A importância da tendência ambientalista para o trabalho e previdência social da Constituição

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Resumo: Dentre as diversas acepções desse vasto conceito jurídico denominado meio ambiente, destaca-se o interesse desse breve artigo em discutir o meio ambiente do trabalho, despidos de conotação diretamente econômica, associam-se às novas facetas de proteção da vida, em um sentido amplo de qualidade de vida, motivados pelos impactos da sociedade industrial e da revolução tecnológica do fim do século, como parte integrante da ampla proteção ambiental constitucional.


A Revolução Industrial se alicerçou, até meados do século XX, nos fatores de produção, natureza, capital, e trabalho, nas últimas décadas um novo fator foi acrescentado, a tecnologia, nesse contexto critérios do imediatismo, da ânsia do lucro a qualquer custo e do crescimento acelerado provocam graves prejuízos à sanidade ambiental.

Esse dinamismo da civilização industrial introduziu radicais mudanças no meio ambiente físico, e difundiram novos conceitos sobre o ambiente e seu uso, induzindo, em detrimento do equilíbrio ecológico, ao consumismo desenfreado que, para se sustentar explora os recursos naturais a qualquer custo incluindo o homem mão de obra.

Embora o Direito brasileiro, por intermédio das leis ordinárias e das normas infraconstitucional já despendia relevância, com a Constituição Federal de 1988 ultrapassou a ampla proteção do meio ambiente, inserindo uma base principiológica que resguarda esses direitos, fazendo advir uma nova ordem constitucional.

É importante destacar que essa visão brasileira tem origem no Código Civil de 1916, e já antecedia até mesmo a primeira ação mundial em defesa do meio ambiente na Assembleia Geral das Nações Unidas, conhecida como a Conferência de Estocolmo de 1972, importante por chamar a atenção para a capacidade limitada de a natureza absorver a expansão das atividades humanas e o esgotamento dos recursos naturais, provocado pelo crescimento econômico sem planejamento adequado e em oposição à preservação do meio ambiente.

Observem que aqui o conceito de ambiente natural se rompe, e se expande o conceito de meio ambiente humano, entendendo-se como fundamentais todos os locais onde o homem vive, assim como a qualidade de vida, independentemente de estar relacionado ao meio ambiente natural ou artificial.

Adotaremos aqui o conceito legal expresso no artigo 3º, I, da Lei nº 6.938/1981 , artigo 225, da Constituição Federal de 1988 , e notem que o legislador não retrata apenas a idéias de espaço, de simples ambiente, pelo contrário vai além, para significar o conjunto de ralações entre os fatores bióticos (vivos) e abióticos (não vivos), ocorrentes nesse ambiente, e que são responsáveis pela manutenção, abrigo e regência de todas as formas de vida existentes.

O que coaduna com o espírito redemocratizador-humanizador da realidade brasileira, pois o termo ambiente é soerguido abrangendo o ambiente físico, cultural, natural e do trabalho; todos estão sob o manto protetor da norma constitucional, que dentro da interpretação sistêmica de estar assegurando a todos indistintamente, um ambiente adequado e propício à vida, em que interações nocivas devem ser reprimidas e controladas pelo Poder Público ecologicamente equilibrado.

E por compreender ser bem de uso comum do povo e essencial a sadia qualidade de vida, impõe-se a idéia de não estar restrito às ações e interesses particulares, uma vez que as afetações nocivas, seu mau uso ou gerenciamento, prejudicam a coletividade.

Este raciocínio nos impõe dentro do núcleo rígido do meio ambiente, sua natureza jurídica de direito difuso, fato que explicamos de modo simplista aqui, pois sendo de todos, confere ao Poder Público e à coletividade o dever principiológicos do desenvolvimento sustentável, o que se faz necessário discriminar esta espécie de direito e situá-lo dentro do universo jurídico.

Os direitos fundamentais do homem podem ser distinguidos como direitos intergeracionais, estabelecidos como de 3ª dimensão, inerentes ao princípio da solidariedade aqueles de titularidade coletiva, portanto compreendem os interesses metaindividuais ou transindividuais chamados também de interesses coletivos em sentido lato, e como o nome sugere perpassam a pessoa do indivíduo, e situados entre interesse público e o interesse privado, tutelam a proteção e preservação do equilíbrio ecológico para todas as gerações, o que o torna em um bem jurídico público e indisponível, de caráter universal, que é internalizado em seu sentido difuso.

Ousaria aqui até a dizer que falamos de um direito ao fair trial e não por acaso, constitui a maior contribuição do Common Law (parte importante das inovações trazidas pela Lei nº 13.105/2015 popularmente chamada de Código de Processo Civil), para a civilidade do Direito, e hoje certamente representa o novo jus commune na matéria ambiental.

O meio ambiente do trabalho, visto como espécie do gênero meio ambiente, é o local onde as pessoas exercem suas atividades funcionais, seja remunerada ou não, cujo equilíbrio está baseado na higidez e salubridade do meio e na ausência de agentes que comprometem a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores, independentemente da condição que ostentem, percebam que excede o limite estático do espaço geográfico interno do local destinado à execução das tarefas, alcançando igualmente o local da residência do trabalhador e o meio ambiente urbano, o que torna imperioso recuar o olhar para a importância de ser-lhe dada tutela jurídica, a fim garantir condições mínimas de dignidade.

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O que nos remete a teoria do risco que no campo ambiental tem um caráter de alerta que mobiliza argumentativamente a imaginação de movimentos lineares que levam impreterivelmente à catástrofe, ou pelo menos, a um dano irreparável, e que abalizada com a teoria da vulnerabilidade (fragilidade socioambiental) ao se analisarem as condições do meio ambiente laboral, portanto tais elementos são determinantes para enquadrarmos como ocupacional ou não, diante de uma possível exposição a ambientes laborais contaminados, por agentes químicos, físicos, biológicos, psíquicos ou mecânicos, e a necessidade de combatê-los não somente no sentido de reparação, mas de prevenção.

É nesse contexto de direito ambiental laboral, que ele se insere como um direito difuso fundamental inerente às normas sanitárias e do trabalhador, razão pela qual recaí sobre ele a proteção dos Poderes Públicos e da sociedade organizada, razão pela qual foi alçada ao topo do ordenamento, recebendo atenção especial, pois, um dos efeitos benéficos disso, é que, como direito fundamental, receberia imediata aplicabilidade.

Em síntese este é o motivo pelo qual o trabalho humano foi elevado ao alto nível de proteção priorizando o homem em detrimento dos meios de produção, pois, muito embora as condições laborais influenciem na qualidade de vida do trabalhador e está diretamente relacionada à sua saúde, é necessário dispor de um sistema constitucional que garanta direitos a essa parcela da sociedade.

Esse raciocínio foi contemplado no artigo 170, caput, VI, da Constituição Federal de 1988, que preceitua que a ordem econômica e o exercício da livre iniciativa devem ter como fundamentos a defesa do meio ambiente e a valorização do trabalho humano, devendo promover a todos a existência digna, tendo como parâmetro os moldes da justiça social.

O direito ao meio ambiente e o meio ambiente do trabalho estão interligados pelos valores que permeiam o princípio da dignidade humana, e está associada aos princípios da ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais, na medida em que corrobora com a ordem econômica, enquanto esta deve garantir que o processo econômico enquanto produtor, não impeça, mas ao contrário pondere a valorização do trabalho humano saúde, higiene, segurança, informação, - ou seja, as devidas condições laborais a todo e qualquer trabalhador.

Nesse condão, considero que a legiferança social, não passam de medidas que desregulamentam, reduzem ou flexibilizam uma série de direitos relativos às condições de trabalho, e desaguam no previdenciário.

Essa tal modernização das relações de trabalho deveria ter como pressuposto a eliminação das formas precárias e arcaicas de trabalho ainda persistentes no Brasil, em pleno século XXI, e não a ampliação dessas práticas, com suposta garantia de segurança jurídica para as empresas, em detrimento da proteção ao trabalhador.

Assim sendo, a ambiência laboral é um reflexo da sociedade contemporânea de risco, em que as condições dignas de trabalho são preteridas em detrimento do ganho econômico das empresas, que preferem negligenciar seus deveres a atuar preventivamente.

A conduta omissa dos empregadores expõe seus colaboradores a agentes nocivos à saúde e à integridade física e psíquica, retira do trabalhador a sua dignidade, e dentre os agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho, ganham destaque os agentes insalubres, perigosos e penosos, bem como psicológicos, haja vista sua grande incidência e consequências altamente danosas aos trabalhadores.

O meio ambiente de trabalho desequilibrado, como decorrência da exposição dos trabalhadores aos riscos ambientais, surte efeitos no sistema previdenciário, que tem por objetivo amparar o trabalhador quando da ocorrência de contingências sociais, tais como a incapacidade laborativa e a morte, são eventos que retiram do indivíduo e de seus familiares a autonomia para subsistir dignamente.

O sistema previdenciário brasileiro regulamenta a concessão de benefícios e de serviços aos trabalhadores vitimados por acidentes de trabalho, bem como aos seus dependentes, quais sejam: pensão por morte, aposentadoria por incapacidade permanente, incapacidade temporária, acidente e reabilitação profissional.

Ocorre que, um número considerável das contingências que ocorrem na ambiência laboral decorre unicamente da conduta negligente do empregador, que acaba por transferir ao sistema previdenciário sua evidente responsabilidade, o que pode ser confirmado a partir dos levantamentos estatísticos realizados pelo Instituto Previdenciário brasileiro.

Sobre a autora
Tatiana Conceição Fiore de Almeida

Advogada (OAB/SP 271162), Doutorando Em Direito Constitucional pela Universidade de Buenos Aires (UBA), Coordenadora do Núcleo de Direito Previdenciário da ESA.OAB/SP; Relatora da 4ª Turma de Benefícios da CAASP; Membro Efetivo das Comissões de Direito do Trabalho, Direito Previdenciário, Perícias Médicas; Membro Convidada da Comissão de Direito Desportivo da OAB/DF; Articulista/Investigadora da equipe internacional Latin-Iuris (Instituto Latinoamericano deInvestigación Y Capacitación Jurídica); Articulista e Coordenadora de Obras Jurídicas; Coautora em diversas Obras Coletivas; Professora; Membro da Comunidad para la investigación y el estúdio laboral y ocupacional-CIELO; Coordenadora do Livro Previdenciário um olhar Crítico sobre Constitucionalidade e as Reformas (2016); Um Olhar Crise além dos Direitos Sociais (2019); e Previdenciário: Novas Tecnologias e Interações entre o Direito, a Saúde e a Sociedade; Participou como membro convidado da CPI da Previdência (ano 2017).︎

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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