1.

Primeiros comentários ao novo código de processo civil: artigo por artigo / coordenação Teresa Arruda Alvim Wambier – 1º ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

Justicia, a inteligência artificial do Jus Faça uma pergunta sobre este conteúdo:

RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Execução Civil, 7 ed. Ed. Forense, 2019

TARTUCE, Fernanda; DELLORE, Luiz. Execução de alimentos: do CPC/73 ao novo CPC in Coleção Repercussões do Novo CPC, vol. 15: família e sucessões. Coords.: Fernanda Tartuce, Rodrigo Mazzei e Sérgio Barradas Carneiro. Salvador: Jus Podivm, 2016.


  1. TARTUCE, Fernanda; DELLORE, Luiz. Execução de alimentos: do CPC/73 ao novo CPC in Coleção Repercussões do Novo CPC, vol. 15: família e sucessões. Coords.: Fernanda Tartuce, Rodrigo Mazzei e Sérgio Barradas Carneiro. Salvador: Jus Podivm, 2016. p. 490

  2. DONOSO, Denis; VANNUCCI, Rodolpho. Cumprimento da sentença que reconheça a exigibilidade da obrigação de pagar alimentos. In: ASSIS, Araken de; BRUSCHI, Gilberto Gomes. (Org.). Processo de Execução e Cumprimento da sentença: temas atuais e controvertidos. 2ª ed., São Paulo: Thomson Reuters, 2022, v. 1, p. 399

Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos